Conclave 2025: Cardeais desafiados a superar critérios «do poder e do domínio», assumindo caminhos abertos por Francisco

Primeira meditação proposta antes da eleição papal foi apresentada por monge beneditino

Foto: Vatican Media

Octávio Carmo, enviado da Agência ECCLESIA ao Vaticano

Cidade do Vaticano, 29 abr 2025 (Ecclesia) – O religioso beneditino Donato Ogliari, abade de São Paulo Fora de Muros, em Roma, desafiou hoje os cardeais responsáveis pela eleição do novo Papa a superar critérios “do poder e do domínio”.

“A Igreja enraizada em Cristo é uma Igreja aberta, corajosa e profética, que abomina as palavras e os gestos violentos, que sabe ser a voz dos que não têm voz e que, se necessário, sabe também ser uma voz fora do coro para apontar obstinadamente os caminhos da justiça, da fraternidade e da paz”, assinalou o sacerdote italiano, na primeira das duas meditações que os cardeais vão ouvir antes do Conclave, com início marcado para 7 de maio.

O religioso falava na sexta reunião (congregação) geral dos cardeais, que decorreu esta manhã, no Vaticano, perante 183 participantes, dos quais 124 eleitores.

Estes momentos de reflexão estão previstos na Constituição Apostólica ‘Universi Dominici Gregis’ (UDG, n. 13) e são uma das novidades da Sé Vacante, introduzidas por João Paulo II.

A segunda meditação diz respeito à escolha “iluminada” do Papa e vai ser oferecida, já dentro da Capela Sistina, pelo cardeal Raniero Cantalamessa, antigo pregador da Casa Pontifícia.

O abade Donato Ogliari destacou a importância da escolha do Papa, convidando os responsáveis a evitar as “sugestões e lisonjas do mundo”, que levam a “diluir a força vital e profética do Evangelho de Jesus”.

A Igreja enraizada em Cristo é uma Igreja mestra de fraternidade, ensinada com palavras e gestos marcados pelo respeito mútuo, pelo diálogo, pela cultura encontro e pela construção de pontes e não de muros, como o Papa Francisco sempre nos convidou a fazer”.

O religioso destacou a importância de uma Igreja capaz de “ir ao encontro dos irmãos e irmãs da humanidade” que sentem “a falta de sentido da vida ou são marcados pelo estigma da marginalização e da exclusão”.

“O Papa Francisco trouxe de novo para o centro do olhar da Igreja todos aqueles que as nossas sociedades opulentas e egoístas consideram como rejeitados, nomeadamente os pobres, os deserdados, os últimos”, acrescentou.

A intervenção destacou o papel do falecido pontífice na denúncia das “causas estruturais da pobreza, devidas ao contexto económico e social” e elogiou a sua nova “perspetiva teológica, graças à qual os pobres já não são considerados apenas à luz de uma abordagem sociocultural e histórica – como párias, de facto – mas são compreendidos dentro de uma categoria teológica”.

“A Igreja não deixará de continuar a ter os olhos e o coração bem abertos para os últimos da terra, carne viva de Cristo no mundo”, insistiu.

O abade Donato Ogliari falou ainda do “caminho sinodal” percorrido nos últimos anos, por iniciativa de Francisco, considerando que “produziu chamas de participação e de renovação em todos os cantos do mundo”.

“Creio que este é um claro sinal dos tempos, uma ação do Espírito que nos convida a promover”, sustentou.

Em particular, creio que o caminho do diálogo, no qual a Igreja há muito está empenhada e que o Papa Francisco intensificou em todas as frentes, deve ser prosseguido sem medo”.

A meditação assinalou várias questões contemporâneas, como a “mudança antropológica” ou “a convulsão das regras de convivência entre os povos e nos abusos, conflitos e guerras fratricidas que daí resultam”.

Os cardeais foram convidados a refletir sobre a “disseminação de autocracias e nacionalismos”, a “emergência de liberalismos pós-capitalistas”, a “devastação da criação”, o “avanço das tecnociências”, o “fenómeno mundial da migração”, a “secularização generalizada e invasiva” ou uma “conceção exclusivamente técnico-funcional” da realidade.

Já esta segunda-feira, na terceira Missa de sufrágio pelo falecido Papa, o vigário-geral para a Diocese de Roma dirigiu-se diretamente aos cardeais, apontando a tarefa de procurar um Papa para “discernir e ordenar” as reformas e os processos iniciados por Francisco, que evocou como um “pastor universal”.

“A barca de Pedro precisa desta navegação ampla que ultrapassa as fronteiras e surpreende”, acrescentou o cardeal Baldo Reina.

O responsável que Francisco escolheu como seu “braço direito” na Diocese de Roma sustentou que o pré-conclave “não pode ser um momento de equilibrismo, táticas, cautela, um momento que ceda ao instinto de voltar atrás ou, pior ainda, à vingança e às alianças de poder”.

“É necessária uma disposição radical para entrar no sonho de Deus confiado às nossas pobres mãos”, disse, na homilia da celebração a que presidiu na Basílica de São Pedro.

OC

 

 

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