Cinema: Tabu

Três anos depois de estrear “Aquele querido mês de Agosto”, o realizador português Miguel Gomes conquistou o público e a crítica além-fronteiras com o seu mais recente “Tabu” que chega esta semana ao circuito comercial nacional.

“Tabu” é uma composição cinematográfica que desafia o tempo, combinando de forma extraordinária um registo clássico que muitos aproximam de Murnau, sobretudo no silêncio e no jogo de contrastes que o próprio realizador não desmente, e um olhar contemporâneo sobre a relação portuguesa, não política mas afetiva, com África.

Foi mesmo o seu caráter inovador que o levou ao prémio Alfred Bauer, além do FIPRESCI (imprensa cinematográfica internacional) na mais recente edição da Berlinale.

O filme traz-nos reminiscências de demandas como a de Serpa Pinto, que percorreu a África portuguesa de costa a costa a pedido do rei na mesma época que Ivens e Capelo, mas muito mais só. Por essa mesma razão, se entregou o explorador e representante do rei não só ao registo científico e geográfico de que era incumbido, juntamente com a defesa da recente abolição da escravatura, mas igualmente à reflexão, fundamental para a progressiva ligação que estreita com as gentes imensas com que se cruza.

Mas isto é apenas o princípio. Aqui, há duas partes: o “paraíso perdido”, centrada na velhice e morte de Aurora; e a incursão ao “paraíso”, narrado, que foi a sua vida.

Há uma história de vida, mas importam sobretudo os afetos que ainda hoje ligam um sem número de portugueses a Moçambique: do que tem de mais exótico e surpreendente, louco, aventureiro, alimentando sonhos e medos, ao mais concreto e real, quotidiano.

Há passado e há presente, há juventude e velhice; há amizades e desconfianças. Há a relação colonial que foi em diálogo com a ideia presente do que terá sido.

Por detrás, a memória. O morno sibilar de acácias rubras, o tórrido calor da gente e das paisagens, o único e raríssimo som do silêncio… evocações que são, afinal, o que nunca tem nacionalidade e no entanto definem, verdadeiramente, a pátria e identidade de cada um de nós.

Margarida Ataíde

 

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Agência ECCLESIA

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