COP30: Bispos da África, América Latina e Ásia lançam apelo conjunto contra «falsas soluções» para a crise climática
1 Julho, 2025 11:05
Documento apresentado no Vaticano contesta « capitalismo verde» e modelos de desenvolvimentos baseados «no extrativismo, na tecnocracia e na mercantilização da natureza»
Cidade do Vaticano, 01 jul 2025 (Ecclesia) – As Conferências e Conselhos Episcopais católicos da África, América Latina e Caraíbas e Ásia lançaram hoje um apelo conjunto para a COP30, que vai decorrer este ano no Brasil, alertando para as “falsas soluções” que têm sido apresentadas para a crise climática.
“Em reconhecimento ao consenso científico sobre a necessidade de limitar o aquecimento global a 1,5 graus Celsius, para evitar consequências catastróficas, elevamos uma voz profética que clama por paz a partir de uma conversão ecológica que transforme o modelo de desenvolvimento atual, baseado no extrativismo, na tecnocracia e na mercantilização da natureza”, refere o “apelo por justiça climática e a casa comum”.
O texto, apresentado em conferência de imprensa no Vaticano, propõe “conversão ecológica, transformação e resistência às falsas soluções”.
A Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30) vai decorrer entre os dias 10 e 21 de novembro, na cidade brasileira de Belém, no Pará.
Os bispos católicos alertam para os “impactos irreversíveis nos sistemas climáticos e naturais” em várias regiões, sublinhando que “a crise climática é também uma crise de valores que gera violência”.
“A ecologia integral propõe uma mudança estrutural nas economias e nos modelos de desenvolvimento, superando paradigmas tecnocráticos e extrativistas que perpetuam a exploração dos povos e a degradação ambiental”, advertem os signatários.
Rejeitamos as ‘falsas soluções’ da financeirização e mercantilização da natureza, opondo-nos aos mecanismos de compensação de carbono e à financeirização dos bens comuns, que transferem indevidamente o ónus de reduzir emissões de quem as causa para quem as sofre, priorizando o lucro em detrimento da vida, e que perpetuam a exploração da terra, de seus seres vivos e de seus povos, em vez de abordar as causas da crise.”
O apelo conjunto defende a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis e “uma transição energética justa, inclusiva e sustentável”.
“Condenamos o ‘capitalismo verde’, a mineração e o ‘monocultura energética’, que sacrificam comunidades e ecossistemas; e exigimos uma transformação económica radical que favoreça as condições para que a vida na Terra prospere”, pode ler-se.
Os responsáveis sublinham a necessidade de um acesso universal a “recursos para a reparação de perdas e danos, mitigação e adaptação”.
“Defendemos a soberania dos povos indígenas e comunidades tradicionais sobre seus territórios, essencial para a proteção dos ecossistemas aquáticos e terrestres”, acrescenta o documento.
Exigimos que os países ricos reconheçam e assumam sua dívida social e ecológica, como principais responsáveis históricos pela extração de recursos naturais e pela emissão de gases de efeito estufa; e se comprometam com um financiamento climático justo, acessível e eficaz, que não gere mais dívidas, para reparar perdas e danos e fortalecer a resiliência no Sul Global.”
Foto: Lusa/EPA
As Conferências e Conselhos Episcopais católicos da África, América Latina e Caraíbas e Ásia criticam a “postura abertamente negacionista e de apatia adotada por setores super-ricos, as ‘elites do poder’, em relação à responsabilidade humana” perante a crise do clima.
No encontro com os jornalistas, na sala de imprensa da Santa Sé, o cardeal brasileiro D. Jaime Spengler, presidente do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), assumiu que “não faltam vozes negacionistas”.
“Do coração da Amazónia, ouvimos um grito que clama: como podemos permitir que um mercado sem regulamentações éticas decida o destino dos ecossistemas mais vitais do planeta?”, questionou o também presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
O responsável católico condenou a “recente abertura de novos poços de petróleo, ainda mais grave na Amazónia, e a mineração abusiva em nome da sustentabilidade, mineração esta que, em não poucas regiões, produz morte”.
O cardeal Spengler adiantou que vai ser criado um Observatório de Justiça Climática, promovido pela Conferência Eclesial da Amazónia (CEAMA).
Questionado sobre uma eventual presença do Papa na COP30, o presidente da CNBB referiu que Leão XIV “deixou a questão em aberto”, após o encontro que teve hoje com os responsáveis pela apresentação do apelo conjunto.
Já o cardeal Fridolin Ambongo Besungu, arcebispo de Kinshasa (República Democrática do Congo) e presidente do Simpósio das Conferências Episcopais da África e do Madagáscar (SECAM), alertou que, “em nome da ‘transição energética’, comunidades inteiras são destruídas na busca por lítio, cobalto ou níquel?”.
“Como podemos tolerar que os mercados de carbono transformem as nossas florestas em ativos financeiros, enquanto as nossas comunidades continuam sem acesso a água potável?”, questionou.
O documento foi apresentado hoje, no Vaticano, ao Papa Leão XIV.