«Quando se sente o cheiro das tílias sabemos que o São João está a chegar», afirma o bracarólogo Rui Ferreira
Braga, 23 jun 2023 (Ecclesia) – Rui Ferreira, estudioso da festa de São João de Braga, afirmou que esta é a “grande celebração comunitária” e “identitária da cidade”, destacando o dia 24 de junho como “ponto alto” dos festejos.
“O São João é a principal festa da cidade de Braga, grande celebração comunitária, é preciso dar conta que desde sempre foi um espaço de encontro entre os bracarenses da cidade e da zona mais rural”, refere à Agência ECCLESIA.
O bracarólogo (estudioso de Braga) fez tese de mestrado sobre São João de Braga, por sempre ter vivido “intensamente a vida coletiva de Braga” e considera uma festa “identitária da cidade”.
Rui Ferreira indica que esta é uma “festa tipicamente minhota, no sentido de romaria onde as pessoas cumprem a sua promessa, junto ao santo e à capela” e que a “festa de São João de Braga não é só uma noite”.
O São João de Braga não é festa de uma noite só, como noutras localidades, temos programa de vários dias, depois a grande vigília noturna de festa, com vários tipos de música e convívio”.
Do programa das festas, o entrevistado destaca “o folclore, os gigantones e cabeçudos, imagem de marca de S. João de Braga”, a cidade “transfigura-se naqueles dias, as ruas ornamentadas, instala-se uma feira popular nas principais artérias da cidade”.
“O programa segue ao som dos bombos, cavaquinhos, dos ranchos folclóricos, as famílias reúnem-se na noite de São João para comer sardinhas e depois no dia 24 de junho a tradição é comer cabrito assado no forno, há todas estas tradições e os cheiros, o próprio cheiro das tílias espalhadas pelas ruas de Braga, dizemos que quando se sente o cheiro das tílias sabemos que o São João está a chegar”, partilha.
Rui Ferreira recorda que a festa de São João é ancestral e que ganhou destaque das “demais festas”.
“No século XVI a cidade de Braga tinha sete festas estatutárias e o São João eleva-se das demais, porque era um dos oragos da capela da cidade, e devido à fama da corrida do porco preto que mobilizava os bracarenses”, recorda.
A capela de São João da Ponte, onde atualmente se encontra o “coração da festa”, foi fundada em 1616, pela necessidade de celebrar naquele local.
“A corrida do porco preto era disputada entre moleiros e sapateiros que celebravam o São João e o povo juntava-se a assistir, graças à corrida a capela foi construída para que se celebrasse eucaristia no lugar e hoje é o coração da festa, atualmente, São João da Ponte”, explica.
Devido à ancestralidade da festa de São João “uma das coisas vincadas é a iconografia, ligada à festa desde o século XVIII”.
“Em termos litúrgicos celebra-se o nascimento de São João, o santo mais importante depois de Jesus Cristo, por isso a imagem do São João menino, associada à festa de Braga”, refere.
Rui Ferreira destaca ainda a existência do hino de São João de Braga que “se sabe existir desde meados do século XIX e em utilização no São João de Braga”.
“Chamam-lhe o “repenica”, depois foi replicado noutras festas e é um tema que emociona qualquer bracarense, porque vai às nossas raízes”, descreve.
O dia 24 de junho inicia às 09h00, com o cortejo sanjoanino, “que sai do largo da capela de São João do Souto” e integra três carros.
“Inicia com o carro das ervas, um memorando dos carros que percorriam as cidades em que se limpavam as ruas para as festas, este é o carro com ervas de cheiro para que as ruas fiquem perfumadas para se seguir a festa”, descreve. O carro do rei David é o segundo a integrar o cortejo que das 09h00 às 17h00 percorre as ruas da cidade. “Este carro traz uma dança que deriva do século XVIII, feito em cima do carro, um rei que dança com nove passos diferentes”, revela. Para o bracarólogo este carro é o que “toca qualquer bracarense” porque, “além do colorido dos trajes do rei e da corte”, este torna-se “um momento especial, a verdadeira imagem de marca das festas de São João de Braga e só exibido neste dia”. O terceiro carro é o que traz mais memórias a Rui Ferreira, uma vez que participou durante cinco anos, “ainda criança”. “O carro do auto dos pastores, o maior dos três carros, em que os pastores anunciam o nascimento de João Batista, é um resumo da cena do nascimento de São João, com origem no século XVIII e depois já transformado, um auto barroco que continua a acontecer nas ruas e que depois integra a procissão de São João, às 18h00, o momento alto de encerramento das festas”, destaca. |
Para Rui Ferreira falta ao São João de Braga “ser bem projetado de forma mediática” e ser sempre “bem tratada a tradição para que não se perca nem desvirtue”.
“É um trabalho que já tem vindo a ser feito e falta tratar bem as práticas de manifestação da festa, é um património bracarense, e é necessário tratar bem para que continue a ser e a ter o significado da festa de São João, que continue a ser o momento mais importante de exaltação da sua identidade comunitária”, aponta.
A entrevista integra o programa de rádio ECCLESIA, na Antena 1 da rádio pública, este sábado, pelas 06h00, ficando depois disponível online e em podcast.
SN