Cardeal Saraiva Martins esteve em Portugal para uma conferência sobre a encíclica «Caritas in Veritate»
“Toda a corrupção é antidemocrática”. O Cardeal Saraiva Martins, prefeito emérito da Congregação para as Causas dos Santos, afirma que numa “democracia autêntica não é concebível a existência de corrupção”.
D. Saraiva Martins acrescenta ainda que “quem governa tem de ser claro e leal com os cidadãos. Tem de haver uma grande lealdade e clareza nos políticos e respeito pelos cidadãos”.
Em declarações à Ecclesia no contexto de uma deslocação a Portugal para uma conferência sobre a encíclica de Bento XVI «Caritas in Veritate», promovido pela Paulus Editora e pela Agência Ecclesia, o Cardeal Saraiva Martins comentou os casos de justiça e corrupção que a opinião pública acompanha presentemente.
“A existência de corrupção entre os governantes mina a confiança que os cidadãos têm em quem governa”, exprime o prefeito emérito que considera ainda o princípio de justiça como “fundamental”.
“Os cidadãos exigem dos seus governantes justiça. A justiça deve existir para todos, independentemente do lugar que se ocupe”.
A última encíclica de Bento XVI segue “esse mesmo sentido. A ética compreende tudo isso”.
Actualidade de «Caritas in Veritate»
O Cardeal Saraiva Martins considera que a encíclica «Caritas in Veritate» “daria uma ocasião muito boa ao Papa para (na viagem que vai fazer a Portugal, ndr.) repetir os princípios que aborda no que respeita à ética. Portugal e todo o mundo precisa de ouvir esta mensagem”.
Sobre a realidade portuguesa, o Cardeal Saraiva Martins indica haver “sempre o perigo de esquecer a ética”.
“Devemos ser claros na aplicação de princípios e doutrinas, evitar toda e qualquer ambiguidade, sobretudo quando se fala aos cidadãos. Os governantes exprimem-se de forma equívoca para os cidadãos. A claridade devia ser uma virtude dos políticos”.
O prefeito emérito da Congregação para as Causas dos Santos considera que a encíclica «Caritas in Veritat» tem um contributo “muito importante e actual”.
“A economia precisa da ética, a ética precisa da caridade e a caridade precisa da verdade. Este é o núcleo da encíclica”, explica, recordando palavras de Bento XVI ao referir que a depressão económica só será suprimida se “se vencer a depressão ideal e o esmorecer da esperança”.
“O problema da economia nunca será resolvido se os grandes políticos e economistas do mundo não tiverem a preocupação de seguir os princípios da ética, da ética humana, não a cristã. Se for humana já é cristã”.
Esta exigência obriga a uma “mudança de comportamentos”, mas segundo o Cardeal, “é o único caminho para uma solução eficaz que de outro modo não encontra solução”.
A persistência no mesmo modelo económico, apesar de perpetuar a pobreza e as desigualdades, deve-se segundo o Cardeal Saraiva Martins a uma “miopia entre os governantes do mundo que não querem ver a realidade de que todos os homens são vítimas”.
O prefeito emérito considera “escandaloso” que no ano 2009 ainda haja mais de um bilião de pessoas a morrer de fome e na miséria. “É escandaloso que a cada três minutos morra uma criança no mundo. São problemas que deviam preocupar as pessoas. A solução para estes problemas é sempre a ética. Considerar o homem como homem e não pensar que o homem é para a economia. É ao contrário. O homem deve estar no centro de economia. Se nos esquecermos desta centralidade humana não conseguiremos resolver a crise actual, nem as que virão certamente”.
A Encíclica «Caritas in Veritate» recorda precisamente que o homem “tem de mudar de caminho, sem prescindir dos caminhos da ética, mas tê-los em conta para resolver os problemas para sempre”. O Cardeal Saraiva Martins acredita que este caminho é conseguido através de “pequenas mudanças mas também outras globais”.
“No mundo da globalização é preciso uma solução global”.
A necessidade da reforma das Nações Unidas, tal como pede Bento XVI na sua última encíclica, será possível se “os potentes o quiserem”. Depois de tantos anos de vida “as Nações Unidas precisam ser reformadas. O próprio Conselho de Segurança necessita de uma mudança, pois praticamente está na mão de um «grupinho»”.
O Cardeal Saraiva Martins afirma ainda que não sendo um problema directo para a Igreja se ocupar “acredito que as estruturas globais mereciam uma reforma. Isto supõe muita coragem. Há interesses de vários países, mas devemos dar a primazia ao bem da humanidade e não a um ou a outro país”.
Visita do Papa a Portugal
Acerca da visita que Bento XVI vai fazer a Portugal, em Maio de 2010, o Cardeal Saraiva Martins aponta o carácter ecclesial. “A abordagem a outros temas, inclusivamente junto de entidades governativas, estarão dependentes da vontade do Papa”.
A visita do Papa tem como intenção “visitar Fátima” para “sublinhar a importância que o fenómeno tem não só para os portugueses mas também para a Igreja universal”.
Quanto ao programa da visita “está dependente da disponibilidade de Bento XVI”.