António Estanqueiro, Professor e Formador
Todos desejamos viver felizes. Mas não há uma fórmula da felicidade. Como seres livres, escolhemos caminhos diferentes para melhorar os níveis de bem-estar e de satisfação com a vida. A felicidade é um estado de espírito que depende mais das nossas atitudes do que das circunstâncias.
As pessoas felizes não se deixam cair nas armadilhas do prazer e do dinheiro. E sabem que os caminhos da felicidade passam pelo amor autêntico, vivido e partilhado nas relações humanas.
O prazer
Na sociedade de consumo, marcada por uma cultura individualista e hedonista, facilmente confundimos a felicidade com o prazer. Um engano. É verdade que a felicidade se alimenta dos prazeres do corpo e da mente. O problema vem das más escolhas.
Umas vezes, escolhemos prazeres ilusórios (por exemplo, alimentação desregrada e consumo excessivo de bebidas alcoólicas) que prejudicam a nossa saúde física e mental, a médio ou longo prazo. Outras vezes, escolhemos prazeres egoístas (por exemplo, mentiras e abusos) que desrespeitam e fazem sofrer as pessoas com quem interagimos. Prazeres ilusórios e egoístas conduzem à infelicidade.
Quem é livre e responsável, mantém uma relação saudável consigo mesmo, com os outros e com a natureza, ainda que isso implique esforço e sacrifício. A conquista da felicidade duradoura, tal como a conquista do sucesso escolar ou profissional, exige muitas vezes a renúncia voluntária a alguns prazeres imediatos e a capacidade de adiar gratificações.
É natural a busca do prazer e a fuga ao sofrimento. Mas é preciso coragem para resistir à tentação de satisfazer todos os desejos, aqui e agora, como se não houvesse amanhã. O que aconteceria se cada pessoa, obedecendo ao “princípio do prazer”, decidisse fazer tudo o que lhe apetece, quando lhe apetece e como lhe apetece, sem pensar nas consequências para o futuro?
Os excessos causam mal-estar. Se queremos uma vida equilibrada e feliz, precisamos de autocontrolo para gerir os impulsos e agir com moderação. É prudente temperar as emoções com a razão, de modo a evitar os prazeres que nos aprisionam e desumanizam ou nos afastam da convivência com outras pessoas.
O dinheiro
O dinheiro é um meio para satisfazer as necessidades básicas do ser humano: alimentação, habitação, segurança, saúde e educação. É uma condição necessária, mas não suficiente para a felicidade.
Quando as pessoas têm garantido o acesso aos bens essenciais para uma vida digna, não há uma relação direta entre aumento de dinheiro e aumento de felicidade. Se o grau de satisfação com a vida fosse proporcional à posse de bens materiais, os mais ricos seriam sempre mais felizes do que todas as outras pessoas. Ora, isso não acontece. Há ricos infelizes!
O dinheiro não compra tudo. Compra relógios, mas não o tempo; compra informação, mas não a sabedoria; compra estatuto, mas não o respeito; compra viagens, mas não a beleza de um pôr-do-sol; compra alguns prazeres, mas não a alegria; compra companhia, mas não o amor.
Honestamente ganho em trabalhos motivadores e úteis à sociedade, o dinheiro é um instrumento poderoso. Dá-nos a liberdade de satisfazer necessidades, viver experiências agradáveis com a família e os amigos e ajudar quem mais precisa. A liberdade de fazermos escolhas alicerçadas em valores torna-nos arquitetos da nossa felicidade.
Quando alguém se torna prisioneiro das ambições materiais, esquecendo a dimensão espiritual da existência, a liberdade acaba. A ganância, o desejo de ganhar riqueza, poder ou estatuto, custe o que custar, gera ansiedade. É terreno fértil para a competição desenfreada, a desonestidade, a corrupção, a injustiça e a violência. Poderá um ganancioso, que menospreza princípios e valores, sentir paz interior e viver de consciência tranquila?
É um direito querer mais, sobretudo quando não se tem o suficiente. Mas nem sempre mais é melhor. Tem razão o filósofo britânico Bertrand Russell (1872-1970): “Não possuir algumas das coisas que desejamos é parte indispensável da felicidade.”
A sabedoria está em servir-se das coisas sem viver preso a elas. Libertando a alma do apego aos bens materiais supérfluos, podemos saborear com calma outros bens preciosos para uma vida feliz: atividades significativas, novas aprendizagens e relações gratificantes.
O amor
Ninguém é feliz sozinho. Somos uns com os outros. Interdependentes. Todos sentimos a necessidade de criar e manter relações de afeto. Desejamos amar e ser amados.
Existem diversas formas de amor, entre as quais se destacam, habitualmente, o amor romântico, o amor familiar, a amizade e o altruísmo. Qual destas formas é mais determinante para a felicidade? Depende das pessoas e das circunstâncias.
O maior desafio é amar o próximo como a nós mesmos. Este princípio bíblico, válido há milénios para crentes e não crentes, implica cultivar uma autoestima equilibrada (aceitar-se e respeitar-se) e desenvolver relações de qualidade com os outros, em especial com a família e os amigos.
Fonte de alegria e felicidade, o amor verdadeiro supera os interesses egoístas e concretiza-se na empatia, na compaixão e na solidariedade. É incondicional e gratuito. Incondicional, porque faz o bem a todos, sem discriminações. Gratuito, porque oferece ajuda e perdão aos outros, sem esperar recompensas nem gratidão.
Evidentemente, não somos obrigados a gostar de quem nos trata mal nem a manter relações indesejadas. Mas devemos respeitar a dignidade e os direitos de todas as pessoas, mesmo que discordemos dos seus comportamentos.
Quem dá, também recebe. Quando contribuímos generosamente para a felicidade dos outros, sentimo-nos mais felizes. Praticando atos solidários, melhoramos a autoestima, fortalecemos as relações, contagiamos as pessoas à nossa volta e cooperamos na construção de uma sociedade mais justa e mais fraterna. Com gestos de bondade, todos ganham.
Na busca da felicidade, é importante apreciar com gratidão as bênçãos da vida, enfrentar com otimismo as adversidades e aceitar com serenidade o que não podemos controlar. Mais decisivo é amar: cuidar de nós mesmos e dos outros.
O amor abre-nos o coração e liberta-nos da tristeza, do medo, da raiva e do ódio. Embora não sacie a sede de infinito, satisfaz a necessidade espiritual de dar sentido à vida. O amor é o caminho da felicidade.
António Estanqueiro
Professor e Formador