Cristianismo pode desaparecer no Sudão

Bispo de Cartum denuncia plano de «islamização» do governo sudanês e denuncia violações dos direitos humanos O Bispo auxiliar de Cartum, D. Daniel Kur Adwok, denunciou o plano de “islamização” do governo do Sudão, que pretende “erradicar” o Cristianismo do país. Em entrevista ao Programa ECCLESIA, o prelado refere que “o único programa do governo de Cartum é o da islamização”. Como exemplo, aponta a questão dos manuais escolares, que incluem citações do Corão em disciplinas como Geografia, História ou Matemática. A disciplina de Religião, obrigatória, é leccionada apenas por professores muçulmanos e só aborda matérias do Islão, independentemente da fé que os aluno professem. “O Cristianismo tende a desaparecer sem pilares de apoio em instituições intelectuais ou de assistência social”, alerta. Nas regiões meridionais, controladas pelo Sudan Popular Liberation Army-SPLA (Exército Popular de Libertação do Sudão), é possível à maioria cristã e animista desenvolver normalmente a actividade pastoral e de evangelização. A liberdade religiosa é em geral respeitada, apesar dos abusos e dos actos vexatórios da parte dos militares. Estes comportam-se frequentemente com arrogância quando são confrontados com a população e com os missionários, sem terem, porém, motivos estritamente ligados à religião. No Norte, pelo contrário, além de as minorias religiosas não serem protegidas, os não muçulmanos são tratados frequentemente como cidadãos de segunda classe, sendo ameaçados ou presos pelas forças policiais. Situações semelhantes acontecem nas áreas do Sul sob o controlo governamental, onde são evidentes os favoritismos aos muçulmanos e o processo de islamização das instituições públicas, não obstante se falar oficialmente de uma política de autonomia e de federalismo. O Bispo sudanês admite que a comunidade internacional acabe por não agir devido aos “interesses de cada nação”, seja por motivos económicos, seja por motivos ideológicos. Para o prelado, há um claro risco de fragmentação do Sudão que pode levar a uma guerra com muitas frentes. “A comunidade internacional espera que o Sudão seja um país unido, mas é preciso colocar essa expressão entre aspas, porque que valor poderá ter essa unidade para todos os sudaneses se a união promover apenas um aspecto cultural e religioso, o do Islão?”, questiona. A Constituição do Sudão garante a liberdade religiosa, mas, ao longo dos últimos anos, o governo continuou a limitar gravemente esse direito, considerando o Islamismo a religião do Estado e inspirando-se nele a nível legislativo, institucional e das políticas em geral. Darfur Relativamente à pior crise humana da actualidade, no Darfur, o Bispo sudanês pede um esforço internacional que assegure a segurança das populações e promova verdadeiras negociações de paz. “Os acordos de paz não se devem limitar a acabar a guerra no campo de batalha, mas devem promover a reconstrução e a reconciliação na sociedade sudanesa, garantindo os direitos de cada pessoa, seja ela cristão ou muçulmana”, aponta. A ONU é chamada a estabelecer-se no território como uma “terceira parte” que medeie o conflito e garanta a segurança, controlando os mercenários árabes do deserto. Segundo o bispo auxiliar de Cartum, fora dos campos de refugiados “não há segurança para ninguém”. Apesar da protecção da ONU estes acampamentos são atacados pelos mercenários árabes ao serviço do governo sudanês, os Janjaweed. Em apenas cinco anos, morreram no Darfur, vítimas da guerra, da fome ou da doença pelo menos 200 mil pessoas – os piores prognósticos apontam mesmo para cerca de meio milhão de mortes. Calcula-se que pelo menos 2,3 milhões tenham sido obrigadas a deixar as suas casas e a procurar refúgio em campos onde estão totalmente dependentes das Nações Unidas e organizações humanitárias. Todos os dias morrem pessoas, a maior parte das quais crianças. “A questão no Darfur é que o governo que a a terra das tribos africanas, que são muçulmanas (98% da população professa o Islão nesta região, ndr), é uma guerra para controlar o solo, a riqueza da terra”, referiu D. Daniel Adwok. Estas pessoas são expulsas para dar lugar às tribos nómadas do deserto, usando a terra para o gado e tornando-se agricultores. “Penso que é o objectivo é tirar a terra às pessoas do Darfur”, atira. Em relação à situação no Sul do país, a sair de mais de duas décadas de guerra civil, o prelado destaca o papel da Igreja no apoio aos deslocados e refugiados, em especial na área da educação. Após a assinatura de um acordo de paz, em Janeiro de 2005, ainda há muito por fazer, acusa este responsável: “os protocolos assinados ainda não foram implementados, as pessoas têm medo”. “O governo de Cartum não assinou este acordo de boa fé, foi pressionado para fazer algo que não queriam”, indica. O bispo auxiliar de Cartum conclui este Domingo uma visita de 10 dias a Portugal promovida pela Fundação Ajuda à Igreja que Sofre, organização dependente da Santa Sé que celebra este ano o seu 60.º aniversário. D. Adwok quis sublinhar o facto de, ao longo destes anos de guerra civil, a Fundação ter estado “sempre ao lado da Igreja”.

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