Canto Perene: cantar e valorizar a Liturgia das Horas

Con. Ferreira dos Santos explica o projecto Com o título Canto Perene, o Secretariado Diocesano de Liturgia do Porto publicou já dois volumes deste projecto, que consiste em musicar todos os textos da Liturgia das Horas para poderem ser utilizados em celebrações solenes de Laudes, Vésperas (I e II) de todos os domingos do Ano Litúrgico, nos três ciclos (A, B e C). É autor de todas as melodias (todas elas simples e em voz uníssona) o Cónego António Ferreira dos Santos, Director do Secretariado Diocesano de Liturgia. Tendo sido já publicado o Tempo comum, é agora apresentado, na aproximação do Advento, o volume dos tempos de Advento, Natal, Quaresma e Páscoa. O presente volume vem precedido de uma apresentação de D. António Taipa, na qualidade de Presidente da Comissão Episcopal de Liturgia. Nesse texto salienta o valor dos salmos bíblicos “em que se exprime de maneira sublime a resposta de um povo crente à acção criadora e salvadora do seu Deus”. Sobre a música escreve: “Musicar os salmos é restitui-los à sua verdade”, acrescentando que a música faz parte dos salmos “enquanto expressão do homem crente”. De uma conversa com o autor da música, registamos algumas ideias principais, algumas delas expressas já na Introdução ao volume. Aqui o autor salienta as características próprias da música litúrgica (santidade, bondade das formas, universalidade). Uma catequese centrada na liturgia VP – Como surgiu o projecto deste Canto Perene? AFS – A razão de ser desta obra foi o reconhecimento de que os cânticos evangélicos (antífonas do Benedictus de Laudes e do Magnificat, das vésperas) dos três anos litúrgicos não estavam ainda todos musicados. Há músicas isoladas, mas não havia nada de sistemático. Era uma falta grave. Por outro lado, reconhecia-se que o compor para estas antífonas é muito importante mmesmo por causa da catequese, porque as antífonas destes cânticos se encontram em relação profunda com os evangelhos de cada domingo. Se se utilizar o cântico evangélico como cântico de comunhão, com clareza (e isto é importante sob o ponto de vista pastoral) se vê a relação entre a Eucaristia e a Palavra. Numa pedagogia pastoral esta forma é muito enriquecedora. Uma segunda razão: na catequese corremos o risco de fazer uma catequese insuficientemente centrada nos valores e essenciais. Pôr as crianças a cantar os textos essenciais da liturgia constitui um processo de enriquecimento pastoral, ligando palavra e eucaristia. Já começamos a ver que em muitas comunidades esse costume se implanta. A experiência de realizar em muitas circunstâncias o canto de vésperas, nomeadamente neste ano da eucaristia, tem demonstrado que as pessoas se sentem tocadas pelo sentido profundo dos textos da Igreja. Quando se canta, a melodia expande o sentido e os sentimentos, para fora e para dentro e conduz a uma vivência mais profunda. As vésperas do Corpo de Deus são um momento de forte de vivência espiritual e eucarística. VP – Quais as características do projecto? AFS – Após a realização do volume dedicado aos tempos litúrgicos (Advento, Natal, Quaresma e Páscoa), realizámos já também o dedicado ao tempo comum. O terceiro volume que está a nascer é dedicado às solenidades e festas do Senhor, e pensa-se num quarto volume dedicado ao comum dos santos e Nossa Senhora. Há muitos casos de festas que nas paróquias e nas comunidades religiosas são festas importantes, ficando assim disponibilizados os textos musicados. Uma expressão musical que leve à vivência VP – Sob o ponto de vista formal, como caracteriza esta proposta? AFS – A minha intenção e tentei que as músicas tivessem um carácter o mais possível coral e acessível, sem desprezar as regras da escrita musical, e creio que está conseguido numa grande percentagem. Nunca tudo sai bem, mas procurou-se captar o sentido de cada frase dos textos. Reconheço que algumas músicas podem exigir um pouco mais de esforço, mas depois se entranham mais. O utilizar os salmos como cânticos em momentos adequados da missa constitui uma forma privilegiada de valorizar a riqueza da liturgia. As melodias procuram ser acessíveis, mas sem pôr de parte uma correcção da escrita musical. A minha experiência é esta: às vezes custa um pouco, mas depois de as pessoas apanharem o sentido e a relação com o texto, ficam mais marcadas interiormente do que com uma proposta aparentemente mais fácil. A música litúrgica deve levar a que as pessoas descubram e entranhem o sentido profundo das palavras: entendimento e vivência. Três dimensões do canto perene VP – Qual o sentido da designação Canto Perene? AFS – O sentido é que tudo quanto nos rodeia, a vida humana, a qualquer hora, deve tornar-se um canto perene. Mas do ponto de vista universal, pretende-se que o canto seja em todo o lugar um perene ou permanente louvor de Deus. VP – Também se podia entender que se trata de um canto que mantém a continuidade da tradição litúrgica da Igreja, uma espécie de dimensão diacrónica… AFS – Podemos de facto considerar uma dimensão essencial e cósmica (“tudo o que respira louve o Senhor”, uma dimensão geográfica (em toda a parte) e uma dimensão do tempo: reviver o que se cantava nos primeiros séculos e chega até hoje. VP – Que aceitação tem sentido para o projecto? AFS – Este tipo de trabalhos têm sempre uma aceitação a prazo: não é passível de grande publicidade, não é mediático: trata-se de uma proposta sistemática. Repito que o grande objectivo é transportar os textos dos cantos evangélicos como proposta de catequese e pedagogia da fé: estabelecer a ligação entre a Palavra e a Eucaristia.

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