D. José Policarpo, cardeal da palavra e do silêncio

Historiador António Araújo considera que patriarca se distingue por atitude «ativa mas não panfletária»

Lisboa, 12 ago 2011 (Ecclesia) – O historiador António Araújo, coautor da obra ‘Atraídos pelo Infinito’ (ed. Alêtheia), sobre D. José Policarpo, considera que há uma relação de empatia entre o cardeal-patriarca e o povo português, “o que não sucede por acaso”.

O docente universitário que ocupa o cargo de consultor para os Assuntos Políticos do presidente da República afirmou à Agência ECCLESIA que o prelado de 75 anos “tem a relevância da palavra”, ao mesmo tempo que a sabe calar: “Há silêncios que também falam”.

O bispo de Lisboa, que esta segunda-feira assinala meio século como padre, distingue-se por uma atitude “ativa mas não panfletária”, reveladora de uma “Igreja que compreende a secularização e abraça o mundo mas não entra em conflito com ele”, refere o especialista em Direito.

“Não é uma pessoa que procure o vedetismo e a popularidade”, embora a sua “discrição” não ignore a importância dos media nem contribua para que “se feche sobre si próprio”, aponta António Araújo, que destaca o “profundo sentido de amor e serviço à Igreja” do presidente da Conferência Episcopal.

Para o assessor do Tribunal Constitucional, a sintonia entre os portugueses e o prelado é mais motivada pela atitude do que pelas ideias que defende, já que “a densidade do seu pensamento não chega à generalidade das pessoas”, ainda que “o seu registo enquanto pastor não seja academista nem de caráter intelectual”.

“Nunca deixou de ser um patriarca com um elevadíssimo conhecimento da realidade”, refere o historiador, para quem “é surpreendente ver a dimensão e profundidade das suas ‘Obras escolhidas’”, publicadas pela Universidade Católica Editora.

Os 13 volumes da coleção poderiam ser mais se D. José Policarpo tivesse prosseguido a carreira no ensino superior, interrompida “de certa forma com pena” devido às responsabilidades que lhe foram atribuídas: “Ele próprio confessou que poderia ter seguido uma carreira universitária, dentro da Igreja”.

António Araújo assinala que o prelado não esteve no Concílio Vaticano II (1962-1965) mas acompanhou os primeiros anos da sua aplicação, como é patente na “grande obra ‘Os sinais dos tempos’”, tese de doutoramento obtida na Pontifícia Universidade Gregoriana, Roma, e publicada em 1971.

O título constituiu um “conceito revolucionário”, destaca o investigador, acrescentando que “a marca principal” do cardeal-patriarca está no facto de ser “profundamente conciliar”, como se manifesta na atenção dada à “colegialidade” e “participação dos leigos” na vida da Igreja.

“Aplicou não apenas o legado conciliar, mas também o ensinamento dos Papas, sobretudo de João Paulo II, especialmente numa questão que sempre lhe foi cara, a da nova evangelização”, respondendo à “necessidade de a Igreja se voltar a situar num meio urbano que, se não lhe é hostil, lhe é pelo menos indiferente”, salientou.

Segundo o historiador, “o interessante no magistério do senhor D. José é a concretização do reconhecimento da autonomia das realidades terrestres, sem abdicar da divulgação da mensagem cristã”.

Ao olhar para os 50 anos de ordenação sacerdotal, conferida pelo cardeal Cerejeira no dia da Assunção da Virgem Maria, António Araújo diz que não há “pontos fracos do ponto de vista do pensamento” em D. José Policarpo, e “quanto à ação pastoral só um distanciamento temporal é que a poderá avaliar”.

RM

Partilhar:
plugins premium WordPress
Scroll to Top