Diretor do Centro de Estudos de História Religiosa da UCP recorda evolução do processo de eleição dos pontífices e reflete sobre desafios da sucessão de Francisco

Lisboa, 03 mai 2025 (Ecclesia) – O diretor do Centro de Estudos de História Religiosa (CEHR) da Universidade Católica Portuguesa (UCP), Paulo Fontes, considera que os últimos pontificados mostraram à Igreja que é neceesário um perfil diferente da ideia de um “Papa de escritório”.
“Eu penso que a Igreja ganhou destes papados a ideia de que não pode ter um Papa de escritório, um Papa fechado, de cúria. Tem de ser um Papa com capacidade de presença no mundo secular, no mundo da comunicação, e, portanto, isso exige um pouco de carisma próprio e determinado”, refere, em entrevista à Agência ECCLESIA.
Depois da morte do Papa Francisco, a 21 de abril, na sequência de um AVC, a Igreja Católica vive um período de Sede Vacante, à espera do próximo Conclave, cuja cerimónia de entrada está marcada para a tarde de 7 de maio.
Segundo Paulo Fontes, a Igreja tem duas possibilidades quanto ao perfil do futuro Papa: ou elege um pontífice “mais idoso”, que “vai fazer uma certa transição, inscrevendo-se na linha do que foi pontificado de Francisco”, ou a escolha aponta no sentido de “uma personalidade um pouco mais nova, também ela necessariamente carismática”.
O docente universitário destaca que há dinamismos que foram abertos na Igreja que se fossem parados ou encerrados, se criaria um “grande museu”.
Como todos sabemos, os museus hoje têm grande dificuldade de sobreviver, até financeiramente. E, portanto, nós não precisamos de igrejas para fazer museus, nós precisamos de igrejas que sejam expressão da vida das pessoas, das comunidades, na procura dessa esperança que pode animar as sociedades e os povos”.
Sobre a forma de eleição de um Papa, Paulo Fontes contextualiza que desde o século XI ficou estabelecido que haveria um “corpo fixo de cardeais” que ficariam com a responsabilidade de eleger o pontífice, que eram, originariamente, sobretudo, do clero local e da própria igreja italiana.
“Com o fortalecimento desta estrutura que nós chamamos de papado, com o estabelecimento de uma cúria pontifícia que tem esta missão de assessorar o Papa no governo universal da Igreja, com a perda dos estados pontifícios, esta escolha foi sendo entendida, cada vez mais, não apenas como a cabeça da Igreja”, explica.
De acordo com o diretor do CEHR da UCP, assim nasceu o Conclave, que consiste na reunião de cardeais com o direito de eleger e de serem eleitos, ficando “encerrados num espaço”, com “regras para escolher o sucessor de Pedro” e prazos para o fazer.
Antes, decorrem as congregações gerais, reuniões preparatórias do Conclave, um processo que Paulo Fontes considera ser “fundamental”, uma vez que o corpo de cardeais se internacionalizou e é preciso que estes se conheçam entre si.
Neste momento, o corpo é “exclusivamente masculino”, indica o docente universitário, no entanto, com o acesso das mulheres a lugares de destaque na vida da Igreja, esta é uma questão que seguramente vai estar no futuro.
“Se há religiosas, por exemplo, que estão à frente, ou leigas, de dicastérios romanos, não se percebe que depois não haja aqui, pelo menos neste diálogo da realidade”, referiu.
Sobre o processo sinodal promovido pelo Papa Francisco, Paulo Fontes refere que qualquer pontífice que venha a ser eleito, “tem que se comprometer com este objetivo e com esta dinâmica que está lançada”.

“A tradição na igreja é sempre uma tradição viva e, portanto, a novidade inscreve-se sempre numa tradição”, realçou o diretor do CEHR da UCP, que assinala que entre todos os pontificados é possível identificar “elementos de inovação” e, ao mesmo tempo, “elementos de continuidade muito fortes”.
“Há um elemento de continuidade evidente entre o Papa Francisco e o Papa João Paulo II. É a sua capacidade de presença no espaço público. Isso é incontestável”, exemplifica.
Segundo Paulo Fontes, o Papa Francisco é um “homem que acentua” o “sentido salvífico de que a esperança anima aos cristãos e a alegria deve contagiar a partir do Evangelho”.
“Com estas duas tónicas teve também uma capacidade de gerar confiança, gerar empatia, gerar reconhecimento, gerar diálogo, gerar aceitabilidade. E essa é, talvez, a grande herança deste papado”, identifica.
O historiador lembra a ida à ilha de Lampedusa (Itália), primeira viagem do pontificado, em 2013, o gesto do lava-pés em prisões como gestos concretos do Papa Francisco que permitem às sociedades e às comunidades cristãs estarem mais atentas às realidades das periferias.
A conversa com Paulo Fontes está incluída no programa ’70×7′ deste domingo, transmitido pelas 07h31, na RTP2, dedicado ao novo capítulo da história da Igreja Católica, com a morte do Papa Francisco e o início do Conclave.
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