Bispos preocupados com a situação dos trabalhadores

D. Manuel Clemente e D. Jorge Ortiga pedem que o Estado ouça os portugueses, lembrando dignidade de cada pessoa A garantia de trabalho, as habilitações profissionais e escolares, a formação continua e o combate à ociosidade são “o melhor investimento social e económico a médio e longo prazo que caracterizam uma sociedade saudável, a nível local, regional ou nacional e até europeu”, apontou D. Manuel Clemente, Bispo do Porto, como ferramentas para se sair da actual situação sócio-económica que Portugal atravessa. O contexto de contestação social sobre as alterações ao Código de Trabalho, o aumento do desemprego e a realidade social e económica nacional, mas em especial no Porto, foram razões que juntaram na Associação Católica do Porto, D. Manuel Clemente, Bispo da diocese e o Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Viera da Silva, num debate sobre “O novo Código do Trabalho e a situação sócio-económica do Porto”. O critério é sempre a pessoa humana, apontou D. Manuel Clemente, no encontro, promovido pela Comissão Diocesana Justiça e Paz e Universidade Católica. Partindo da Doutrina Social da Igreja, o Bispo do Porto lembrou que o trabalho tem de ser encarado não só do ponto de vista sócio-económico, mas “antes na perspectiva de quem o efectua como dimensão essencial da pessoa humana, da realização de cada um”, pois é da dimensão humana do trabalho que decorrem os direitos “básicos dos trabalhadores”. O Bispo do Porto relembra os direitos laborais, que constam do Compêndio da Doutrina Social da Igreja, da justa remuneração, ambientes propícios à prática laboral, salvaguarda da personalidade, subvenções de assistência ao desempregados, pensões, seguros de saúde, acidente ou maternidade, para além do direito associativo. “A pessoa é o parâmetro da dignidade do trabalho”, sublinhou o Bispo e é ela “a referência constante de qualquer análise que se faça e da solução que se procure em qualquer situação social e económica”. No processo de desenvolvimento as autoridades públicas são “as primeiras zeladoras do bem comum e têm de apoiar os particulares, quer empregadores quer empregados”. D. Manuel Clemente aponta que “trabalho e capital devem convergir para o bem geral duma sociedade que comporta os dois e ganha com o seu dinamismo mútuo”. As organizações sindicais são um factor construtivo de ordem social e de solidariedade e, portanto, um elemento indispensável da vida social, indica o Bispo, que apela às associações que assumam uma função de “colaboração com os outros sujeitos sociais” e que se “interessem pela gestão da coisa pública. As organizações sindicais têm o dever de influenciar o poder político, de modo a sensibilizá-lo devidamente para os problemas do trabalho e a empenhá-lo a favorecer a realização dos direitos dos trabalhadores”. O Bispo do Porto rejeita qualquer determinismo na história, acrescentando que o homem é o árbitro da “complexa fase de mudança”. “O homem é o verdadeiro protagonista do seu trabalho. Ele pode e deve assumir de modo criativo e responsável as actuais inovações e reorganizações que sirvam ao crescimento da pessoa, da família, das sociedades e de toda a família humana”. Em resposta aos que criticam o novo Código do Trabalho proposto pelo Governo, o ministro do Trabalho e da Solidariedade Social defendeu no debate que “os empregos não se defendem só com decretos” e apontou que “o segredo está na qualificação e a formação”. No contexto europeu “Portugal tem a escolaridade mais baixa”, apontou Vieira da Silva. As “assimetrias sociais” que se verificam entre nós têm origem nos “desníveis salariais, normalmente associados a desigualdades profundas das qualificações”, argumentou. O Ministro destacou na nova legislação laboral “a capacidade de adaptação das pessoas e das empresas às novas exigências da economia”, na base de “uma lógica negociada”. Outro aspecto salientado foi o incentivo à contratação colectiva, deixando aos patrões e trabalhadores margem para negociar o que melhor servir os seus interesses. Vieira da Silva sublinhou ainda a aposta no reforço da “efectividade das normas”, para acabar com a distância entre a lei e a sua aplicação, aponta que assim “entre o forte e o fraco, impera a lei que garante oportunidades”. O Ministro acrescentou ainda que as alterações ao Código de Trabalho visam acabar com a proliferação dos “contratos a termo certo e de prestação de serviços”. Apesar do debate e da reflexão as alterações ao código Laboral não são aceites pelos trabalhadores que ontem saíram à rua para manifestar o seu descontentamento. Para D. Jorge Ortiga, Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, este “alerta de insatisfação deve ser acolhido pelo governo”. D. Jorge Ortiga afirma que “o poder político procura encontrar desculpas, alhear-se um pouco à situação, mas por outro lado começo a verificar que há municípios, incluindo municípios da cor do Governo, que começam a dizer que se houver necessidade já cortam àquelas obras que já estavam planeadas e programadas para poder ir de encontro a situações de carência das pessoas nos conselhos que lhes estão confiados”. O Presidente da CEP aponta ser “preciso coragem” para determinar o que é essencial e responder a situações que não podem esperar. A crescente pobreza dos portugueses, devido à crise internacional, é um assunto que preocupa o Arcebispo. O facto de esta ser uma “pobreza envergonhada” significa que muitos dos atingidos evitam mostrar a sua situação. “A pobreza é uma realidade que cresce cada vez mais”. D. Jorge Ortiga aponta que muitas pessoas que viviam numa situação média, há uns anos, vivem actualmente com alguma dificuldade. “O que preocupa cada vez mais é esta pobreza caracterizada pela vergonha, uma pobreza envergonhada, em que as pessoas não se manifestam, não dizem como se encontram, por um condicionalismo social que vivem ou viveram”, apesar de o número dos que não atingem os níveis necessários para uma vida minimamente digna também crescer “assustadoramente. (Com agência Lusa e Rádio Renascença) Notícias relacionadas • O critério é sempre a pessoa humana

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