Angra: Homilia de D. Armando Esteves na Vigília Pascal

Que bela esta noite Santíssima, que bela esta luz imensa que explode autenticamente do interior do túmulo e inunda a terra inteira!

Caros irmãos e irmãs, nesta noite santa ressoa de novo nesta catedral o alegre canto do Aleluia! Mesmo se o poder destruidor do mal ainda não acabou, mesmo se tantos continuam a chorar sob o peso da sua vida carregada de sofrimento e dor, mesmo se as nossas fragilidades não desaparecem magicamente, a liturgia desta noite santa manda-nos cantar o anúncio mais importante da história: o Senhor ressuscitou verdadeiramente! Deixemo-nos guiar pelos olhares relatados.

É preciso coragem a Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, e Salomé para olhar o sepulcro vazio. É preciso coragem para aceitar o olhar do anjo que fala de ressurreição e manda ir dizer aos discípulos que estavam em casa num desalento de morte. É preciso coragem a cada cristão para enfrentar os olhares de desespero de quem chora a morte dos filhos ou de quem não tem os mínimos para lhes dar uma vida digna. É preciso coragem para limpar as lágrimas de alguém querido e já moribundo, para olhar os olhos tristes de um idoso abandonado, para sentir dentro de nós o peso dos nossos limites e pecados, e, mesmo assim cantar: Cristo ressuscitou, Aleluia.

Hoje cantamos a certeza de que o grito de alegria da noite de Páscoa proclama que todos os abismos do mal no mundo já foram engolidos por um abismo de bem. Este canto é um milagre que se torna possível! É possível se não confundirmos esperança com otimismo, alegria com euforia, paz com sucesso. Václav Havel, político, dramaturgo, poeta e perseguido político, escreveu: “A esperança não é otimismo. A esperança não é a convicção de que o que estamos a fazer terá sucesso. A esperança é a certeza de que o que estamos a fazer tem um significado. Quer tenha sucesso ou não. Ou temos esperança em nós, ou não temos; é uma dimensão da alma. A esperança não é uma previsão, mas uma orientação do espírito e do coração”. A esperança dá significado à vida como à morte, à tristeza como à alegria, à luta por melhores condições de vida e à ajuda a quem não consegue habitação, alimentos e educação adequada.

Nesta noite santa, sai do túmulo uma esperança nova, que para nós tem um nome, um único nome: Jesus, o Senhor! Só o Senhor, que passou por todas as paixões dos homens, que experimentou e tomou sobre si todas as aflições, até ao ponto de sentir a solidão e o abandono de Deus e dos homens, pode indicar-nos o caminho da esperança, dando à nossa vida uma orientação de espírito e de coração. O que é mais forte: o ódio ou o amor? O que é mais fecundo: o egoísmo ou o dom de si? O que é mais necessário para que a existência floresça: a luz da verdade ou as trevas da mentira?

No decurso desta vigília, lemos, na história bíblica e em Jesus crucificado e ressuscitado, o nosso apelo a sermos novas pessoas e novas criaturas. Porque a Páscoa é verdadeiramente passagem a uma nova criação: das trevas do mal ergue-se uma criatura livre que participa da glória eterna, germina uma nova criação em que tudo será redimido, elevado, transformado, pacificado e imerso em Deus. “Considerai-vos mortos para o pecado e vivos para Deus” dizia Paulo. O Ressuscitado assegura-nos um destino de vida. Não um regresso à vida atual, mas uma ressurreição verdadeira, plena, total, da nossa carne, do nosso corpo, do mundo inteiro. “Fomos sepultados com Ele pelo batismo na sua morte, para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos, também nós vivamos uma vida nova”.

Ele é a grande esperança da humanidade. A morte já tem o seu contrapeso de vida e diz-nos que toda a crise já tem a sua superação e toda a tristeza já tem a sua alegria. Esta é a verdade desconcertante que nos traz Jesus Ressuscitado. Ámen, Aleluia!

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Agência ECCLESIA

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