As bombas da Paz

Octávio Carmo, Agência ECCLESIA

Uma viagem do Papa à Terra Santa é sempre aguardada com enorme expectativa: trata-se de uma visita aos lugares mais santos do Cristianismo, num contexto geopolítico delicado, com consequências evidentes no equilíbrio mundial. Um passo em falso, no Médio Oriente, numa terra que todos reivindicam como sua, pode representar dificuldades de relevo para os cristãos em todo o mundo.

Francisco passou com distinção este teste, do ponto de vista religioso e social. Ecumenicamente, fez história ao reunir vários líderes cristãos na Basílica do Santo Sepulcro, onde a divisão se faz sentir de forma visível até na gestão do espaço. A oração em comum e a amizade visível com o patriarca ecuménico de Constantinopla Bartolomeu, consagraram a opção pelo diálogo e pelo trabalho rumo à recomposição da plena comunhão, centrado na fraternidade e não no confronto.

A visita, apresentada como uma evocação dos 50 anos do histórico encontro entre Paulo VI e o patriarca Atenágoras entra, a este nível, na lista dos momentos mais marcantes para o caminho ecuménico do pós-Vaticano II.

Particularmente relevantes, para os cristãos locais, foi o apelo de Francisco para que os lugares santos não se transformem em museus, preservando a memória viva que as comunidades crentes representam, com o seu testemunho de fé.

O Papa percebeu que tudo o que se faz e se diz na Terra Santa tem conotações políticas. Por isso mesmo, com gestos que o próprio garante terem sido espontâneos, foi reservando para a sua agenda pequenas surpresas, autênticas ‘bombas da paz’, que foram para lá das meras palavras, como aconteceu ao abriu as portas do Vaticano para receber os presidentes Mahmoud Abbas e Shimon Peres, que aceitaram o convite.

Sem necessidade de palavras, Francisco deteve-se em oração silenciosa numa série de lugares simbólicos: o muro da Cisjordânia, numa paragem imprevista, em Belém, que logo deu a volta ao mundo; o Muro das Lamentações, onde rezou pela paz; a lápide em memória das vítimas israelitas do terrorismo, noutra paragem fora do programa oficial, a pedido das autoridades israelitas.

Pessoalmente, impressionou-me a reflexão sobre o Mal (maior do que o próprio ser humano e a sua história) e a pretensa divinização do homem que o leva a diabolizar-se, apresentada no Memorial do Holocausto. Será sempre um dos discursos maiores do pontificado e deixa, para a humanidade, um apelo carregado de memória e de futuro: ‘Nunca mais’. 

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Agência ECCLESIA

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