Igreja lamenta «engenharia ideológica» que altera estrutura central na sociedade
O governo português aprovou esta Quinta-feira, em Conselho de Ministros, a proposta de Lei que legaliza o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. A proposta será entregue até final de Dezembro na Assembleia da República.
O diploma vai ser discutido no Parlamento, em Janeiro de 2010. A aprovação pela Assembleia da República deverá estar garantida, contando com os votos favoráveis do PS, do PCP e do Bloco de Esquerda.
Pedro Silva Pereira, Ministro da Presidência, disse em conferência de imprensa que a intenção é acabar com uma “discriminação social”, eliminando as barreiras jurídicas que impedem o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, e falou num “grande avanço na sociedade portuguesa”. Considerou ainda que o tema foi já “largamente discutido” e que o governo tem “legitimidade democrática” para legislar sobre a mesma, excluindo a hipótese de um referendo ou de qualquer “perturbação social”.
A adopção fica de fora desta alteração legislativa, considerando o executivo que não tem mandato político para avançar com esta medida, por não constar do seu programa de governo. Silva Pereira precisou que adopção não consiste em “satisfazer um direito dos adoptantes”, mas “da realização do interessa das crianças”.
Para o porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), Pe. Manuel Morujão, estamos na presença de uma “certa engenharia ideológica” para reinventar “uma estrutura milenária que deve ser melhorada e actualizada, mas mantida na sua identidade estrutural”.
Recentemente, o presidente da CEP, D. Jorge Ortiga, condenava o que classificou como uma “verdadeira campanha ideológica” que pretende a legalização das uniões homossexuais e já levou à “banalização” do aborto.
No final da última reunião magna dos Bispos, o Arcebispo de Braga afirmara que “não basta ter um número no programa eleitoral, não basta que em campanha se tenha abordado a questão uma vez ou outra, parece-nos que é fundamental reflectir e que os nossos órgãos saibam legislar, tendo presente aquilo que o povo pensa ou o povo quer”, disse.
O Pe. Manuel Morujão refere que “um tema tão estruturante para a sociedade como o casamento e a família daí resultante” deveria ter sido alvo de uma discussão aprofundada, “para ver quais são as consequências para a estrutura fundamental da sociedade, que é a família”.
Em declarações à Agência ECCLESIA, este responsável considera que a decisão do governo terá “graves consequências”, porque “a família fica afectada quando se tomam decisões que alteram a sua estrutura básica”, promovendo “um tipo de casamento que não é autêntico e genuíno”.
O porta-voz da CEP assegura que a Igreja manterá, neste assunto, a postura que tem assumido ao longo dos últimos meses. “Em assunto tão importante, devemos saber estar livres de partidarismos – mesmo até para além de opções religiosas, indiferentes ou ateias – porque aqui está em causa a estrutura da própria sociedade, pelo que deveríamos ultrapassar querelas partidárias”, completa.
Admitindo que “todas as pessoas devem ser tratadas com respeito”, o Pe. Morujão observa que o casamento entre pessoas do mesmo sexo diz respeito a “uma minoria”.
Questionado sobre a forma como o processo foi conduzido, o secretário da CEP escusou-se a fazer “juízo de intenções”, mas lembrou que havia outros “problemas e desafios na sociedade actual que mereceriam, eles sim, uma atenção prioritária, “como o desemprego, a precariedade do trabalho, o endividamento, a situação económica em que as pessoas vivem”.
O comunicado final da última Assembleia Plenária da CEP assumia a “pública rejeição” dos Bispos face aos “projectos para legalizar as uniões entre pessoas homossexuais concedendo-lhe o estatuto de casamento”, recusando que “este tipo de uniões possa ser equiparado à família estavelmente formada através do casamento entre um homem e uma mulher”.
“Tal constituiria uma alteração grave das bases antropológicas da família e com ela da própria sociedade. Todo o respeito é devido a todas as pessoas, também às pessoas homossexuais, mas este respeito e compreensão não podem reverter na desestruturação da célula base da sociedade, que é a família baseada no verdadeiro casamento”, defende a CEP.
«Não»
Já no início deste ano, o Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) afirmara a sua oposição a qualquer lei que “equipare as uniões homossexuais ao casamento das famílias constituídas na base do amor entre um homem e uma mulher”.
Numa Nota Pastoral intitulada “Em favor do verdadeiro casamento”, a CEP lamentara o que considera ser uma “tentativa de desestruturar a sociedade portuguesa”.
O documento rejeita que “a união entre pessoas do mesmo sexo possa ser equiparada à família estavelmente constituída através do casamento entre um homem e uma mulher”. O mesmo é afirmado em relação “a uma lei que permita a adopção de crianças por homossexuais”. “Tal constituiria uma alteração grave das bases antropológicas da família e com ela de toda a sociedade, colocando em causa o seu equilíbrio”, afirmam os Bispos.
“A família, fundada no casamento entre um homem e uma mulher, tem o direito a ver reconhecida a sua identidade única, inconfundível e incomparável, sem misturas nem confusões com outras formas de convivência”, pode ler-se.
A Nota reafirma que estas posições são aceites pelas diferentes culturas e civilizações, pela revelação judaico-cristã “e assim o reconhece implicitamente a nossa Constituição da República e explicitamente o Código Civil Português”.
Em conclusão, os Bispos defendem “a necessidade de iniciativas que ajudem as famílias estavelmente constituídas a superar os problemas económicos que muitas atravessam, que as valorizem como lugar primordial de educação dos filhos e que favoreçam a sua importância na vida social”.