Cinema: Desligados

Um advogado em permanente pressão vive ligado ao telemóvel sem disponibilidade para a família. Um casal é arrastado para uma situação de risco quando os seus segredos são expostos online. Um ex-agente da polícia viúvo tem dificuldade em lidar com o filho que persegue dissimuladamente um colega via internet. Uma jornalista ambiciosa vê-se em maus lençóis ao investigar e dar cobertura à participação de um adolescente num sítio para adultos.

Esta é uma história feita de histórias, de personagens que se cruzam no bairro onde moram, na escola que frequentam e nas ruas por onde passam. Em que, todavia, o que as une é uma ligação puramente virtual. Um drama que retrata os tempos que vivemos, como nos construímos, ficcionamos ou destruímos pela forma como gerimos o espaço social e relacional real ou cibernáutico.

Não se tratando da visão apocalíptica de um mundo condenado à desumanização pela internet e redes sociais, pese embora a ausência de benefícios da proximidade virtual entre os casos escolhidos, ‘Desligados’ coloca-nos perante questões atuais incontornáveis, do nosso dia-a-dia, convidando a uma reflexão bem pertinente e profunda de natureza ética, psicológica, sociológica, sobre os riscos da subjugação do humano ao tecnológico, a entrega ao virtual em desprimor do interpessoal: a tentação do alheamento do que é física e afetivamente mais próximo em favor de uma intimidade fictícia; a dualidade identitária provocada pela confusão entre o que se é, se expõe e conhece ‘on’ e ‘off’ line de tal forma que real e fictício se emaranham, perdendo-se ‘quem se é’; a fuga ilusória de uma solidão para outra; o descontrolo do domínio privado resvalado para o público e sempre, de alguma forma, controlado e explorado por um ‘alguém’ com intuito não propriamente beneficiente, demasiado vasto e incógnito.

Um filme construído a partir de um argumento sólido, cuja intensidade dramática se torna progressivamente mais densa, ao ritmo da evolução dos acontecimentos e ao entrecruzamento das várias histórias, onde as personagens se implicam.

Um regresso à longa metragem, após sete anos de ausência, do realizador  norte americano  Henry Alex Rubin que, em 2005, se destacou pelo seu documentário ‘Murderball – Espírito de Combate’, uma história inspiradora de superação protagonizada por uma equipa de jogadores de rugby paraplégicos. O filme arrecadou um bom lote de nomeações e prémios por entidades e em festivais bem cotados, incluindo Oscars, Sundance, British Film Institute e Gotham.

Margarida Ataíde 

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