CIBERCULTURA – Descobrir a Rede de Deus

Miguel Oliveira Panão (Professor Universitário), Blog & Autor

No final de Julho, o Papa Leão XIV reuniu-se com os influencers (pessoas que possuem a capacidade de influenciar os outros através dos conteúdos digitais que publicam nas redes sociais) e missionários digitais (pessoas que procuram levar a mensagem cristã intervindo na internet através das redes sociais), fazendo um convite muito claro. — «Sede vós, então, agentes de comunhão (…)»— Isso significa serem «capazes de quebrar a lógica da divisão e da polarização; do individualismo e do egocentrismo. Ponde a Cristo no centro, para vencer a lógica do mundo, das fake news e da frivolidade, com a beleza e a luz da Verdade (cf. Jo 8, 31-32).»— uma verdade ameaçada com o excesso de informação em que vivemos.

Discurso na íntegra.

Gerar conteúdos para alimentar quem os “segue” não é fácil porque exige a estes influenciadores uma capacidade grande de actualização e de estar diante de um ecrã que os filma. Expõem-se e tornam-se vulneráveis ao olhar dos outros. Sabemos que nem sempre é a verdade que capta mais a atenção das pessoas, pelo que oferecer a verdade de um modo de capte a atenção pelo tempo suficiente para influenciar o outro em relação ao que pensa e ao modo como pensa, é quase uma arte. Porém, para o influencer católico, diz Leão XIV — «Não se trata apenas de gerar conteúdos, mas de criar um espaço de encontro de corações.» — Corações que correm o risco de viver isolados quando colados ao seu ecrã e que o influenciador cristão pode ajudar, suscitando o desejo que ir ao encontro de outros corações, ou de tomar maior consciência de que cada pessoa que se cruza connosco possui um coração, isto é, uma totalidade que não se reduz ao que faz, sente e pensa, mas engloba um entrelaçamento de corpo, mente e espírito.

Vivemos em rede, e sobre isso, o Papa Leão faz uma interessante e interpelante reflexão.

« (…) faço este apelo a todos vós: “Ide consertar as redes”. Jesus chamou os seus primeiros apóstolos quando eles estavam a consertar as suas redes de pescadores (cf. Mt 4, 21-22). Ele pede-nos também a nós, aliás pede-nos hoje, que construamos outras redes: redes de relações, redes de amor, redes de intercâmbio gratuito, nas quais a amizade seja autêntica e seja profunda. Redes onde se possa consertar o que está partido, onde se possa curar a solidão, sem se importar com o número de seguidores [os followers], mas experimentando em cada encontro a grandeza infinita do Amor. Redes que dêem espaço ao outro mais do que a nós mesmos, onde nenhuma “bolha de filtros” possa apagar a voz dos mais fracos. Redes que libertem, redes que salvem. Redes que nos façam redescobrir a beleza de nos olharmos uns dos outros, olhos nos olhos. Redes de verdade. Assim, cada história de bem compartilhada será o nó de uma única e imensa rede: a rede das redes, a rede de Deus.»

A rede tem sido um modo de captar um dos bens mais preciosos que cada pessoa tem: a sua atenção. Ao vivermos em rede, corremos o risco que perder o contacto connosco próprios e nos perdermos no aparente contacto que estabelecemos com os outros quando, na realidade, contactamos com o conteúdo que produziram para nós. Por essa razão, ser um influenciador cristão que constrói “redes de verdade” para orientar o coração do outro até à rede de Deus, onde todos os “nós” de encontram no Seu coração, é uma missão mais exigente do que poderíamos pensar.

Não vivamos da ilusão que seremos pouco imperfeitos na capacidade de sermos agentes de comunhão, e que conseguiremos consertar de imediato as redes de verdade tão ameaçadas pela desinformação. Só se desilude quem se ilude. A verdade é que seremos influenciadores na rede da verdade na medida em que o nosso coração estiver próximo da Verdade que é Deus em nós e entre nós.

As redes possuem “nós” que congregam os vários fios. Quando mais fios um só “nó” juntar, maior precisa esse “nó” de se tornar. No fundo, deixa de ser “nó” para se tornar num emaranhado de fios sem identidade. Se o influenciador for um “nó”, o grau de influência na construção de uma rede de verdade pode não depender tanto do número de seguidores que tem, quanto da capacidade de tornar os seus (mesmo se poucos) seguidores em influenciadores da rede, isto é outros “nós”. “Nós” que não pretendem gerar dependência, mas uma comunhão plena que faz da unidade entre “nós” a rede de Deus.


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(Os artigos de opinião publicados na secção ‘Opinião’ e ‘Rubricas’ do portal da Agência Ecclesia são da responsabilidade de quem os assina e vinculam apenas os seus autores.)

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