1. No dia 4 de Março, segundo domingo da Quaresma, na capela da Casa das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus, em São Gonçalo, abri o processo de beatificação e canonização da religiosa madeirense, Irmã Maria do Monte Pereira. Apesar da grande simplicidade litúrgica, a abertura do processo realizou-se com grande dignidade, sentido de Deus e valorização do tempo quaresmal. Na serva de Deus, Maria do Monte, encontramos um modo diferente como Deus faz conhecer a sua presença, convidando a sua contemplativa a um amor sem reservas e sem condições. A espiritualidade do tempo quaresmal leva-nos a encontrar em Deus o significado de todas as realidades. São Paulo tinha expresso este novo espaço de existência na sua Carta aos Gálatas: «Não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim» (Gal. 2, 20). A nova cultura actual refere-se várias vezes a Jesus Cristo, mas se considerarmos o campo da fé, nota-se uma ausência preocupante e, por vezes, uma recusa de Cristo. A fé que salva, é a fé em Jesus Cristo e no seu mistério pascal de morte e ressurreição. A Quaresma é um tempo privilegiado para purificar o coração. Deus ama-nos como somos para nos tornarmos naquilo que Ele quer. 2 – A vida religiosa da Irmã Maria do Monte foi semelhante à das outras religiosas que procuravam em tudo obedecer à vontade de Deus, servindo ao próximo nos doentes do foro psiquiátrico. O segredo escondido que Jesus Cristo lhe revelou no dia da profissão solene para uma vida de reparação e amor esponsal, ficou encoberto à sua comunidade religiosa, só os seus directores espirituais tiveram conhecimento do que Deus operava na sua serva. Foi nomeada Vice Mestra de noviças, acompanhando as jovens em contacto directo durante oito anos. A maior parte da sua vida foi consagrada aos doentes na Casa de repouso de Belas, na Casa de Saúde do Bom Jesus e, no Funchal, na Casa de Saúde Câmara Pestana. Mostrou sempre uma preocupação fraterna pelos problemas das pessoas, participava nos trabalhos com uma alegria constante, tinha capacidade de resolver tensões, mas principalmente uma grande intimidade com Jesus Cristo. Os sofrimentos corporais que a atingiram, próprios dos místicos, encheram-na de medo e tristeza. O sofrimento provocou febres que chegaram aos 40 graus. Uma queda grave fracturou-lhe uma clavícula, as dores do fígado agravaram-se, prolongando-se durante dois anos. Os últimos dois meses de vida foram muito dolorosos, foi sujeita a uma operação que durou quatro horas, o coração não resistiu e a 18 de Dezembro de 1963, expirou santamente, no dia da festa de Nossa Senhora da Expectação, quando nas Igrejas da Madeira o povo cristão celebrava com júbilo as Novenas do Parto, nas quais, na sua juventude tinha participado na sua paróquia de Santo António. 3 – Como manifestou Deus os carismas concedidos à sua serva, se ela nada comunicou aos seus superiores e pessoas amigas? Assistiu à abertura do processo de beatificação o Padre Giulio Gritti, s.c.j. director espiritual da serva de Deus na Madeira que referiu a forma como Deus foi conduzindo o processo, da escuridão à luz segundo o princípio evangélico: «não se acende uma candeia para se colocar debaixo do alqueire, mas sim sobre o candelabro…» (Mt. 5, 15). Durante a vida da serva de Deus o Padre Gritti perante uma realidade espiritual fora do comum, pediu à Irmã Maria do Monte que escrevesse os seus colóquios espirituais com Deus. O Padre guardou os documentos e passou-os à máquina. Após a morte da serva de Deus, enviou algumas folhas do texto a um padre jesuíta pedindo para o ler e dar a sua opinião, por escrito. Outros directores espirituais leram o texto e manifestaram a sua opinião favorável. Por fim o documento chegou à Casa da Congregação em Roma e foi apresentado ao Postulador da Congregação. Alguns cristãos começaram a pedir graças à serva de Deus e a ser atendidos. Como um perfume derramado de um vaso partido, se expande ao perto e ao longe, o escrito da Irmã Maria do Monte foi lido e estudado por teólogos e mestres espirituais que o aprovaram. De passagem por Roma recebi o Postulador da Causa e irmãs da Congregação no Pontifico Colégio Português que, mais tarde, vieram ao Funchal a pedir-me a introdução do processo de beatificação. Tanto a Conferência Episcopal Portuguesa como a Congregação para a Causa dos Santos deram o «Nada obsta» para abrir o processo e constituir o Tribunal. O processo da Irmã Maria do Monte recorda-me o de Santa Teresinha do Menino Jesus após o aparecimento do magnífico livro biográfico «A História de uma Alma». As religiosas companheiras de clausura exclamaram: Mas que fez ela para ser santa? Não fez milagres! Deus revela à sua Igreja os que Ele quer exaltar e da forma que lhe agrada. A Igreja pede ao Senhor que manifeste a sua glória e poder nos seus santos. Funchal, 15 de Março de 2007 Teodoro de Faria, Bispo do Funchal