África: 75 mil quilómetros feitos de tempo e «boas pessoas» ajudaram Joana e André Patrício Peixoto a «despedirem-se devagarinho» de terras africanas (c/fotos)

O casal viajou 22 meses numa «caracunda», passou por 29 países, para afirmar a certeza de que este é um continente bom, cheio de boas pessoas

Lisboa, 13 mar 2024 (Ecclesia) – Joana e André Patrício Peixoto viajaram durante 22 meses por 29 países africanos, numa carrinha com destino a Portugal, fazendo um percurso para dar a conhecer “a vida” das pessoas, as maravilhas naturais e deixar espaço “para Deus acontecer”.

“Imagina-se que em África as pessoas estão todas num grande sofrimento e que tudo o que acontece é mau e que quando não acontece nada de mau, também não quer dizer que aconteçam coisas boas, porque, coitadinhas das pessoas, só estão a sobreviver. Queríamos mostrar que África, tal como todos os locais do mundo, é feito por pessoas, e que lá, como em outros locais, é a vida a acontecer, com pessoas boas e outras menos boas”, explica Joana Peixoto Patrício à Agência ECCLESIA.

“Infelizmente crescemos, na sociedade europeia a olhar para a África de cima para baixo: chegamos ao continente africano, seja qual for o país, já com o olhar sobre o terceiro mundo, que ali é o terceiro mundo, tudo o que acontece ali é mau. Isto é uma grande falácia”, acrescenta André.

O casal português conheceu-se em Moçambique, quando Joana trabalhava em projetos de cooperação para o desenvolvimento e o André trabalhava na área da sua formação, saúde, depois de dois anos como Leigo para o Desenvolvimento.

Com a decisão de voltar a Portugal tomada, queriam, no entanto, que o regresso acontecesse “devagarinho”; decidiram comprar uma carrinha, “a caracunda”, transformá-la numa caravana, e fazer 75 mil quilómetros, a partir de Lichinga, em Moçambique, percorrendo estradas de asfalto, inaugurando caminhos, contatando com animais selvagens e a beleza natural do continente, fazendo do tempo o seu aliado para conhecer as pessoas e o território.

Joana explica ter sido “muito mais fácil” do que poderiam imaginar, reconhece terem planeado muito pouco a viagem – e que quando o faziam deixavam que a ansiedade tomasse conta o que não foi bom – e que contaram com a generosidade de muitas pessoas no caminho, que os ajudaram a controlar perigos e acabavam por prolongar a sua estadia em diversos locais.

André recorda uma passagem pela Guiné-Conacri, “um país onde as pessoas vivem com uma nuvem negra por cima”, e num campo de futebol onde iam permanecer durante uma noite, deparam-se com um senhor “com uma catana às costas, muito simpático” que os tranquilizou na estadia, acabando o casal por ficar três noites no local.

“Nos Camarões foi o sultão, o rei tradicional, que nos ajudou a resolver um problema com a polícia; na Nigéria foi uma senhora que trabalhava nos serviços aduaneiros que nos disse que a estrada não era boa – ‘vocês ficam na minha casa, vão amanhã por esta estrada, durante o dia, mas não saem às 11h, saem antes às 6h para chegarem ainda de dia ao destino…’ e, de repente, Deus estava a acontecer. Tens que confiar nas pessoas, porque a maioria são estas pessoas que estão a tentar ser felizes e fazer a sua vida”, recorda Joana.

André Patrício Peixoto fala em 22 meses “intensos” e Joana acrescenta ter sido um tempo com “sabor a vida”.

De regresso a Portugal, e ainda sem uma morada fixa ou planos concretos, o casal assume o desafio de não se deixar asfixiar por uma realidade que os afaste do tempo e da forma simples como viveram na viagem.

André, que se assume ser uma “pessoa de natureza”, explica que a sua relação com o meio ambiente transformou-o ao ponto de querer “reaprender a forma como se coloca no mundo”.

“Questionamo-nos muito sobre quando é que a humanidade se separou. Porque há um mês e meio estávamos na Guiné-Bissau, na reserva natural da mata do Cantanhez, uma zona habitada por chimpanzés, mas que tem comunidades também à procura de equilíbrio para viverem em conjunto, onde se corta uma árvore e sai água como se fosse uma torneirinha, da qual bebemos tal como o fazem os chimpanzés – e eu penso, quando é que nós deixámos de nos interessar por isso? Quando é que isto deixou de ser importante?”, questiona Joana.

No regresso a Portugal o casal assume estar “num lugar familiar” mas onde chegaram pessoas diferentes: “Carregas vivências, uma viagem não premeditada que foi acontecendo com muita vida, com muito tempo – procuramos arrumar tudo para que não haja dois lados distintos, um antes e um depois, mas sentir que a nossa casa e aquilo que nós somos é todo o caminho que fizemos até aqui, e todas as pessoas que nos trouxeram até aqui. Falta-nos o tempo para pôr tudo isto em perspetiva, porque não tencionamos que haja uma porta entre a casa e o mundo”, finaliza Joana.

A conversa com Joana e André Patrício Peixoto pode ser acompanhada esta noite na Antena 1, pouco depois da meia-noite, ficando disponível no portal de informação e no podcast «Alarga a tua tenda».

LS

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Agência ECCLESIA

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