Octávio Carmo, Agência ECCLESIA
A frase é de alguém que admiro muito: a Verdade é um lugar do qual não podemos voltar os mesmos. E esta deverá ser a lição maior de tudo aquilo que a Igreja Católica em Portugal tem vivido nas últimas semanas.
Muito se tem escrito e muito se irá ainda escrever. O relatório da Comissão Independente pode e deve ser criticado, como qualquer estudo, mas o olhar sobre (naturais) limitações metodológicas e extrapolações discutíveis não pode nunca desviar as atenções do essencial: nada será como dantes.
O tempo é de uma opção clara: pedir desculpas – indo ao encontro das vítimas – ou encontrar desculpas. E é um tempo que exige muito cuidado: a reconfiguração do catolicismo pode fazer-se a partir das periferias, como pede Francisco, numa “Igreja em saída”, ou desde uma lógica de reafirmação como estrutura de poder, face a outros poderes e correntes ideológicas, vistas como ameaças ou até inimigas.
Olhando para o cenário mais amplo, qualquer resposta implica um processo sinodal. Que a discussão inicial seja remetida para uma assembleia extraordinária da CEP pode fazer sentido, num modelo de gestão de crise, mas a resposta de fundo tem de ser tomada numa dinâmica de escuta comum, aberta a todos, como tem sido proposto no caminho do Sínodo 2021-2024. Caso contrário, todos aqueles que vislumbraram nos últimos tempos uma janela de esperança para novas relações com a Igreja irão procurar outras referências espirituais. Mais do que a imagem da instituição ou a sua popularidade, é isso que está em causa: a capacidade de prosseguir a missão que lhe foi confiada, de anunciar uma mensagem nova e transformadora. Quem é que ainda a vê assim?
O anúncio de um horizonte de sentido para a vida, num discurso dirigido ao que nos transcende, continua a fazer sentido, apesar de todas as polémicas e falhas que é preciso assumir. Enquanto pessoas, inevitavelmente, habitamos a dúvida. Procuramos sinais, tentamos interpretá-los. Neste momento, precisamos de humildade, porque, muitas vezes, o que nos salva é a capacidade de entender esses mesmos sinais, quando dizem o que não gostaríamos de ouvir. Sem medo e lembrando sempre o que disse Jesus Cristo: “A todo aquele a quem muito foi dado, muito lhe será exigido; e a quem muito se confiou, mais lhe será pedido”.
O importante é o testemunho, como Jesus quer que façamos. Ele diz assim: «Envio-vos como ovelhas no meio de lobos». Não nos pede para saber enfrentar os lobos, isto é, para saber argumentar, reagir e defender-se: não! Pensaríamos assim: tornemo-nos relevantes, numerosos, prestigados. O mundo ouvir-nos-á, respeitar-nos-á e derrotaremos os lobos. Não, não é assim! (Papa Francisco, audiência geral, 15.02.2023) |