Padre Armindo Vaz afirma que o importante «é sobretudo a sua significação de tradição profunda», religiosa, teológica, espiritual e humana
Lisboa, 22 jul 2022 (Ecclesia) – O padre Armindo Vaz realizou o “sonho” de assistir à “representação cénica, dramática, da história da Paixão de Jesus” na aldeia alemã de Oberammergau, que é apresentada a cada 10 anos e está em cena até 2 de outubro.
“O importante desta representação é sobretudo a sua significação de tradição profunda, e uma tradição religiosa, teológica, espiritual e humana, muito humana”, disse o professor de Sagrada Escritura da Faculdade de Teologia (UCP) à Agência ECCLESIA.
Segundo o padre Armindo Vaz, que há dez dias estava a assistir a esta representação das narrativas bíblicas, os habitantes de Oberammergau “não apresentam simplesmente um espetáculo”, e passam a mensagem que “é uma representação espiritual e humana, que quer ser meditação e oração”.
“Eles querem puxar esse acontecimento fundador dos seus antepassados, da peste de 1633, para o presente, fazendo reavivar a memória do passado para dar vida e vigor humano e espiritual ao presente”, acrescenta, assinalando que, no “fim de tudo”, quando os “aplausos retumbam por todo o palco”, os atores não regressam.
O religioso Carmelita Descalço contextualiza que esta representação da Paixão de Jesus, que envolve toda a aldeia, é a marca distintiva de Oberammergau que “vive pelo menos um ano inteiro de preparação” para a apresentação que se realiza no ano seguinte, e a “cada dez anos”.
“O começo de tudo isto está em 1633, a guerra dos 30 anos, de 1618 até 1648, e a um dado momento uma peste começa a alastrar e chegou à aldeia de Oberammergau. Rapidamente matou 80 pessoas, o conselho da comunidade reuniu-se e fez o voto solene de representar a cada 10 anos a Paixão de Jesus, se a aldeia se visse livre da peste”, explicou o padre Armindo Vaz, lembrando que a partir deste pronunciamento “não teve mais nenhum morto pela peste”.
A aldeia alemã, a 90 quilómetros a sul de Munique, “tem cinco mil habitantes, uns dois mil estão envolvidos sobretudo diretamente na representação”, que foi adiada de 2020, devido à pandemia Covid-19.
Desde o dia 14 de maio, e até 2 de outubro, são 103 representações da Paixão de Jesus, cada uma “com cinco mil espetadores, na totalidade pouco mais de meio milhão”, cinco dias por semana e durante cinco horas, das 14h30 às 17h00, um intervalo de três horas, seguindo-se a segunda parte, desde as 20h30 até às 22h30.
O professor de Sagrada Escritura, na Universidade Católica Portuguesa, observa que na Alemanha, em 2021, “300 mil pessoas devem ter deixado os registos da Igreja”, mas isso não quer dizer que as pessoas não sejam “profundamente religiosas e criticamente, ou seja, têm uma religiosidade crítica, apurada, bastante madura”.
“Essa maturidade vê-se aqui, os aldeãos têm consciência de que a Paixão de Jesus é a consciência do povo; que vem dar sentido e dar elevação antropológica à vida das muitas gerações e também da atual geração”, assinalou, antes do comentário às leituras bíblicas que vão ser ouvidas nas igrejas católicas este domingo.
Em entrevista emitida hoje no Programa ECCLESIA (RTP2), o padre Armindo Vaz referiu ainda que o texto usado “tem sido atualizado por teólogos”, nomeadamente pelo pároco de Oberammergau, e procuram reunir não só os episódios centrais da Paixão, mas “muitas cenas do Evangelho e cruzar com cenas centrais, importantes, do Antigo Testamento”.
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