Desde 2008 que a maioria dos países desenvolvidos se encontra numa crise económica, financeira, social e, também, política e moral. Será difícil separar as várias dimensões da crise, uma vez que elas são, simultaneamente, causa e efeito umas das outras e devido a terem causas comuns. Contudo, manifestam-se de forma distinta e todas têm, também, causas que lhes são específicas. Vejamos.
No que respeita à crise económica, ela traduz-se em menor crescimento económico, face a anos anteriores ou a países comparáveis. Geralmente, uma quebra no crescimento económico tem na génese uma quebra no investimento (nacional ou estrangeiro), na capacidade de exportar e/ou no consumo interno de bens ou serviços. O investimento depende de variáveis como a facilidade de obtenção de financiamento, o bom funcionamento da justiça ou dos designados custos de contexto. Já a capacidade de exportar depende do nível de competitividade do país, o que depende, entre outros, do valor da moeda, da produtividade e da capacidade de inovar.
Já uma crise financeira traduz-se em menor disponibilidade de recursos financeiros, seja porque os níveis de poupança diminuem, seja devido ao aumento das taxas de juro a que estão sujeitas as instituições nacionais públicas ou privadas. Ora, o valor das taxas de juro encontra-se profundamente ligado ao nível de risco, i.e. à probabilidade de incumprimento, bem como à confiança no desempenho futuro. Classificar os países e as instituições, em função do seu nível de risco, é o papel das agências de “rating”, as quais ponderam indicadores como: crescimento económico, défice orçamental, dívida externa e dívida pública.
No que respeita à dimensão social da crise, ela traduz-se em aumento do desemprego, ou seja, em mais pessoas em risco de pobreza ou exclusão social, o que conduz a uma deterioração da qualidade de vida e do bem-estar, bem como a maiores tensões sociais e a um aumento dos encargos do Estado com as transferências sociais.
Quanto à crise política, ela está bem expressa nos níveis deprimentes de participação e confiança nos políticos, nos governos e nas instituições democráticas.
Por último, e no que respeita à dimensão moral da crise, em oposição a um capitalismo positivista, Bento XVI apela, na sua última encíclica “Caritas in Veritate”, a um capitalismo ético e solidário, a uma “economia da comunhão”, pois “Deus deve encontrar lugar também na esfera pública.”
Em síntese, por um lado, o combate à(s) crise(s) depende da nossa capacidade individual e colectiva para inovar, empreender, trabalhar melhor, gerar confiança e não viver acima das possibilidade e, por outro, em assegurarmos que a sociedade assenta em valores humanistas e solidários, que é o bem comum a dar sentido ao desenvolvimento.
Ora, de que depende a nossa adesão a estes “princípios” de combate à crise? Acima de tudo, de confiança – de confiança no futuro, em nós próprios e nos outros. O medo e o pessimismo são paralisantes, diminuem-nos, já a confiança e a esperança são mobilizadoras, aumentam-nos.
Com confiança, as pessoas comuns podem fazer coisas fora do comum. Sem confiança, começa por não ser viável a adesão à ideia de um contrato social, fundadora do Estado e da democracia. Ou seja, ninguém estará disposto a abdicar de uma parte da sua soberania, delegando-a em terceiros, as leis dificilmente serão respeitadas e será impossível pedir sacrifícios às pessoas ou mobilizá-las seja para o que for. Em suma, sem confiança não há legitimidade e sem legitimidade não é possível governar. Por isso Obama apelou a “uma nova era de responsabilidade” na sua tomada de posse.
Cavaco Silva, no seu discurso de boas-vindas a Bento XVI, disse que “neste momento, os homens precisam de quem traga uma mensagem de esperança à sua sede de justiça e de solidariedade.” Por si só, uma mensagem de esperança já seria um contributo importante para o combate à crise. Mas julgo que a visita de Bento XVI nos deu um contributo maior. Num contexto de crise espiritual – e será esta, porventura, a raiz de todas as outras –, a visita de Bento XVI mobilizou cada católico, senão mesmo cada português, para dias de rara beleza e verdade, de desafio e inspiração.
Como dizia uma rapariga, depois da missa celebrada na Avenida dos Aliados, quando questionada por um jornalista acerca do que sentiu, “foi como se o Papa tivesse olhado para cada um de nós.” Pois é nesse olhar que começa o fim da crise – porque nos devolve a confiança de Pedro e nos lembra que a história de cada um é única, mas o nosso destino comum.
João Wengorovius Meneses
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