A igreja de São Vicente, em Valverde, na freguesia de Pinela, datada do século XV, “escondia” no altar, por detrás de várias camadas de tinta, pinturas de ornamentos florais, que se crê serem anteriores ao século XVIII. A descoberta foi meramente ocasional. A mesma surgiu no âmbito de um restauro que está a ser levado a cabo pela técnica Suzete Almeida. Anos antes, esta técnica já tinha sido chamada a restaurar uma peça do mesmo altar. Os ornamentos foram ficando visíveis à medida que as camadas de tinta foram sendo levantadas. Mas outros elementos antigos foram ficando “à mostra”. “Com o levantamento da pintura ficaram à vista a marca da pintura de um arco, que era tipicamente usado nos altares antigos, e também de cortinas”, contou Suzete Almeida. A retirada de purpurina deixou, também, antever o verdadeiro ouro e as tonalidades avermelhadas do altar. Mais curioso, segundo a técnica, é que as tonalidades encontradas são idênticas às da imagem que recuperou, há doze anos atrás, naquele mesmo altar. “Já quando fiz a restauração da imagem, que está integrada no altar, verifiquei que tinha tonalidades avermelhadas. Outra curiosidade é que a própria imagem apresenta feições muito rústicas e não tem grandes formas, pelo que poderá ser também ela anterior ao século XVIII”, explicou a técnica. São elementos que a mesma acredita fazerem parte de um todo, que, possivelmente, foi levado a cabo por um mesmo artista. A dificuldade em datar as imagens e a pintura prende-se não só com aspectos técnicos. “É preciso não esquecer que, naquela altura, as coisas chegavam à região muitos anos depois, o que pode levar a imprecisões”, referiu. Certo é que, ao longo dos anos e das restaurações que tem feito por toda a região, foi a primeira vez que se confrontou com uma pintura deste género: “nunca vi nada assim. É um estilo completamente diferente, pouco estudado, que me leva a crer que possamos estar perante uma imagem anterior ao século XVIII”. Da mesma opinião é o pároco da aldeia, Pe Estevinho. Embora saliente não ter conhecimentos que permitam datar uma imagem, confessa nunca ter visto nada igual. “Não são ornamentos vulgares. O mais curioso é que os elementos da pintura se repetem depois na imagem”, salientou. No entanto, a população local parece não ter reagido bem a todos estes trabalhos de restauração. Suzete Almeida conta que, quando fez a restauração da imagem, as pessoas não aceitaram o trabalho. “Vi-me obrigada a colocar uma camada de verniz em cima da imagem, para que as pessoas aceitassem melhor o restauro”, explicou. O principal problema, segundo o pároco, é que “as pessoas não estão informadas nem sensibilizadas para valorizar o património”. Assim, “é difícil encontrar um ponto de equilíbrio”. Acresce que, “quando se faz um restauro numa Igreja, as pessoas pensam que a Igreja vai ficar como nova, quando restaurar significa preservar o original, mantendo a identidade da Igreja”, apontou a técnica. De facto, durante vários anos, o que aconteceu foi mesmo isso. Quando se fazia um restauro numa Igreja, esta era deixada “como nova”, ao invés de ser deixada como era antigamente. O pároco, Pe. Estevinho, pretende, por isso, logo que celebre, fazer uma reunião com a população, para lhes dar conta da riqueza de património patente no local, sensibilizando-os a preservar o passado. Suzete Almeida alerta que, caso não se comece a fazer esse trabalho de sensibilização, “corre-se o risco de perder riquezas, ao nível da Arte Sacra, e deixar as Igrejas todas iguais. É património dos antepassados e património da região que se perde”. Para concluir o restauro de todo o altar, a técnica prevê, pelo menos, um prazo de meio ano. Segue-se um trabalho em que é necessário tapar fissuras e fazer integrações, apenas onde é necessário. “Retoca-se e mexe-se apenas onde é necessário, mantendo a originalidade do altar”. No futuro, pode ainda ser realizado um trabalho de investigação, através do recurso ao arquivo e a documentação de obras, para, através do confronto de imagens, conseguir chegar a uma possível data da pintura descoberta.