Católicos têm muito a aprender com a prática judaica

O mundo judaico tem muito a ensinar-nos, sobretudo pela sua prática, defendeu anteontem à noite, em Viana do Castelo, o biblista António Couto durante uma palestra onde abordou “As Sagradas Escrituras judaicas”, integrada na Semana de Estudos Teológicos. O tema desta iniciativa é: “As Religiões do Livro – textos e contextos”. Este especialista de reconhecidas simpatias pela cultura judaica começou, pedagogicamente, por apresentar os principais componentes da “Miqra”, que é o texto basilar do judaísmo rabínico, ou seja, «a Bíblia hebraica», cujo cânone corresponde a grande parte do Antigo Testamento da Bíblia católica. As três partes principais – Torah (vulgarmente traduzida por Lei, mas melhor será por «instrução»), Nebiim (Profetas) e Ktubim (Escritos) – apresentam uma curiosa articulação que diz da dinâmica da relação dos judeus com Deus. A Torah é expressão do Deus que «fala» ao homem, ensinando-o. Este Deus que «fala» continua nos Profetas, mas com uma nota de interpelação. Nos Escritos (Ktubim) temos o Homem que, ensinado e interpelado por Deus, responde a esse mesmo Deus. António Couto alertou para a «diferente articulação do cânone católico, que coloca primeiro os Livros Históricos, depois os Escritos e, fi nalmente, os Profetas, pela razão «simples» que estes antecipam a vinda de Cristo e o Novo Testamento. No contexto judaico das três partes da sua Bíblia (Miqra), a Torah (instrução) ganhou uma singularidade ímpar recaindo sobre ela «quase toda a atenção». Por isso, para que se possa «viver da Torah», há que a traduzir e dar-lhe sentido fazendo-o passar para as pessoas, a fim de que nenhuma zona da sua vida fique a descoberto desta presença de Deus. Os mestres sábios compilaram, numa construção de séculos, a Mishna e o Talmude, este com mais de «cinco milhões de palavras ditas de cor e aprendidas de cor», daí que o conferencista tenha falado de uma «mecânica de ensino pela repetição» e sustente que o Judaísmo é «uma máquina de ensino, não só nas escolas dos mestres, mas também em casa». A título de exemplo citou toda a liturgia de preparação da Ceia Pascal que é organizada em torno das crianças «introduzindo-as [pedagogicamente] nos acontecimentos fundamentais» da história da salvação. Estes mestres, cuja grande lição é dada pela sua vivência da Torah – sublinhou o conferencista –, utilizam muito as “estórias”, que é uma «forma ágil de ensinar coisas sérias a brincar».

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