Autor de «Viagens», trabalho que assinala 30 anos, diz que a poesia é uma forma de «Deus entrar em casa» das pessoas

Vila Nova de Gaia, 09 abr 2025 (Ecclesia) – Pedro Abrunhosa, músico, agnóstico que gosta do lugar da dúvida, diz que o axioma sobre o silêncio de Deus é um “impedimento”, mas assume-se um buscador que “não se sacia com a primeira pepita” que encontra.
“O silêncio de Deus é um impedimento. É uma das questões axiomáticas e os agnósticos precisam entender esse silêncio. O diálogo com pessoas como o Papa Francisco, o cardeal Tolentino Mendonça ou o padre Mário Oliveira, é fundamental, porque traz consolo quando não existem respostas. Eu gostava que existissem”, explica em entrevista à Agência ECCLESIA.
“Deus está presente na poesia, muito mais do que na preleção. A poesia de Tolentino está prenha de Deus e os seus versos (‘Muitas vezes Deus prefere entrar em nossa casa quando não estamos’, in «A Papoila e o Monge») são uma explicação plausível para o silêncio de Deus”, assinala.
Pedro Abrunhosa reconhece-se “um cristão agnóstico”, herdeiro de um “pensamento e filosofia cristã” que marca a tradição ocidental, “apela aos mais fracos e aos desprotegidos”, ao “diálogo” e fala de cada um.
“Todos nós, no momento da projeção do amor, na forma como tratamos os outros, sobretudo os mais fracos – e quando eu digo os mais fracos, não digo de maneira vã: para quem tem fé, eu não percebo como é que se pode não olhar para o outro, para o diferente, o pobre, miserável, o doente, o indigente, sem ver nele a chispa de Deus. É a esse que nós devemos estar muito atentos, e é aí que eventualmente Deus se concretiza – talvez muito mais do que nos acordes que eu toco aqui: é na forma como o fazemos todos os dias”, explica.

Pedro Abrunhosa, que celebra 30 anos sobre o seu trabalho «Viagens», foi um dos seis artistas portugueses, entre 200 convidados, que se encontraram com o Papa Francisco, em junho de 2023, momento que o músico descreve como “solene” e “revelador”, também “inicial”, mas indica que “os garimpeiros não se satisfazem com a primeira pipita de ouro que encontram”.
“Ele próprio (Papa Francisco) é um homem de quem nós, nós humanidade, vamos sentir muita falta. Este homem à frente desta instituição é uma mais-valia para a humanidade, mercê da sua bondade e da sua clarividência. Em muitas coisas eu discordo do Papa Francisco, mas existe uma clara objetividade no que é o bem-comum, numa visão de paz e numa visão ecuménica”, esclarece.
Nesse encontro, o músico português escutou a valorização do papel dos artistas, designados como “profetas”.
“O artista profeta é aquele que, do alto de algum sítio – que não é um sobranceiro nem é um sítio arrogante, vê o que os outros não veem, faz existir o que não existia, e aí o ato, muito mais próximo do ‘creatio’, da criação, está muitas vezes nas mãos do artista, que faz todos os dias o papel. Se há imitador e buscador divino, é o artista”, indica.
Questionado se se sente “co-criador” de Deus, o músico reconhece ser um “pensamento lindíssimo” e uma “expressão muito forte”.
A conversa com Pedro Abrunhosa, que tem lugar para a poesia de Daniel Faria e do cardeal Tolentino Mendonça, pode ser acompanhada no programa ECCLESIA, emitido esta noite na Antena 1, e visionada no 70×7 de domingo; estará disponível também no podcast «Alarga a tua tenda» e na íntegra no portal de informação da Agência ECCLESIA.
LS