Bragança:Homilia da Missa Crismal sobre Unidades Pastorais, topografia da vocação, comunhão e missão

A Missa crismal é uma manifestação privilegiada da Igreja, da plenitude do sacerdócio e da íntima união dos presbíteros com o bispo e entre si. Com a consagração do crisma, indica-se o que ocorre na liturgia da Igreja: os recém-baptizados são ungidos, os confirmandos são marcados, os presbíteros e os bispos são de novo ungidos, o altar é ungido. Com o azeite de oliveira, benzido para os catecúmenos e para os enfermos, Deus está presente, por sinais e orações, nos que são baptizados e são aliviados nas suas enfermidades.

A liturgia evoca o costume do Antigo Testamento, em que os reis, os sacerdotes e os profetas eram ungidos com o azeite da consagração, pois eram figuras de Cristo, chamado «ungido do Senhor». A unção envia sempre para a missão.

No Ano da Vocação, que estamos felizmente a viver na nossa Diocese, os presbíteros (87 presbíteros incardinados) são chamados a renovar o primeiro amor no serviço da palavra, da liturgia, do testemunho e da caridade do pastor. Os diáconos (6), os religiosos e as religiosas (100 ao serviço da nossa Igreja local e centenas ao serviço da Igreja universal), os confirmandos, os catequistas, os movimentos juvenis, os ministros extraordinários da comunhão, os doentes, os profissionais da saúde, os acólitos, os leitores, os cantores, os sacristães, os zeladores….. são convocados a serem discípulos missionários no lugar onde estão e onde vivem.

Para sermos mais fiéis à Eucaristia, ao Evangelho e ao Ministério nesta diocese nordestina, reorganizamo-nos em quatro arciprestados (Bragança, Miranda, Mirandela e Moncorvo) e cerca de 30 unidades pastorais, a maioria (25), já criadas em 2012. Os dias difíceis que vivemos exigem que as dificuldades sejam transformadas em oportunidades com engenho e criatividade. Já considerámos a necessidade, as razões, as várias formas, a mudança de paradigma, a utilidade, as dificuldades, os passos a realizar, as alegrias e as esperanças. As Unidades Pastorais são basilares para uma comunhão e participação pastoral orgânica de conjunto entre paróquias próximas, cuja colaboração, configuração e reconhecimento foi institucionalizado. Na verdade, as Unidades Pastorais, procedem de várias paróquias que convergem numa pastoral unitária, guiadas por um só sacerdote ou por um sacerdote moderador com o qual cooperam outros sacerdotes que podem, in solidum ou singularmente, ser párocos das paróquias convergentes na Unidade Pastoral.

Para nós, a Unidade Pastoral constitui a nova célula pastoral territorial onde se realiza a nossa Igreja diocesana, uma realidade pastoral chave para os próximos anos, pois queremos ser fiéis ao mandato do Senhor de apascentar o seu rebanho e temos de preparar o futuro em dinâmica missionária. Auguramos que a Unidade Pastoral seja como que a topografia da vocação, comunhão e missão.

Quais as razões desta reorganização em cerca de 30 Unidades Pastorais e em 4 Arciprestados?

1. A alterada proporção da relação numérica entre os párocos e as paróquias (60 párocos para 326 paróquias);

2. A redescoberta de uma responsabilidade colectiva e partilhada para a cura pastoral, que impulsiona a uma pastoral de conjunto ou pastoral orgânica, a realizar-se mediante uma ordenada colaboração de sacerdotes, diáconos, consagrados e de leigos para um determinado território;

3. O favorecimento da comunhão e o intercâmbio de conhecimentos e de ajuda entre os sacerdotes, os diáconos, os consagrados, os leigos e entre as várias paróquias e a facilidade de comunicação entre todos os que se dedicam à cura de almas;

4. A vocação e missão dos leigos, aos quais são confiadas responsabilidades nas suas paróquias, em aspectos da vida comunitária, que não devem ser confiados unicamente aos sacerdotes;

5. A característica de povo sacerdotal vivida pelos fiéis leigos e tão fortemente sublinhada na Escritura: E vós sereis chamados «Sacerdotes do Senhor», e nomeados «Ministros do nosso Deus» (Is 61,6); «também vós – como pedras vivas – entrais na construção de um edifício espiritual, em função de um sacerdócio santo, cujo fim é oferecer sacrifícios espirituais agradáveis a Deus, por Jesus Cristo (1Pd 2, 5); «e fez de nós um reino, sacerdotes para Deus e seu Pai; a Ele seja dada a glória e o poder pelos séculos dos séculos. Ámen» (Ap 1,6).

