João Aguiar Campos
Foram de ruído as últimas semanas. Sim, essencialmente de ruído; porque o som é outra coisa e tem outra fecundidade.
Digam-me que tudo isto não é mais que um preço a pagar pela democracia e eu compreendo e aceito. Como em relação a qualquer outro preço, deixem-me, no entanto, discutir também este, confrontando-o com a qualidade do produto…
Feito isto, descobrem-se facilmente algumas malhas fugidas ou prazos no limite. O que, de outro modo, se diz assim: a nossa democracia precisa de continuar a purificar-se, lavando-se de clientelismos, de profissionais do slogan e meros pregoeiros de promessas.
Penso, por isso, que, passados os dias em que uns comemoraram e outros verteram a surdina de uma lamúria, era bom fazer agora algum silêncio e, num assumido recato, limpar o futuro.
É que no ruído das semanas proliferaram as promessas; agora, o silêncio deveria ajudar a escolher a (pequena) parte possível dos sonhos anunciados. O resto, todos o sabemos, tem a reduzida validade de um comício ou a escassa objectividade de uma declaração de rua…
Escrevo-o sem ponta de ironia ou ar de escândalo. Aliás, como haveria de escandalizar-me, se a imaginação é a louca da casa, não paga impostos, alimenta títulos, entusiasma pedintes e ocupa estrategas?
Mas vou ainda mais longe: embora não me considere um modelo de generosidade, tenho para mim que um político que cumpra um terço do que anuncia merece um prémio de eficácia. Acredito, sinceramente, que não é por mal que não vai mais além. A culpa não é dele; é de uma coisa esquisita, chamada realidade, que tem essa estranha e persistente mania de, meros 15 dias após a posse, surpreender os eleitos e/ou os seus consultores…
Repito: não estranho que os políticos faltem às promessas ou até agressivamente as contradigam. Assusta-me, isso, sim, que as façam sem se aperceberem da sua impossibilidade.
Tudo porque continuo a acreditar que a política é uma nobre arte e tem de ser coisa séria!…