Presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social foi ao Algarve falar da nova encíclica do Papa
D. Carlos Azevedo foi convidado pela Caritas Diocesana do Algarve para ser o orador na Jornada de Reflexão sobre a última encíclica do Papa Bento XVI, Caritas in Veritate, defendendo uma economia “onde esteja presente a fraternidade”.
O presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social começou por explicar que no documento “há uma lucidez enorme porque este Papa tem uma grande capacidade de discernimento e de orientação”.
Na sua intervenção, a que deu o título ‘Caridade repleta de Verdade’, explicou que a encíclica “aponta uma leitura de fé da realidade humana e, por isso, não é um texto de sociologia ou de economia (ainda que se socorra dessas ciências), nem proposta alternativa ao socialismo e ao capitalismo”. “É uma leitura cristã que impulsionará para uma acção cristã oposta às posições neoliberais que dominam o mundo”, afirmou.
O Bispo Auxiliar de Lisboa falava este Sábado, no Centro Pastoral e Social da Diocese do Algarve, em Ferragudo, aos cerca de 122 participantes da Jornada de Reflexão. Referiu que “não se pretende apontar soluções técnicas, nem intrometer-se na política dos Estados, mas cumprir a missão de verdade de realizar uma sociedade que respeite a dignidade e a vocação da pessoa humana”.
“E a Igreja não se pode calar perante esta missão”, advertiu, reconhecendo que “se essa missão põe em crise algumas posições e atitudes do Estado isso já são consequências” e explicando que “o tema central da encíclica é o desenvolvimento autêntico do ser humano” como “chave de leitura para o desenvolvimento global”.
O prelado garantiu que “a insistência da realização da caridade na verdade insere-se no desejo para favorecer a harmonização do mundo que é dominado pelo egoísmo, interesses e conflitos”, reconhecendo que “as pessoas não buscam a harmonia que a globalização deveria permitir” porque “querem é globalizar os seus interesses”.
O Bispo Auxiliar de Lisboa reconheceu não obstante que “milhões de pessoas saíram da miséria desde 1967 e isso é um dado positivo”. “A riqueza cresceu em termos absolutos mas em modos muitos desiguais e é preciso encontrarmos modos com base na concepção cristã”, contrapôs.
Pese embora alguma melhoria, lembrou os “muitos países onde persistem graves problemas e dramas” e os consequentes “mecanismos perversos” elencados pelo Papa. A “actividade financeira especulativa”, os “fluxos migratórios imponentes”, a “fruição desregulada dos recursos do planeta”, a “distorção das ajudas internacionais” ou a “excessiva protecção dos direitos de autor no campo da saúde” foram alguns dos exemplos apontados, lembrando os “muitos países pobres onde persistem modelos culturais que atrasam o processo de desenvolvimento”. Também os processos “ambivalentes”, com efeitos positivos e negativos, como a “deslocalização de empresas” não são esquecidos pelo Papa, nem o foram pelo conferencista.
D. Carlos Azevedo defendeu que “é preciso uma nova síntese sobre o que é o ser humano porque há falta de reflexão” e criticou aqueles que procuram distrair as pessoas.
“O papel do Estado e a proposta de uma subsidiariedade fiscal que permitiria aos cidadãos decidir sobre o fim dos seus impostos”, foram outras questões da encíclica destacadas. “O Papa nunca fala de capitalismo, mas está nas entrelinhas e convida a superá-lo, regressando à economia onde esteja presente a fraternidade”, referiu ainda.
Apontando a centralidade da pessoa humana a salvaguardar nas intervenções em prol do desenvolvimento, considerou que “os organismos da Igreja têm de ser capazes de se abrir a novas soluções” e criticou as famílias que não formam tendo em conta todas as dimensões da pessoa humana, incluindo a espiritual. “A ética individualista não pode desentender-se da moral natural. O ser humano é uma unidade estruturada e social chamada à transcendência”, justificou, considerando que “os crentes são os que contribuem mais para a novidade da História”.
D. Carlos Azevedo salientou que a encíclica reclama o “acesso ao trabalho para todos” e denuncia que “o aumento das desigualdades entre grupos sociais e dos índices da pobreza, tende não só a minar não só a coesão social – e por este caminho põe em risco a democracia –, mas tem também impacto negativo no plano económico com a progressiva corrosão das relações de confiança, credibilidade e respeito pelas regras, indispensáveis em qualquer convivência cívica”.
D. Carlos Azevedo disse que a encíclica lembra que “o mundo depende do sistema moral em que se baseia e sob este argumento a Doutrina Social da Igreja tem um contributo específico para dar”.
Redacção/Folha do Domingo