Comunicações: «Na guerra entre a realidade, a verdade e a perceção, a necessidade e sentido de urgência de defender o que é de todos, assenta em todas as pessoas» – João Pedro Mendonça

Editor de Desporto da RTP, João Pedro Mendonça é um apaixonado por pessoas e pelo jornalismo, um «privilégio» que assume poder fazer há mais de 35 anos, que nasceu na rádio, em Monsanto, e o tem levado a locais inesperados, sempre à procura de «saber contar» as pessoas que encontra e o contruir «comunidade»

Foto: Agêncua ECCLESIA/LS

Lisboa, 24 set 2025 (Ecclesia) – O jornalista João Pedro Mendonça disse que se vive um tempo em que a “perceção é mais importante do que a realidade”, e que a responsabilidade tem de ser “assumida” por cada pessoa, com sentido de “urgência para defender o que é de todos”.

“Eu não sei quem é que vai ganhar essa guerra entre a realidade, a verdade e a perceção. Não vou qualificar a ética dos mercadores da perceção. O verdadeiro preço disto é que, cada vez mais, está assente em ti, no indivíduo, o sentido de necessidade e o sentido de urgência de defender aquilo que é de todos”, referiu à Agência ECCLESIA.

O atual editor de desporto na RTP tem uma carreia de mais de 35 anos no jornalism, com início na rádio, em Monsanto, e desenvolvida na editoria de desporto da Rádio Renascença.

João Pedro Mendonça afirma ser um “privilegiado” por ter uma profissão que lhe permite continuar a “perguntar, escutar e saber contar”.

“Sim, é a minha paixão. Se alguém te dá a possibilidade de testemunhar tu próprio aquilo sobre o qual tens de curiosidade, porquê preferir que seja outra pessoa a fazê-lo? E essa é uma oportunidade que o meu trabalho me dá. Poder testemunhar e depois, ter o dever e a lealdade para aqueles que o jornalismo serve”, regista.

O espanto e a ignorância são das melhores ferramentas jornalísticas que eu conheço. Porque a ignorância é o que te faz perguntar, é o que te faz questionar e a ti e aos outros, é o que te faz olhar com mais atenção. Se isso ajudar a condicionar o atropelo que o maldito ego tem em cada um de nós, no emissor e no receptor, isso então é maravilhoso.”

Vencedor do Prémio Gazeta, a área da televisão pela reportagem, em 2021, com o trabalho ‘Confinado na Aldeia’, cujo conteúdo retrata a vivência, durante o tempo da pademia, dos habitantes de Monsanto, João Pedro Mendonça recorda ter-se sentido na obrigação de registar as pessoas.

“Há ali uma certa perversão. Nós estávamos numa paragem do tempo. Aquela reportagem cola-se àquele momento e é irrepetível para mim, não pelo prémio ou reconhecimento. Tu tinhas muito mais atenção das pessoas à comunicação, as pessoas estavam fechadas. Eu tinha uma circunstância em que estar fechado era estar aberto, porque o meu confinamento era de ar livre, e naquela circunstância tão peculiar, tão contrastante com a realidade dos outros, senti-me compelido a guardá-la”, recorda.

Nascido na zona da grande Lisboa, “as férias grandes de verão” eram passadas em Monsanto e se a horta da avó “era já um ganho para um miúdo”, o rádio do tio Joaquim Fonseca fez João Pedro descobrir que queria ser jornalista.

O bichinho da rádio é o abrir a alma sem mostrar a cara; é ter medo do silêncio e conseguir atropelá-lo; é chegar diretamente ao ouvido da pessoa. Em Monsanto a rádio era feita de gente, não para ganhar prémios mas com nomes mal pronunciados, com concursos onde participantes de 80 anos me traziam um galo pedrês. A rádio é dedicada à alma.”

Em reportagem é junto da comunidades, construída com pessoas, que procura fazer o seu trabalho: “Às vezes digo isto: ‘Parem de procurar pastéis de nata em todo o que é país. Parem e procurem a diferença. E depois, na diferença, procurem a semelhança. Eu não vou à procura do meu pastel de nata em Tóquio; eu vou à procura daquilo que em Tóquio, é o pastel de nata, e, depois, vejo na afinidade que têm com aquele objeto ou alimento, procuro aquelo que eu sinto. Tu tens de procurar a porta, mas convém que entres. O que mais gosto e o que o trabalho me proporciona é, exatamente, esse sentido do bairro. Sou viciado nesse sentido do bairro”.

É na aldeia de Monsanto que João Pedro Mendonça tem construído “comunidade” e confirma os laços com “o que de mais interessante existe de mutável” – “as pessoas, a sociedade”.

A coisa que mais me espanta, mais me cola com honra àquele sítio, é o que as pessoas conseguem fazer num sítio tão inóspito. Porque ali, para ter uma horta, tens que caminhar, descer e subir, com as pernas, com o efeito da idade; ali, para construir uma casa, tens que domar os blocos enormes de granito maiores que prédios de Lisboa. E houve gente, com ferramentas primárias, como o meu avô, que era pedreiro, que conseguiu de forma notável.”

A conversa com João Pedro Mendonça pode ser acompanhada esta noite no programa ECCLESIA na Antena, pouco depois da meia-noite, e disponibilizado no podcast ‘Alarga a tua tenda’.

LS

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