Assembleia recusou iniciativa popular que pedia referendo sobre esta matéria
A Assembleia da República aprovou esta Sexta-feira a proposta de Lei do Governo que legaliza o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, contando com os votos favoráveis do PS, do PCP e do Bloco de Esquerda.
Na apresentação da proposta do Governo, José Sócrates defendeu que a possibilidade do casamento homossexual “repara, de facto, uma injustiça”, reconhece “direitos a cidadãos a quem eram negados” e “abre novas oportunidades de realização pessoal”.
As deputadas do Movimento Humanismo e Democracia (independentes eleitas nas listas do PS), Maria do Rosário Carneiro e Teresa Venda, foram as únicas na bancada socialista que votaram contra a proposta do Governo. Sete deputados do PSD abstiveram-se.
A adopção fica de fora desta alteração legislativa. “Não se está aqui, de forma alguma, perante uma discriminação no acesso a um direito, visto que não pode sequer falar-se, nem existe, em sentido próprio, um verdadeiro «direito a adoptar» e muito menos como um «direito dos cônjuges» ou «inerente» ao casamento civil”, refere o preâmbulo da proposta hoje aprovada.
Considerando que “não é tempo para adiar”, o primeiro-ministro disse respeitar a iniciativa para um referendo, que recolheu mais de 90 mil assinaturas, mas defendeu que o mandato popular que o PS recebeu confere legitimidade ao Parlamento para decidir. O referendo foi chumbado pelos partidos de esquerda, à excepção de duas deputadas do PS – Teresa Venda e Maria do Rosário Carneiro -, tendo-se registado três abstenções no PSD.
A Plataforma Cidadania e Casamento entregou na Assembleia da República, no dia 5 de Janeiro, a Petição da Iniciativa Popular de Refendo ao casamento de pessoas do mesmo sexo, que foi assinada por 92.207 cidadãos portugueses. “Não faz sentido que a Assembleia da República através da Constituição e da lei convide a sociedade a manifestar-se e lhe bata com a porta quando esta o faz”, refere comunicado da Plataforma enviado à Agência ECCLESIA.
Vários membros da hierarquia católica pronunciaram-se sobre esta temática nas últimas semanas. D. Ilídio Leandro, Bispo de Viseu, disse ser necessário “designar e tratar, com respeito e verdade, tal relação para que todas as pessoas homossexuais sejam protegidas e defendidas nos seus direitos humanos”, lamentando que o governo legisle “contra instituições que são naturais e fundamentais sustentáculos” da sociedade.
Sobre o casamento das pessoas com o mesmo sexo, a opinião do Cardeal-Patriarca de Lisboa foi expressa em entrevista à ECCLESIA: “O problema que está em questão não é a homossexualidade. Se a discutirmos, o discurso tem outros parâmetros. Neste momento está em causa a natureza do casamento. Que não é uma questão religiosa, antes cultural”.
“As culturas milenares consideram o casamento um contrato entre um homem e uma mulher, que dá lugar a uma instituição, a família. Mudar esta compreensão milenar do que é a família na humanidade pode ter consequências gravíssimas no futuro”, alerta D. José Policarpo.
D. Manuel Clemente, Bispo do Porto, também se referiu ao tema numa entrevista à ECCLESIA, lembrando que “o casamento civil tem sido como sempre a humanidade o apurou: baseado na alteridade homem/mulher, que está na base da construção da sociedade”.
“Digo isto como cidadão: há aqui um valor estruturante da sociedade, institucional, à volta de algo que a sociedade reconheceu de muito importante e, por isso, precisava de ser salvaguardado e promovido”, indica.
«Não»
Já no início de 2009, o Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) afirmara a sua oposição a qualquer lei que “equipare as uniões homossexuais ao casamento das famílias constituídas na base do amor entre um homem e uma mulher”.
Numa Nota Pastoral intitulada “Em favor do verdadeiro casamento”, a CEP lamentara o que considera ser uma “tentativa de desestruturar a sociedade portuguesa”.
O documento rejeita que “a união entre pessoas do mesmo sexo possa ser equiparada à família estavelmente constituída através do casamento entre um homem e uma mulher”. O mesmo é afirmado em relação “a uma lei que permita a adopção de crianças por homossexuais”. “Tal constituiria uma alteração grave das bases antropológicas da família e com ela de toda a sociedade, colocando em causa o seu equilíbrio”, afirmam os Bispos.
“A família, fundada no casamento entre um homem e uma mulher, tem o direito a ver reconhecida a sua identidade única, inconfundível e incomparável, sem misturas nem confusões com outras formas de convivência”, pode ler-se.
A Nota reafirma que estas posições são aceites pelas diferentes culturas e civilizações, pela revelação judaico-cristã “e assim o reconhece implicitamente a nossa Constituição da República e explicitamente o Código Civil Português”.
Em conclusão, os Bispos defendem “a necessidade de iniciativas que ajudem as famílias estavelmente constituídas a superar os problemas económicos que muitas atravessam, que as valorizem como lugar primordial de educação dos filhos e que favoreçam a sua importância na vida social”.