Diretor do Instituto de Estudos de Religião da UCP fala em experiência espiritual de «exílio» para os católicos, sem celebrações comunitárias
Lisboa, 08 mai 2020 (Ecclesia) – O diretor do Instituto de Estudos de Religião da UCP afirmou à ECCLESIA e Renascença que a pandemia de Covid-19 exige respostas de “sentido”, além das soluções técnico-científicas, perante feridas humanas que vão persistir no tempo.
“Mesmo que tenhamos amanhã uma vacina ou um tratamento eficaz, fica a pergunta acerca daquilo que vivemos e como o vivemos”, exemplifica Alfredo Teixeira, na entrevista semanal conjunta que é publicada e emitida a cada sexta-feira.
O antropólogo assinala que, enquanto “seres polifónicos”, as pessoas procuram respostas em vários contextos.
“As ofertas de sentido são múltiplas e os indivíduos, os grupos, as comunidades inscrevem-se nessa complexidade”, observa.
O diretor do Instituto de Estudos de Religião analisa o impacto da experiência de confinamento, em termos de vivência crente, e diz que muitos católicos se sentem numa espécie de “diáspora” ou “exílio”, mas outros estão a descobrir como a viver a fé em família.
Na situação das pessoas que vivem desse ponto de vista uma religiosidade mais vinculada comunitariamente, aquilo que acontece neste momento é claramente uma espécie de diáspora, de um certo sentimento de exílio espiritual, e que as pessoas estão na expectativa de voltar a reatar esses laços assim que puderem”.
Entre os momentos inéditos e marcantes que o catolicismo tem vivido destaca nesta pandemia, Alfredo Teixeira destaca a bênção extraordinária ‘Urbi et Orbi’, de 27 de março, numa praça de São Pedro vazia, que gerou uma “metamorfose da experiência de solidão” em “experiência de comunhão”, de crentes e não crentes.
“Foi um momento determinante, ecuménico, porque teve como mediador não propriamente a explicitação de uma doutrina, ou um código ritual muito estrito, mas antes um significado humano extremamente aberto, que acabou por ter uma importância muito grande”, refere.
O especialista acredita que o uso de máscara na Missa vai obrigar a “uma aprendizagem difícil”, “uma experiência de grande estranhamento” para os católicos do Ocidente, e fala da importância que “a cultura, as artes, os discursos, as narrativas” têm tido neste período.
“Estes contextos de uma forte experiência de vulnerabilidade humana foram sempre contextos de forte elaboração simbólica, sob o ponto de vista religioso”, acrescenta.
O diretor do Instituto de Estudos de Religião da UCP destaca, em particular, a nova presença da Igreja Católica, capaz de “habitar os contextos de vida digital”.
Habitá-los implica, obviamente, conhecer e falar a sua gramática, e eu julgo que a experiência que algumas comunidades fizeram vai ajudar nesta mutação, deixar de pensar nestes meios apenas nessa lógica instrumental, de meios de comunicação, para os pensarmos como contextos vitais, onde a vida acontece”.
O entrevistado considera que uma das marcas do confinamento, durante a pandemia, será a questão do luto, dado que muitas famílias vieram a perda de entes queridos “com uma particular dificuldade”, que deve ser acompanhada.
“Julgo que será com certeza uma das zonas mais sombrias desta experiência crítica”, acrescenta.
Ângela Roque (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)