Choque de civilizações – Uma ameaça da guerra ao Iraque É uma das vozes da guerra que mais frequentemente tem sido citada pelas agências noticiosas: D. Fernando Filoni, Núncio Apostólico em Bagdad, sempre deixou claro que não abandonaria o país. Uma semana depois do começo da guerra falou à agência ECCLESIA, avisando, desde o início, que a sua missão é falar sobre “a vida da Igreja”. O tempo é de guerra, as suas palavras são de paz. Agência ECCLESIA – Como se encontra a comunidade eclesial no Iraque nesta altura de sofrimento? D. Fernando Filoni – Até agora, todos os Bispos continuam cá, as igrejas permanecem abertas, todos os dias há celebrações eucarísticas, os seminários e as paróquias estão preparadas para qualquer eventualidade. No passado Domingo (23 de Março) as celebrações foram bastante participadas, quase tanto como nos Domingos antes da guerra – diria mesmo que estiveram 2/3 das pessoas que habitualmente participam. Em Bagdad continuam a trabalhar as congregações religiosas e temos a intenção de ficar junto dos que sofrem, para que saibam que não foram abandonados. AE – Os iraquianos, sobretudo os que não são católicos, percebem que a Igreja é uma instituição de paz? FF – A nossa Igreja vive e convive com as pessoas os mesmos problemas e dificuldades, nesta guerra. Agora, é difícil responder exactamente se os muçulmanos percebem ou não, porque não estamos a fazer sondagens nesta altura. Estou certo, porém, que há muitíssima gente que compreendeu que a Igreja Católica não apoia esta guerra e que os cristãos de todo o mundo não têm a mínima intenção de alimentar uma situação catastrófica como a que se vive aqui. AE – Há no Ocidente o receio de que este conflito se torne um “choque de civilizações/religiões”. A sua experiência no Iraque permite-lhe perceber se isso vai acontecer? FF – A esse respeito eu não posso dizer muito, por causa da situação em que nos encontramos e por que é difícil adivinhar como vai evoluir a situação. A questão é extremamente delicada, pelo que esperamos que as relações entre o Islão e o Cristianismo permaneçam nos termos em que, até hoje, o Papa tem defendido. Muitos têm compreendido esse esforço de diálogo e de construção comum da paz, tendo da Igreja e dos cristãos a imagem de que não estão envolvidos, enquanto tal, nesta guerra. AE – Considera, então, que o esforço da Igreja, sobretudo pela figura de João Paulo II, na promoção de soluções pacíficas é algo que pode ser decisivo para o futuro? FF – Certamente, certamente! Ficou demonstrado, a todos os níveis, que a nossa posição não é a de apoiar a guerra, qualquer que seja. O caminho que defendemos para a resolução dos conflitos passa pela confiança mútua e pelo diálogo. Isso é o mais importante.