Cultura: Obra de Sampaio Bruno devia ser estudada pelos futuros padres, diz teólogo

Afonso Rocha distinguido por estudo sobre o pensador portuense que na juventude teve manifestações «muito anticlericais»

Porto, 14 jul 2011 (Ecclesia) – Sampaio Bruno será o mais importante pensador português contemporâneo e a sua obra devia ser estudada pelos candidatos ao sacerdócio, defende Afonso Rocha, autor de uma obra sobre o filósofo que viveu entre 1857 e 1915.

O estudo ‘Natureza, Razão e Mistério, Para uma leitura comparada de Sampaio (Bruno)’, editado em 2009 pela Imprensa Nacional Casa da Moeda, vai ser hoje distinguido em Lisboa com a primeira edição do prémio António Quadros, atribuído pela fundação homónima.

Em entrevista à Agência ECCLESIA, o professor de filosofia na Faculdade de Teologia da Universidade Católica afirma que José Pereira de Sampaio Bruno é “porventura o maior filósofo português, pelo menos nos tempos modernos”.

O volume ajuda a compreender a “tradição filosófica que está antes de Sampaio Bruno e com a qual ele dialogou”, ao mesmo tempo que destaca a receção das ideias do pensador portuense na cultura portuguesa, de que é uma “referência fundamental”.

As cerca de 650 páginas contrariam a tese de que o defensor do republicanismo está na base da fundação da chamada ‘filosofia portuguesa’: “Sampaio Bruno é antes de mais um pensador e filósofo de matriz universal”, assinala Afonso Rocha.

O pensador adicionou o último apelido ao seu nome para evocar o filósofo e frade dominicano italiano Giordano Bruno (1548-1600), que morreu na fogueira depois de a Inquisição o ter declarado culpado de heresia, entre outras acusações.

A relação de Sampaio Bruno com o catolicismo começou na educação cristã recebida na primeira infância, “mas muito cedo, sobretudo por influência dos livros do pai, enveredou por um caminho diferente”, aponta o autor.

“Entre os 20 e 30 anos, depois de uma juventude com demonstrações muito anticlericais, Sampaio Bruno virá a superar o catolicismo, e mesmo o cristianismo”, nomeadamente na sua abordagem ao problema do mal.

Para Bruno, “o mal não é meramente antropológico e moral, mas tem a ver com o divino”, tornando-se “uma verdade segundo a razão mas que está para além dela”, refere o autor, acrescentando que as raízes religiosas do jornalista e político fundam-se no seu conhecimento da Cabala e gnose judaicas.

Afonso Rocha, nascido em 1941, considera que a Faculdade de Teologia devia preocupar-se com o estudo do pensamento de Sampaio Bruno e de outros pensadores que influenciam a cultura portuguesa atual.

“Se a teologia não tem em conta estas conceções, estará a formar futuros padres de uma maneira desenraizada e meramente teórica”, fazendo que fiquem com um “certo handicap [desvantagem] numa evangelização que tenha em conta o real homem português de hoje”, afirma.

O docente sublinha que “a grande razão de ser de uma universidade católica está na Teologia e Filosofia”, que deviam ser “a grande aposta da Igreja Católica” em Portugal, colocando em segundo plano as restantes áreas do saber.

“Na prática, o que se tem privilegiado são as outras ciências”, diz Afonso Rocha, para quem “a Faculdade de Teologia não está devidamente dotada em termos de docentes”.

O prémio não pecuniário que vai ser entregue às 17h00, no Palácio da Independência, destacará anualmente uma temática diferente, indicou Mafalda Ferro, diretora da Fundação António Quadros.

RM

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Agência ECCLESIA

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