Cinema: Elena

Em Moscovo, Elena e Vladimir são um casal em segunda união aparentemente sólida. Elena, de origens simples, esposa dócil e dedicada, gere o seu dia a dia entre as tarefas domésticas, a atenção ao marido e ao seu filho. Vladimir é um homem que goza confortavelmente dos rendimentos pós-reforma. Vivendo um dia a dia sem grande diálogo nem sobressalto, um ponto no entanto os separa: a visão sobre os respetivos filhos.

Vladimir não tolera a indolência do filho de Elena, desempregado na casa dos 40, pai de dois filhos que vive às custas da mãe. Elena, por seu turno, não compreende a fria relação entre Vladimir e a filha, uma rapariga habituada de pequena a fazer valer os seus caprichos.

O clima adensa-se quando o futuro do neto mais velho de Elena depende duma quantia de dinheiro que só Vladimir pode facultar. Vladimir não está disposto a anuir mas, antes que decida, sofre um enfarte. O acidente precipita a redação do seu testamento, em que Elena não se acha beneficiada…

Andrey Zvyagintsev encetou carreira nas artes como ator, em 1990. Treze anos mais tarde, o seu primeiro trabalho como realizador em longa metragem é premiado com o Leão de Ouro de Veneza. Tratava-se de “Vozvrashcheniye”, “O Regresso”, história de reencontro entre um pai ausente e os dois filhos que reagem de forma profundamente diferente ao (re)conhecimento desse pai estranho, imaginado, desejado e odiado.

Em “Elena”, obra dramática bem filmada e melhor interpretada pela atriz Nadezhda Markina, a possibilidade, ou não, de (re)construção do amor está de novo em causa. Desta feita numa teia em que se implicam relações não só filiais mas conjugais, a morte, a vida e a sobreviência, tendo sempre subjacente a questão da diferença de classes, dos papéis sociais masculino e feminino e a forma como o tempo, também geracional, os contextualiza.

O que começa como um retrato trivial da vida dum casal de meia-idade, torna-se progressivamente mais denso, mergulhando o espetador no crescente dilema de Elena, sem no entanto o abandonar a um olhar parcial em que pudessem ser plenamente admitidas as escolhas e motivações, em situação limite, que a personagem principal assume.

Margarida Ataíde

 

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Agência ECCLESIA

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