O discurso global de Bento XVI deu ao mundo uma imagem diferente da Igreja Católica e da figura que para muitos é tida como de divisão mas que na realidade é referência religiosa e humana no nosso mundo: o Papa
Cinco meses depois de vir a Portugal, Bento XVI empreende uma viagem completamente diferente ao Reino Unido. Foi Chefe de Estado, Sucessor de Pedro, Pastor, ecuménico, penitente, corajoso, cordial, amigo. Tal como aconteceu em Portugal a Comunicação Social não foi benigna antes do acontecimento. Profetizou um fracasso, um pretexto para protestos e até uma oportunidade para o Papa receber ordem de prisão. O balanço final nada teve a ver com os agoiros.
A Inglaterra é indiscutivelmente uma referência no nosso tempo, de história, cultura, liberdade e comunicação. Mas raramente se diz que no Império de Sua Majestade ser católico é ter um estatuto menor, como que infiel a um país que há quinhentos anos escolheu o seu “Papa” e lhe presta fidelidade, onde o político e o religioso se misturam com ar benigno e natural. Noutro país seria considerado subdesenvolvimento ou terceiro-mundismo.
Há as feridas da história e não poucas, há recentes passos de aproximação entre a Igreja Católica e Anglicana, que voltaram atrás com as conhecidas decisões “fracturantes” da Igreja Anglicana. Foi este terreno minado que Bento XVI pisou, com a agravante dos escândalos inqualificáveis na Igreja Católica em muitos pontos do mundo e com uma incidência gravíssima nos Estados Unidos da América, Irlanda e Bélgica. Juízes implacáveis, de dedo em riste, esperavam Bento XVI.
O programa tinha alguns laivos aparentes de provocação: o Papa propôs – se beatificar um “adversário” do Anglicanismo – Newman -, saudou os que recentemente se converteram ao catolicismo pelas roturas com a Igreja nacional. Foi cordialmente recebido pelas autoridades civis e religiosas e com um entusiasmo e vivência profunda pelos católicos que, sendo minoria, se entregaram militantemente a esta causa que era muito mais que a visita deste Papa. Era um todo, momento único de dificuldade e diálogo entre duas Igrejas e dois Estados com todas estas feridas de permeio. A dignidade das celebrações, a participação viva da multidão, a ausência de qualquer triunfalismo, fizeram deste tempo um grande momento da Igreja neste início de milénio, com um Papa idoso, olhado ainda com preconceitos, mas com uma fé, uma firmeza e um porte humano de extrema delicadeza e respeito. E extrema lucidez e coragem. Na histórica celebração ecuménica de Westminster soube apontar o inimigo comum dos crentes: o secularismo. Apesar das fixações de alguns media, desde a BBC à TV Al Jazeera e canais portugueses – como se nada mais houvesse que a referência à pedofilia – o discurso global de Bento XVI deu ao mundo uma imagem diferente da Igreja Católica e da figura que para muitos é tida como de divisão mas que na realidade é referência religiosa e humana no nosso mundo: o Papa. Para além da figura concreta que desempenha essa missão.
António Rego