6. A importância da pluralidade de vocações na Igreja e dos diversos carismas que possam nascer no anúncio do Evangelho, na celebração da Liturgia e no testemunho da caridade.

7. A mudança do paradigma. Já não se concebe nem se reconhece a paróquia auto-suficiente, centrada e fechada no pároco. É necessário superar a lógica do “um-todos” para abrir uma lógica mais dinâmica e eclesial na comunhão “um-alguns-todos”. Este é um tempo de fazer das necessidades, virtudes.

Em 1994, o Cardeal Martini, de viva memória, quando criou as Unidades Pastorais ou Comunidades Pastorais na Arquidiocese de Milão, disse na homilia da Missa crismal: «A Igreja primitiva sofreu por carência de pessoal dedicado exclusivamente ao ministério? Se nós, hoje, estamos a viver um tempo de carência de clero, precisamos de nos reportar às atitudes da Igreja primitiva e imitá-la tanto na confiança e na Providência que suscita sempre colaboradores aptos para o ministério, como na criatividade e na abertura a todas aquelas soluções que uma reflexão razoável nos inspira».

O Senhor através das dificuldades quer dizer alguma coisa, quer fazer-nos descobrir novos carismas presentes na nossa Igreja, entre os sacerdotes, diáconos, religiosos e religiosas, os consagrados, os leigos homens e mulheres de todas as idades e de todas as condições. Temos uma enorme riqueza de carismas e ministérios. Este tempo de “vacas magras” estimula-nos a abrir os olhos e a perguntar: como é que o Senhor nos está guiando, ajudando, sustendo neste momento para que o Evangelho seja anunciado a todos sem excepção e para que a messe receba os operários de que precisa?

O Papa Francisco, na mensagem para o dia mundial de oração pelas vocações, escreve: «”A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. Rogai, portanto, ao Senhor da messe para que envie trabalhadores para a sua messe”» (Mt 9, 35-38). Estas palavras causam-nos surpresa, porque todos sabemos que, primeiro, é preciso lavrar, semear e cultivar, para depois, no tempo devido, se poder ceifar uma messe grande. Jesus, ao invés, afirma que «a messe é grande». Quem trabalhou para que houvesse tal resultado? A resposta é uma só: Deus. Evidentemente, o campo de que fala Jesus é a humanidade, somos nós. E a acção eficaz, que é causa de «muito fruto», deve-se à graça de Deus, à comunhão com Ele (cf. Jo 15, 5). Assim a oração, que Jesus pede à Igreja, relaciona-se com o pedido de aumentar o número daqueles que estão ao serviço do seu Reino».

É claro que temos de atender às resistências da parte da comunidade e de alguns presbíteros. Algumas pessoas ainda não se convenceram que a diminuição do número de presbíteros comporta a mudança de muitas práticas e estratégias pastorais. Alguns presbíteros preferem fazer tudo em vez da serenidade pastoral, da qualidade dos ritos, da profundidade do ensino e da pregação e sobretudo do testemunho da caridade pastoral. Trata-se não de ter menos cura pastoral, mas de a ter melhor organizada, conduzida e oferecida a todos os membros do povo de Deus.

O grande desafio é o trabalho espiritual fundamental que é pedido aos presbíteros, aos diáconos, aos consagrados e aos leigos – aprender a trabalhar juntos. Esta é uma escolha que exige a conversão pastoral e missionária, isto é, a mudança de atitude desde o coração, bem como a verdadeira caridade. Temos de realizar um projecto com estas simples etapas do método pastoral: ver, julgar, agir e avaliar.

A vocação é dom e compromisso. No começo do nosso ser bispo, presbítero, diácono, leigo, postulante, noviço, seminarista, irmão ou irmã, está o encontro com a pessoa de Jesus Cristo. «Não fostes vós que me escolhestes; fui Eu que vos escolhi a vós e vos destinei a ir e a dar fruto, e fruto que permaneça; e assim, tudo o que pedirdes ao Pai em meu nome Ele vo-lo concederá» (Jo 15, 16). Cada um dos escolhidos é convocado a fazer crescer e frutificar o dom recebido na comunhão. A vida fortalece-se, doando-a (cf. EG 10).

Caros presbíteros que hoje renovais o dom e o compromisso sacerdotal, sede verdadeiros suscitadores de vocações e ministérios, agentes da comunhão. Promovei uma maior participação na Igreja e amai-a em todo o coração.

Bragança, 17 de Abril 2014

D. José Cordeiro, Bispo de Bragança-Miranda

 

 

 

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