Cinema: A Morte de Carlos Gardel

Passaram sete anos desde que o escritor António Lobo Antunes redigiu e publicou “A Morte de Carlos Gardel”. Um romance contado a várias vozes,  apenas conectadas pela relação que sabemos que as une, mas raramente entretecidas, de forma evidente, pelo autor. 

O filme surge no rasto de um caminho percorrido por duas obras anteriores: O “Tratado das Paixões da Alma” e “A Ordem Natural das Coisas “. A teia dominante em qualquer dos três é a família e o seu intricado sistema de relações, com a casa, na cidade, por contexto.

É nessa teia que se tece a história trágica de Nuno, um rapaz toxicodependente agora às portas da morte, resultado temível de uma overdose. Internado, é visitado por diversos familiares que vivem a iminência vertiginosa da sua morte, enquanto desfiam recordações, como linhas que ligam as suas à vida do rapaz. Neste desfiar, cabem no entanto alegrias e tristezas, confirmações e arrependimentos, culpa e conforto.

É neste tempo que Álvaro, pai de Nuno, descobre na sua paixão pelo tango de Carlos Gardel um escape possível. Uma forma de sublimar o seu insuportável sofrimento.

Com três décadas de carreira e dezoito filmes dirigidos, a realizadora (e encenadora) sueca Solveig Nordlund volta a mergulhar no universo de António Lobo Antunes, depois de “Escrever, Escrever, Viver”, em 2009. Nesse documentário sobre a vida do escritor descobrimos já algumas alusões ao tango e acedemos a outros tantos excertos de “A Morte de Carlos Gardel”.

Agora, porém, o tango surge incrustado como uma pedra, preciosa, no drama de Nuno e no imenso manancial de evocações que o seu estado espoleta à sua volta.

Um drama que de forma metafórica nos fala da morte dos homens e dos mitos e que de forma destemida enfrenta a solidão, a decadência, a disfunção no seio de uma família que há muito perdeu identidade.

Margarida Ataíde

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