Cinema: Amor

Três anos após conquistar uma vasta gama de prémios pelo seu “O Laço Branco”, profunda e perturbante meditação sobre  a condição humana, Michael Haneke voltou a arrebatar a mente e o coração de júris, crítica e público com o seu mais recente filme: Amor.

Georges e Anne Laurent, casal octogenário, vivem confortavelmente a sua reforma na cidade de Paris, na sequência de uma vida dedicada à música. O carinho que nutrem um pelo outro é notório. Um dia, são surpreendidos pela doença de Anne. Um grave problema de natureza vascular, evidenciado por um súbito estado de ausência, limitará, num brevíssimo espaço de tempo, a sua mobilidade. Primeiro confinada a uma cadeira de rodas e mais tarde a uma cama, o estado de Anne agrava-se de dia para dia.

Ao longo deste processo, Georges não hesita em assumir, com recurso mínimo à ajuda de terceiros, os cuidados necessários a Anne, sejam de ordem física ou afetiva. Indiferente à sua própria debilidade física e relegando para segundo plano a dor provocada pela degradação humana da mulher da sua vida, é o amor que prevalece, a cada dia, ante a perspetiva de uma morte anunciada…

Com a questão da doença e da morte em solidão a afligir uma envelhecida Europa em tempos de crise e de dúvida, entre tantos outros problemas que apelam à reflexão e à ‘inflexão’ urgente de modelo social e afetivo, “Amor” é uma muito pertinente meditação sobre nós. Todos nós.

Magnificamente interpretado por Jean-Louis Trintignant e Emmanuelle Riva, os dois atores que em tempos atraíram uma geração às salas de cinema pela sua sedutora vitalidade física e emocional, emprestam os mesmíssimos dons artísticos à encarnação de duas personagens no final das suas vidas. 

Incómodo e imensamente belo, eis um filme que trata, de modo igualmente notável e delicado, a questão do amor e da morte, em intimíssima relação e definindo claramente o que na nossa natureza prevalece. 

Mais uma meditação que Haneke séria e generosamente nos entrega, em que as soluções dificilmente podem ser consideradas ou debatidas sem se olhar aos caminhos que a umas ou outras conduzam…

Margarida Ataíde

 

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