Cavaco Silva: crise como ponto de viragem

Presidente da República, Cardeal Patriarca de Lisboa e Presidente da Comissão Europeia juntos na IV Congresso da ACEGE O Presidente da República defendeu o aproveitamento do momento de crise como “um ponto de viragem”, considerando que seria politicamente perigoso e eticamente reprovável repercutir os custos da situação económica sobre os mais desfavorecidos. “É preciso ter coragem de, em vários domínios, começar de novo”, defendeu o Chefe de Estado, Aníbal Cavaco Silva, numa intervenção na abertura do IV Congresso da Associação Cristã de Empresários e Gestores, na Universidade Católica Portuguesa, esta Sexta-feira, em Lisboa. Recordando que “a ausência de valores nos mercados, na política e nas instituições financeiras terá sido uma das razões de fundo explicativas” da crise, Cavaco Silva considerou, por isso, que “a repartição dos custos da actual situação económica deve colocar em primeiro plano a dimensão ética”. “Só assim estaremos a responsabilizar o passado e a salvaguardar o futuro”, sublinhou, insistindo que os valores de justiça, de equidade, de responsabilidade social e de coesão “devem estar bem presentes nas soluções de natureza financeira ou económica que venham a ser adoptadas”. “Seria um erro muito grave, verdadeiramente intolerável, que, na ânsia de obter estatísticas económicas mais favoráveis e ocultar a realidade, se optasse por estratégias de combate à crise que ajudassem a perpetuar os desequilíbrios sociais já existentes ou que hipotecassem as possibilidades de desenvolvimento futuro e os direitos das gerações mais jovens”, salientou, reconhecendo que existe esse “risco efectivo”. Cavaco Silva defendeu que muitos dos agentes que tiveram um papel activo na crise financeira continuam a ser capazes de “condicionar as políticas públicas, quer pela sua dimensão económica quer pela sua proximidade ao poder político”. Pediu por isso, ponderação nas decisões, para não abrir espaço ao desperdício de recursos públicos e impedir a concentração desses mesmos recursos nas mãos daqueles que já detêm maior influência junto dos decisores. O Presidente da República recusou, contudo, que a obrigação de acautelar os princípios de justiça, equidade e coesão social recai apenas sobre os decisores políticos. “É nas empresas e no diálogo entre elas e dentro delas que começa esta responsabilidade”, afirmou, perante uma plateia de gestores e empresários. A desigualdade de rendimento e direitos e os “ganhos despropositados” auferidos por altos dirigentes de empresas mereceu igualmente uma nota especial de Cavaco Silva, que classificou esta situação como “insustentável”, considerando urgente modificá-la. “Seria política e socialmente perigoso e eticamente condenável que a crise fosse aproveitada para acentuar esta fragilidade, repercutindo os custos da actual situação económica sobre os mais desprotegidos”, frisou. “É urgente colocar no topo da agenda, ao lado da liberdade, a responsabilidade, a solidariedade e a coesão sociais, e compreender a importância que a verdade, a transparência e os princípios éticos têm no bom funcionamento de uma economia e no desenvolvimento de uma sociedade”, sublinhou. Já o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, considerou “imperioso” o restabelecimento do primado dos valores, defendendo que sem comportamento de “rigor e responsabilidade ética” irá continuar-se a enfrentar problemas sérios. Também presente na abertura do IV Congresso da ACEGE, Durão Barroso considerou ser essencial “estabelecer as regras mais eficazes acompanhadas por comportamentos individuais e colectivos de rigor e de responsabilidade ética”, caso contrário “continuaremos a enfrentar problemas sérios”. Considerando que “muita coisa falhou” e que alguns valores não foram respeitados, o presidente da Comissão Europeia classificou como “imperioso” o restabelecer do primado desses valores. “Não obstante a necessidade de criar novos mecanismos de regulação financeira, é importante reter que as regras não são suficientes”, disse, defendendo que “às instituições e às regras tem de se associar uma ética de responsabilidade”. Porque, acrescentou, “quanto maior a liberdade, mais exigente deve ser a responsabilidade”. “A ética da responsabilidade constitui um imperativo moral das sociedades e das economias livres”, enfatizou. O presidente da Comissão Europeia alertou ainda para a responsabilidade de ter em conta as gerações futuras, pois seria “inadmissível” que a adopção de políticas e de medidas para resolver os problemas de hoje “comprometessem a prosperidade de amanhã”. “É necessário fazer um esforço para que a actuação a curto prazo seja compatível com a sustentabilidade do sistema económico e social a médio e longo prazo”, preconizou. Na sua intervenção, o Cardeal Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, pediu aos empresários que inovem, mas que o façam com generosidade. “O lucro é legítimo, mas desde que seja orientado para o bem comum. Há uma dimensão social do lucro das empresas, do lucro das pessoas. Quando essa dimensão social se perde de vista, pode-se cair em egoísmos individuais que não são compatíveis com a harmonia de uma sociedade humanizada e cada vez mais humana”, disse D. José Policarpo. Redacção/Lusa/RR Foto: Lusa

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