Papa traça retrato pouco animador do cenário mundial Bento XVI lançou hoje uma forte condenação ao “terrorismo organizado” que ameaça todo o mundo, considerando que essa “actividade criminal” é tanto mais condenável quanto mais os seus autores se “escudam numa religião”. No seu aguardado discurso ao corpo diplomático acreditado na Santa Sé, o Papa evocou o risco de um “choque de civilizações” e frisou que nenhuma circunstância pode justificar os actos terroristas. Como via para solucionar estes conflitos, o discurso papal aponta para a importância das trocas culturais entre o mundo árabe e o mundo europeu, lembrando que as mesmas, ao longo dos séculos, “fecundaram a cultura e favoreceram as ciências e as civilizações”. Situações críticas Analisando os pontos críticos, no que à paz diz respeito, no mundo de hoje, o Papa afirmou que “o meu pensamento vira-se, espontaneamente, para a terra onde nasceu Jesus, Príncipe da paz, que teve para com todos palavras de perdão e de paz; para o Líbano, cuja população deve reencontrar a sua vocação histórica em favor da colaboração sincera e frutuosa entre as diversas comunidades de fé; para todo o Médio Oriente, em particular para o Iraque”. Sobre a difícil situação na Terra Santa, Bento XVI sublinhou que “o Estado de Israel deve poder aí existir pacificamente” e que o povo palestiniano “deve, igualmente, poder aí desenvolver serenamente as suas instituições democráticas. para um futuro livre e próspero”. Para o Papa, é preciso saber “pedir perdão e perdoar” para que estes locais possam encontrar a paz. Recordando João Paulo II, o actual chefe da Igreja disse que “não há paz sem justiça, nem justiça sem perdão”. Um último pensamento, nesta parte do discurso, foi para a África, em especial para a Região dos Grandes Lagos e para as “populações indefesas” do Darfur, no Sudão. Liberdade religiosa Perante os 174 embaixadores acreditados na Santa Sé, Bento XVI lamentou que a liberdade religiosa não seja garantida em todo o mundo e que seja mesmo “violada gravemente em alguns Estados, inclusive nos que têm tradições culturais multiseculares”. Esta passagem do discurso aludia, de forma indirecta, a países como a China, o Vietname ou a Arábia Saudita. “Nenhum governo pode dispensar-se da tarefa de garantir aos seus próprios cidadãos as adequadas condições de liberdade”, vincou o Papa, saindo em defesa das minorias. A este respeito, o discurso papal sublinhou a importância da Declaração Universal dos Direitos Humanos, precisando que “os direitos fundamentais do homem são os mesmos em qualquer latitude e, entre eles, pode ser colocado num lugar de destaque o direitos à liberdade de religião”. “A todos os responsáveis das nações gostaria de dizer: se não tendes medo da verdade, não podeis temer a liberdade”, acrescentou o Papa. «Exército dos pobres» Bento XVI pediu às diplomacias um “esforço acrescido” para solucionar uma série de “urgências humanitárias”; como a fome, a pobreza ou as migrações forçadas. “Podemos afirmar que menos de metade das imensas somas globalmente destinadas ao armamento seriam mais do que suficientes para que o imenso exército dos pobres fosse tirado da indigência, e de forma estável”, apontou. Para o Papa, estas pessoas, ainda que não estejam em guerra, não deixam de ser “vítimas inocentes” da mesma, referindo as imagens que nos chegam dos campos de refugiados e deslocados, bem como dos que imigraram “por causa de indignas condições de vida”. Bento XVI não esquece, por outro lado, a “praga do tráfico de pessoas”, que classificou como “uma vergonha do nosso tempo”. “Perante estas emergências humanitárias, assim como outros problemas dramáticos da humanidade, não ficaram paradas muitas pessoas de boa vontade, diversas instituições internacionais e organizações não-governamentais. Pede-se, contudo, um esforço acrescido das diplomacias para identificar com verdade e superar com coragem e generosidade os obstáculos que ainda se colocam a soluções eficazes e dignas do homem”, indicou. Cooperação Bento XVI seguiu, em traços gerais, a sua mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2006, intitulada “Na Verdade, a Paz”, apresentando aos diplomatas presentes na Santa Sé vários enunciados a partir desse tema. “A paz – disse – ainda está ameaçada e impedida em muitas partes do mundo, como constatamos com dor”. Assim, a Igreja e as diplomacias internacionais devem permanecer unidas numa “missão comum” que é, para o Papa, a difusão da paz. “Esta missão coloca-nos sempre perante novos e grandes desafios, mas nós enfrentamo-los com confiança, na vontade de apoiar-nos, cada um segundo o seu próprio papel”.
