À saída deste artigo, já “Nos Idos de março” terão uma semana sobre e estreia em Portugal. Significa que muitos o terão já visto, mas muitos estarão ainda por ver, dada a pouca consensualidade da crítica sobre a sua qualidade e valor.
Estreia na realização de um dos mais charmosos atores de hoje, George Clooney, eis o seu salto para detrás das câmaras, ainda que desta feita sem abdicar totalmente de algum protagonismo.
Digo “algum” pois apesar de ser ele o Governador em torno de cuja candidatura gira todo o filme, não é ele, Mike Morris, exatamente a figura central da história. Ou melhor, vai sendo progressivamente afastado do epicentro. E é neste movimento que reside um dos maiores pontos de interesse do enredo de “Farragut North”, a peça da Broadway da autoria de Beau Willimon que serviu de base a este filme.
A outra inspiração, mais conhecida e que deu origem ao título do filme, provém do célebre alerta na peça Júlio César de Shakespeare, “Estai atentos aos idos de março” (“Beware of the Ides of March”), advertência que evoca a profecia da morte de César proferida por um adivinho, em março, que o imperador tanto desprezara.
Está assim sugerido, que este “Idos de março”, como o emaranhado de intrigas e ganância da obra de Shakespeare, além de Clooney e de restante elenco de luxo, gira, como num autêntico jogo de elipses, em tentativas perversas de agregar a esfera do poder pela intriga, a especulação e a manipulação políticas.
Deslizando sobre o escorregadio terreno do “deve e haver” político, o melhor feito de Clooney é conseguir imprimir ao filme e, por consequência ao espetador, um efeito simultaneamente emocionante, dramático, pungente e repugnante, mantendo um discurso narrativo perfeitamente sóbrio e, ainda, o necessário suspense sobre o desfecho da história. A história, essa, é sobretudo a de um assessor do candidato a governador que aprenderá às suas próprias custas o significado, mais que da corrupção, do efeito corrosivo do poder.
Margarida Ataíde
