Ir. Mafalda Moniz admite surpresa e pede outro olhar sobre os bairros problemáticos Foi com atrapalhação e surpresa que a Irmã Mafalda Moniz, das Missionárias Dominicanas do Rosário, recebeu a noticia que seria uma das personalidades condecoradas pelo Presidente da República, Cavaco Silva, no Dia de Portugal, assinalado a 10 de Junho, com a Ordem de Mérito. Nas comemorações nacionais, a decorrer em Viana do Castelo, a religiosa será distinguida como grande oficial da Ordem do Mérito, pela sua obra no Bairro Social 6 de Maio, na Amadora, nos subúrbios da capital portuguesa. A Ordem de Mérito tem por finalidade galardoar actos ou serviços meritórios praticados no exercício de quaisquer funções, públicas ou privadas, ou que revelem desinteresse e abnegação em favor da colectividade. A Irmã Mafalda Moniz afirma não se sentir merecedora de tal condecoração, pois “não faço nada de extraordinário”, quando comparado “com o que tantas pessoas fazem a favor dos outros”. Esta é a sua missão enquanto missionária dominicana, por isso “não estou à espera de recompensa”. Uma condecoração para o 6 de Maio O que considera ter chamado a atenção foi o trabalho desenvolvido pelas religiosas no Bairro 6 de Maio, na Amadora. “A condecoração não é minha, mas de quem, todos os dias se envolve neste trabalho”. Um trabalho de acolhimento, de ajuda à população imigrante, de apoio aos jovens, às crianças e às famílias carenciadas “numa altura muito complicada para a população em geral, mas mais ainda para quem não tem nada”. A missão do centro social é “trabalhar para uma plena cidadania”, explica a religiosa. Há muito que a Irmã Mafalda Moniz conhece as ruas do 6 de Maio. Entre 1987 e 1990 a religiosa esteve no bairro a “descobrir qual a minha vocação”. Esteve depois três anos em Moçambique, “durante um tempo fui estando lá e cá”, até que desde 1996, “estabilizei na Congregação que vive no Bairro”. No 6 de Maio já fez um pouco de tudo. Mas o trabalho com jovens e adolescentes “sempre mexeu muito comigo”. A integração dos jovens, a prevenção da delinquência, “no fundo, a construção de um projecto de vida”, a somar à parte pastoral são tarefas que, sem privilegiar, elege. Formada em política social, a Ir. Mafalda Moniz passou, em 2000, a trabalhar no Centro como técnica de Serviço Social. Desde 2003 assume funções de directora técnica. Mas, “numa casa pequena, faço um pouco de tudo”, acrescenta entusiasmada. Como a própria afirma “não consigo estar no gabinete” e ser responsável por todas as áreas, apesar de contar com uma equipa, leva-a ao encontro das pessoas. “Viver no bairro ajuda muito. Escutar as pessoas, mesmo que por vezes faltem as respostas”, sublinha ser uma missão. O projecto do livro «Do outro lado da linha», datado de 2003, deu origem às bolsas de estudo para que jovens, sem recursos financeiros, pudessem estudar na universidade. O projecto de acção comunitária “é o bolo do trabalho da instituição” – serviço social, acompanhamento às famílias, gabinete jurídico no apoio aos imigrantes, são apenas alguns exemplos deste “bolo”. A comunidade tem também o projecto de alfabetização, que é desenvolvido com a ajuda de professores destacados pelo Ministério da Educação e de outros voluntários para dar aulas “e tempo à comunidade”. Muitos jovens que foram crescendo com a comunidade, são também voluntários e colaboradores. “Alguns que foram realojados noutros locais, voltam ao bairro para ajudar”, enfatiza a religiosa. A Irmã Mafalda explica que os jovens “se sentem aqui acolhidos e em casa”. A religiosa conhece-os pelo nome, com as suas características pessoais. O estímulo é resultado do contacto pessoal. “É certo que os jovens podem estar alheados, mas que fazemos nós para combater isso”, questiona quando confrontada com as declarações de Cavaco Silva sobre o afastamento dos jovens da política. A família “não tem tempo para estar com eles”, aponta a religiosa que explica que são “substitutas da família”. Os jovens a quem “conseguimos chegar” fazem um processo de desenvolvimento pessoal. A Irmã Mafalda lamenta não conseguirem chegar a todos. “Esta é a frustração, pois nem todos aderem à proposta”. Um outro olhar Conotado com delinquência e distúrbios, a Irmã Mafalda Moniz acredita que a condecoração pode ser uma oportunidade para as pessoas perceberem o que de bom acontece no Bairro 6 de Maio. “Esta é uma publicidade positiva”, brinca. A condecoração “é importante para a comunidade”, explica, mesmo para aqueles que não usufruem directamente das valências da instituição. “Mas poderá ser uma forma de eles verem o que pode acontecer de bom, com eles também”. O Bairro vai sendo conhecido por razões “positivas e isso pode ajudar a mudar mentalidades”, aponta a religiosa que explica que alguns moradores não arranjam trabalho porque moram no 6 de Maio. O reconhecimento do trabalho desenvolvido pelo Centro Social “dá credibilidade”. No meio de dificuldades e de parcerias com outras instituições “quem sabe se não poderão surgir mais ajudas”, avança esperançada. No passado mês de Maio, durante a entrega dos prémios “Mulher Activa 2007”, a Primeira-dama, Maria Cavaco Silva, destacara que “a Irmã Mafalda dá-se toda ao Bairro 6 de Maio. E gostava que lhe vissem o sorriso quando tem uma boa notícia, como um cheque que lhe entreguei para levar os seus meninos de férias à beira-mar”.