CRISE CLIMÁTICA e FÉ – Responsabilidade de “todos, todos, todos”

José Aníbal Barreiros, Diocese de Coimbra 

As questões ambientais estão na agenda pública desde a Conferência Internacional de Estocolmo, em junho de 1972, portanto há mais de cinquenta anos. Hoje, enquanto falamos de meio ambiente, continuamos a minar as condições de habitabilidade do planeta. As decisões são adiadas, como se a humanidade ainda tivesse tempo pela frente. A sua impotência para agir nem parece incomodá-la. Estamos a transformar o planeta juntos, sem que ninguém ache por bem fazê-lo. Sentimos que nos deparamos com escolhas que antes não dependiam de nós, e ainda assim sentimo-nos impotentes para mudar as coisas que dependem de nós. Precisamos de uma nova forma de pensar. O Papa Francisco reconhece que os cristãos, ao longo da história, nem sempre foram capazes de desenvolver uma relação saudável com o seu ambiente:

A encíclica Laudato Si (LS) publicada em 18 de junho de 2015, contribuiu certamente para sensibilizar as pessoas para os desafios que nos são colocados pelas alterações climáticas, já que o Papa afirma claramente que não há crises separadas, uma crise social, por um lado, e uma crise ambiental, por outro, mas uma crise descrita como socioambiental (LS). De facto, para o Papa, “tudo está interligado”. Também nos mostra a fragilidade dos equilíbrios ecológicos, das ameaças à biodiversidade, do esgotamento de recursos que, até há pouco tempo, pareciam inesgotáveis. Ou seja, coloca-nos a questão do futuro do planeta. Em que condições os nossos descendentes a encontrarão? A situação já parece irreversível. Os ambientalistas têm vindo a alertar que a atividade humana já mudou radicalmente o nosso ambiente planetário. O aquecimento global é um dos principais marcadores e impulsionadores disso. Os cientistas calculam que a humanidade produziu mais dióxido de carbono do que todos os outros organismos terrestres combinados; que a humanidade monopolizou mais da metade da água doce disponível na superfície terrestre e que causou o desaparecimento de mais de um quarto das espécies animais.

A crise ecológica é apenas a manifestação de uma relação desequilibrada com a terra, consequência da atividade humana: “Crescemos a pensar que éramos seus donos e senhores, autorizados a explorá-la” (LS 2). Há uma necessidade urgente de sair desse tipo de atitude, mas sem cair no excesso oposto de conceder a primazia a outras criaturas que não o homem: “Um antropocentrismo desviante não precisa necessariamente dar lugar a um ‘biocentrismo’, porque isso implicaria introduzir um novo desequilíbrio que não só não resolveria os problemas como acrescentaria outros” (LS). É também uma questão de coerência: “Não podemos exigir dos seres humanos um compromisso respeitoso com o mundo se não reconhecermos e valorizarmos simultaneamente as suas capacidades particulares de conhecimento, vontade, liberdade e responsabilidade” (LS).

“Esquecemo-nos de que nós mesmos somos pó (Gn 2,7). O nosso próprio corpo é feito de elementos do planeta, o seu ar dá-nos fôlego e a sua água nos revigora e nos restaura”, escreve o Papa Francisco logo no início de sua encíclica. Como habitantes da Terra, também somos feitos do mesmo material que a Terra e vivemos dos recursos que ela nos dá. Estamos constitutivamente ligados à natureza e isso impede-nos de conceber a natureza como separada de nós ou como uma mera estrutura para nossas vidas. Estamos incluídos nela, fazemos parte dela e estamos envolvidos com ela.

É por isso, que as Escrituras negam qualquer pretensão de propriedade absoluta. Quando o homem se comporta como dono absoluto da terra, não é apenas o planeta que está em perigo, mas também os pobres e as gerações futuras. A terra é uma herança comum, cujos frutos nos devem beneficiar a todos, inclusive os que vêm depois de nós. “Cada comunidade pode tirar da bondade da terra o que precisa para sobreviver, mas também tem o dever de protegê-la e garantir a continuidade de sua fertilidade para as gerações futuras” (LS).

A crise que estamos a enfrentar atualmente mede o tamanho, a urgência e a beleza do desafio que a humanidade tem de combater. Obriga-nos a questionar as nossas conceções de progresso, desenvolvimento, liberdade, futuro e estimula a nossa imaginação a inventar outras formas de viver. É na fé que o Papa nos convida a viver, na esperança de que Deus nunca abandona a humanidade em dificuldades, mesmo quando os homens são responsáveis por ela: «Deus, quer agir connosco e conta com nossa cooperação e também é capaz de obter algo de bom com o dano que provocamos» (LS). Mas também é um motivo eminentemente positivo que deve levar os cristãos a serem pontas de lança em termos de ecologia: a sua preocupação com a terra não é motivada pelo medo de uma catástrofe mais ou menos iminente, mas vem da vocação adequada do ser humano, «chamado para renovar todas as criaturas para o seu Criador» (LS), até a transfiguração final de toda a realidade, para criar um clima e uma cultura de proteção e mudança.

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