Num futuro incerto, algures em África, uma reunião do conselho de presidência é subitamente interrompido por um forte tremor de terra. Cada um procura salvar a sua pele, mas o que resta de um cenário apocalíptico de decadência é um bando de meninos deixado à sua sorte.
Reféns de um menino soldado, que subjuga os demais à sua vontade, o restante grupo consegue organizar-se para finalmente se libertar da sua prepotência e da ameaça da arma que aquele empunhava. Juntos, seguem um caminho incerto até chegarem a uma cidade inteiramente governada por crianças.
Aqui, reinam a paz e a concórdia, com cada um a desempenhar uma tarefa específica em prol de todos. Exausto, o bando errante é bem acolhido e tratado, mas para poder permanecer, além dos três dias de tolerância concedido a forasteiros, os seus membros devem provar que aprenderam a viver sob a lei do bem comum: cuidar de si e dos outros e manterem-se unidos, como um só.
O mais reconhecido cineasta guineense, Flora Gomes está de volta com esta sua ‘República de Mininus’, dois anos após termos podido aceder, ainda que apenas no circuito cultural em sala e na RTP, ao documentário ‘As Duas Faces da Guerra’ – co-realizado com Diana Adringa sobre duas perspetivas, a de luta de libertação para uns, guerra colonial para outros, de uma mesma guerra.
‘República de Mininus’ é um conto de uma ingenuidade tocante que, mesmo aquém do domínio estético de ‘A Minha Voz’ (Prémios Signis, Cidade de Amiens e Lanterna Mágica em Veneza), da força simbólica de ‘Pau de Sangue’ ou da agilidade de ‘Os Olhos Azuis de Yonta’, carrega em si a simplicidade e profundidade de uma mensagem de esperança para África e para o Mundo colocada nas mãos da geração do futuro. Aquela a que se não faltassem, ao cabo de um percurso de experiência e conhecimento feito, o ímpeto, a pureza e a simplicidade da infância, seria capaz de renovar a face da terra, aplicando com extraordinária facilidade, por meio de um conjunto de regras que observassem o princípio do bem comum, justiça e equidade comunitárias.
Em parte, essa ausência de experiência e domínio cinematográfico já comprovado, poderia ser justificado pelo eventual propósito de conceber uma obra quase ‘de crianças para crianças’, o que não deixando de o ser, desde já recomendado pelo seu caráter pedagógico, não se excluiigualmente como cumprimento de um cinema para adultos.
Um cinema que não encherá o olho pela sua vertente técnica mas capaz de evocar um tempo e um espaço em que nós, agora ‘demasiado crescidos’ e presos à complexidade dos nossos impossíveis, resolvíamos os males do (nosso) mundo de forma extraordinariamente fácil, possível… e real.
Margarida Ataíde