Cáritas: crise está a gerar novos problemas

Novos problemas decorrentes da crise financeira e económica estão a surgir na sociedade portuguesa. Eugénio Fonseca, presidente da Cáritas Portuguesa, explica à Agência ECCLESIA que o encerramento de empresas familiares, de pequeno comércio e de pequenas e médias empresas, conduz pessoas, sem direito ao subsídio de desemprego porque eram empresários e patrões, a situações preocupantes. O Conselho Geral da Cáritas pediu “uma atenção especial do governo para estas pessoas que, porque foram empreendedoras e não se enquadram no regime de protecção social, não recebem qualquer ajuda do Estado”. “Estão a ser realizadas penhoras na totalidade dos bens disponíveis e alguns bens são recursos de subsistência”, foca Eugénio Fonseca que sublinha não advogar o laxismo fiscal, “mas trata-se de uma questão de sobrevivência. Devia haver a possibilidade de ser suspenso o pagamento da dívida e quando a pessoas organizassem a sua vida, voltar a pagar. Não faz sentido o Estado estar a exigir de um lado e por outro estar a subsidiar as pessoas”. Desagregação familiar, endividamento de cidadãos empreendedores que criaram o seu próprio emprego e caíram em situação de falência, abandono de crianças e idosos das instituições sociais por falta de meios de pagamento são alguns do exemplos que estiveram em análise na reunião do Conselho Geral da Cáritas, este fim-de-semana, que contou com os representantes diocesanos deste serviço da Igreja Católica. Outra situação alarmante é o abandono de crianças e idosos de instituições. “Não se trata de uma exigência das instituições”. O Presidente da Cáritas explica que “as pensões de reforma e os abonos de família são baixos, mas são importantes para a subsistência das famílias”. A Cáritas alerta que esta situação pode provocar a falta de acesso a uma alimentação adequada. “A solidariedade familiar deve ser valorizada, desde que não exista isolamento nem que este afastamento das instituições encubra situações de carência”. Eugénio Fonseca aponta que o acompanhamento destas situações deve ser feito caso a caso. “Os dirigentes e os técnicos das instituições têm de perceber quais as razões, não permitir que os utentes saiam e fiquem em piores condições”. Este problema tem consequência na sustentabilidade das instituições. “Daqui a algum tempo, se este situação não for considerada, teremos encerramento de instituições, desemprego e pessoas sem respostas sociais”. O Conselho Geral da Cáritas alerta ainda para sinais de desagregação familiar consequência da situação de desemprego. “Algumas pessoas não aceitam e entram em situações de violência”, foca o Presidente da Cáritas Portuguesa. “Os homens não aceitam a ociosidade a que estão sujeitos, embriagam-se e geram mecanismos de violência”. Situações de tensão que causam desagregação familiar onde “a mulher é a pessoa mais fraca, vítima de violência doméstica e porque tem os filhos a seu cargo”. Os homens, foca o Presidente da Cáritas, também são vítimas porque entram no “mecanismo do álcool, nos vícios e criam mais um problema associado”. Eugénio Fonseca afirma ser urgente reforçar a prevenção na saúde mental. “Começam a surgir situações depressivas e as pessoas não têm acesso a medicação, porque não têm dinheiro”. As pessoas em estado depressivo, “quando confrontadas com emprego não estão em condições de o aceitar”, prolongando o problema. Lentidão nas respostas O Presidente da Cáritas Portuguesa afirma que foram anunciadas medidas de combate à crise mas que pecam pela lentidão. “As medidas de protecção social têm de ser mais céleres. Há necessidades que precisam de satisfação imediatas e o estudo e a burocracia impedem a resposta pronta”. Sobre a comparticipação estatal de 50% na ajuda ao pagamento da renda quando um dos cônjuges está desempregado, Eugénio Fonseca deixa um alerta. “A medida é adequada mas só será eficaz se as pessoas dentro de pouco tempo voltarem a ter rendimentos de trabalho, caso contrário, deixa-se de dever ao banco, mas fica-se em divida com o Estado”. O Presidente da Cáritas afirma que a lógica dos empréstimos à habitação deveria ser revista. “Trata-se de um problema antigo, que se agudizou perante a crise”. “Uma pessoa que durante de 15 anos pagou regularmente uma dívida, deixou de a pagar por uma situação de desemprego. Será justo que ela perca todo o dinheiro que investiu durante esse tempo? Isto é fonte de grande injustiça, quando depois assistimos ao leilão das casas e a vendas, por vezes, inferiores ao montante da dívida”, foca. Eugénio Fonseca afirma que o arrendamento e as casas devolutas são situações a equacionar, sublinhado a urgência necessária para reformular a política de habitação. Falta estatística real O Conselho Geral da Cáritas deixou um forte apelo aos responsáveis diocesanos para a contabilização das respostas e atendimentos feitos pelas Cáritas. As respostas à pobreza envergonhada “não entra na estatística do INE”, focou Eugénio Fonseca. “Toda a pobreza que tem uma expressão na mobilidade não é facilmente contabilizada”. “Habituámo-nos a fazer estatística a partir de cruzamento de dados e não de forma empírica. Há informação disponível que não está a ser tratada, mesmo a informação oficial”, destaca. O Presidente da Cáritas manifesta uma preocupação com as pessoas que estão próximas de instituições, “onde aparece todo o tipo de pobreza, inclusivamente a encoberta que podia ser objecto de estudo a partir dos dados que dispomos, e que daria uma imagem real do quadro social português”. Missão da Igreja não assumida nas paróquias As Cáritas diocesanas manifestam dificuldades na criação de grupos paroquias. Eugénio Fonseca sublinha que esta dificuldade não se pode generalizar. “Esta missão deve ser encarada como missão da Igreja e não dos párocos. Trata-se do magistério da Igreja”. O Presidente da Cáritas Portuguesa relembra que Bento XVI tem várias vezes focado que a Igreja “tem a missão irrenunciável da prática organizada da caridade. Missão não completa se não for organizada”. “A Cáritas é um serviço da Igreja e em dependência hierárquica do que preside à caridade, que é o Bispo. Os párocos estão nas comunidades em nome do Bispo não em nome próprio. Os párocos, em comunhão com o Bispo, têm de a cumprir”, explica Eugénio Fonseca, que reconhece dificuldades em algumas localidades. No entanto, afirma “é um caminho que estamos a reforçar e esperamos ver resolvido”. Notícias relacionadas • Comunicado Final do Conselho Geral da Cáritas Portuguesa

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