Cultura: Responsáveis assinalam ausência da Igreja no meio artístico, literário e científico

Católicos devem repensar «alheamento» em relação aos processos culturais, passando a «correr riscos»

Lisboa, 11 nov 2011 (Ecclesia) – Os católicos portugueses estão distantes do mundo cultural e precisam de sair dos adros para o meio da cidade, consideram três das personalidades que assinam depoimentos na última edição do “Observatório da Cultura”.

“A Igreja está muito longe do mundo cultural. Não se faz evangelização da cultura se não com os seus agentes”, escreve o padre Jardim Gonçalves, antigo diretor do gabinete do cardeal-patriarca de Lisboa, na edição de novembro da publicação do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura (SNPC).

O responsável, que participou várias vezes nos encontros de referentes organizados pelo SNPC, sublinha que “a missão de evangelização” no âmbito da cultura “é um trabalho de grande exigência”, que supõe “a presença da Igreja no meio artístico, literário e científico, onde se verifica uma ausência total”.

O presidente do Centro Regional de Braga da Universidade Católica Portuguesa, João Duque, considera que é preciso “repensar certo alheamento de muitos cristãos e comunidades, em relação aos processos culturais”.

Esse afastamento, prossegue o teólogo, “pode ser originado por certo tradicionalismo religioso de inércia, que se limita a práticas mínimas de manutenção de uma débil identidade cristã e não assume o seu papel configurador de cultura”.

Para João Wengorovius Meneses, diretor da Ação Social da Câmara Municipal de Lisboa, a relação com a cultura “obriga a Igreja a sair para a rua”, a “valorizar o pluralismo cultural, a expor-se, a reinventar os modos e, portanto, a correr riscos”.

“Claro está, evitando o relativismo, o consumismo cultural ou ter de pedir desculpa pela existência de Deus ou pelos princípios que defende e a definem”, ressalva o responsável.

O escritor João Bigotte Chorão considera que “num mundo dessacralizado e mesmo militantemente ateu, impõe-se prestar a melhor atenção aos artistas que, à contracorrente, exercitam os seus dons e logram, na sua obra, conciliar estética e ética”.

“Uma obra pode não ser, prima facie [à primeira vista], religiosa, mas, pela sua carga espiritual, tornar-se naturalmente cristã”, aponta o crítico literário, acrescentando que a “Igreja tem dado passos decisivos ao repensar a cultura, não como um espaço fechado, mas aberto ao diálogo intercultural”.

No entender de Inês Gil, do Grupo de Cinema do SNPC, “a Igreja pode ser uma voz importante, sem impor, na proposta de uma cultura moderna e atualizada, para a expressão de um mundo mais humilde, sendo crítica e não excluindo o humor”.

O compositor João Madureira frisa que “é imprescindível criar para manter, manter para repensar, e repensar para criar”, sendo “múltiplos os caminhos” de uma aliança que, segundo o autor, não deve ser destruída.

Entre os aspetos positivos na relação entre Igreja e Cultura em Portugal, o padre Jardim Gonçalves destaca a “maior atenção, na generalidade do país, quer ao património artístico e monumental quer ao arquivístico”.

Os mais de 25 depoimentos reunidos pelo Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura estão a ser gradualmente disponibilizados no seu site.

RJM

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