Acção dos religiosos nasce e alimenta-se da oração comunitária
A Congregação dos Sagrados Corações (de Jesus e de Maria) está em Portugal há quase 80 anos. Contemplar, viver e anunciar a mensagem cristã é o objectivo de vida dos religiosos, que convivem com os pobres de alguns dos bairros mais remotos da Grande Lisboa.
A oração comunitária é a fonte onde os dois holandeses, dois espanhóis e dois portugueses se renovam: “A missão tem que partir da comunidade, e a comunidade alimenta a missão. Uma comunidade é como uma família: precisamos de atenção constante uns para com os outros”, diz o Pe. Henrique Scheepens, que chegou a Portugal há quase 50 anos.
“A nossa vida comunitária protege-nos e alimenta-nos. A vida de família também faz parte do nosso carisma”, observa o superior da comunidade, Pe. Luís Garcia.
Cada religioso tem três corações
“Somos dos Sagrados Corações, pelo que é como se cada um de nós tivesse três: de Jesus, de Maria e o nosso próprio”, explica o Pe. Luís. A concretização desta espiritualidade “passa pela descoberta do coração do outro”.
“Insistimos muito em ser companheiros e compassivos” a partir da “contemplação de Deus”, refere o Pe. António Vega del Riego.
O Pe. Francisco Waalders indica à reportagem do programa ECCLESIA a prioridade da comunidade religiosa: “Marcar presença”. E acrescenta: “Jesus Cristo também não estava preocupado [com planos pastorais]. Andava no meio das pessoas. Uma palavrinha aqui, outra acolá. Isto é a nova evangelização”.
Carla Santos, presidente da Associação de Melhoramentos do Bairro do Talude Militar, reconhece que a população “é mesmo muito religiosa”. Por isso espera que as parcerias com a paróquia cresçam a partir do próximo ano.
Afirmar a especificidade da missão
“Não gosto da fome, da injustiça, do ódio, da miséria nem da Gripe A…”, diz o Pe. Luís Garcia. “Mas gosto deste mundo e das pessoas. E acredito que o Senhor também está aqui para fazer crescer no positivo e lutar contra tudo o que se opõe à proposta do Reino”, acrescenta.
“Temos o nosso papel de animadores espirituais, levando o consolo às pessoas e dando a mão a quem não tem quem lha estenda”, afirma o superior das comunidades de Portugal e Espanha, Pe. Ignácio Moreno.
Para se dedicarem por inteiro aos fiéis, os religiosos optaram por entregar as tarefas administrativas a pessoas “que governam as coisas muito melhor”. O responsável pelas comunidades da Península Ibérica defende que os padres não têm que monopolizar a vida cristã: “É preciso fazer crescer os outros”, porque “têm muitas coisas a dizer e a fazer”.
Escassez de religiosos obriga a novas estratégias
Na Europa, o envelhecimento dos religiosos e a diminuição da entrada de novos membros na congregação – ao contrário da tendência verificada na Ásia e em África – tem aumentado as dificuldades no atendimento às populações.
Esta conjuntura obriga a traçar novas estratégias. Desde Setembro que os quatro padres da comunidade dividem solidariamente as responsabilidades das paróquias de Catujal, Charneca e Unhos.
“É uma realidade que preocupa, porque não podemos fazer tudo o que queríamos”, afirma o Pe. Ignácio Moreno. O superior provincial deixa, no entanto, uma nota de esperança: “O que não podemos fazer, Deus pode”.
Breve história dos Sagrados Corações
A Congregação dos Sagrados Corações foi fundada na noite de Natal de 1800, por José Maria Coudrin, padre da diocese de Poitiers (França) e por uma jovem da nobreza, Henriqueta Aymer de la Chevarie, dividindo-se desde o início nos ramos masculino e feminino. A adoração ao Santíssimo Sacramento foi o elemento distintivo desta ordem religiosa.
Em Portugal, a primeira missão da congregação consistiu em dirigir o Seminário dos Olivais, em Lisboa; os padres – três franceses e um holandês – chegaram em 1931, tendo permanecido 14 anos à frente da instituição. Os dois últimos sacerdotes saíram em 1947.
Entre 1939 e 1967, a congregação dedicou-se às missões populares no Patriarcado de Lisboa. Em 1957 fundou, na Ilha Terceira, o Seminário Menor Padre Damião, que encerrou em 1971. Os religiosos criaram outro seminário em Baltar, Porto.
O carácter missionário dos Sagrados Corações estendeu-se a Moçambique. No dia 11 de Novembro de 1956 chegavam a Inhaminga, diocese de Beira, os primeiros presbíteros, numa missão que continua até hoje, já como Província de África.
O Pe. Damião de Veuster (Bélgica, 1840 – EUA, 1889) é um dos mais conhecidos membros da congregação. Aos 33 anos foi viver com os leprosos da ilha de Molokai (Havai). Morreu dezasseis anos depois, com lepra. Foi canonizado (declarado santo) no passado dia 11 de Outubro.
Foto: Igreja da Paróquia de São Silvestre de Unhos, diocese de Lisboa