A missão de ser ponte…

D. António Luciano, Diocese de Viseu

Foto Jornal A Guarda/Francisco Barbeira, D. António Luciano

Não é fácil ser ponte em construção, mas é um desafio e um compromisso com a humanidade e a Igreja nos tempos em que vivemos.

Ser ponte é tomar consciência de que para unir duas pessoas é preciso tempo, vontade, amizade, conversão, respeito mútuo, para criar uma relação sadia e duradoira.

Construir uma ponte onde quer que seja é sempre um sinal de progresso, de desenvolvimento, meio de comunicação entre os povos, um elo de união e ligação entre as duas margens dum rio, que presta um serviço importante e útil  a toda a comunidade.

A construção de uma ponte tem sempre dos dois lados da margem e ao centro pilares bem alicerçados onde assenta o tabuleiro, estrutura programada através de uma engenharia e arquitetura sólida para ser lugar de passagem seguro e desempenhar a missão de aproximar e unir as pessoas.

Como contava um barqueiro havia duas terras importantes em que as suas gentes viviam tristes porque estavam separadas por um grande rio que era difícil de atravessar e  separava as pessoas.

A travessia das pessoas e dos seus bens entre as duas margens era difícil e feita com ajuda de alguns barcos frágeis conduzidos pela ousadia destemida dos barqueiros. Muitos para alcançarem a outra margem tinham de fazer a travessia de barco, ou percorrer longas distâncias de automóvel através de uma longa estrada que demorava muitas horas a chegar ao destino.

Durante muitos séculos a comunicação de pessoas e de bens entre as duas povoações tornou difícil e perigosa por causa das correntes do rio.

Um dia parou nas margens do rio um homem nobre e rico com o desejo de fazer negócios entre ambas as povoações e de promover a proximidade e o bem-estar destas pessoas. Sentado na margem do rio, contemplava a outra povoação com as suas gentes e teve um sonho, que partilhou com algumas crianças e jovens que se refrescavam na margem do rio, observando os outros companheiros que do outro lado do rio faziam o mesmo. Sensibilizado por imagem, disse a si mesmo que tudo havia de fazer para ali ser construída uma ponte.

Um dia o sonho realizou-se e a ponte construiu-se, sinal de progresso civilizacional. A partir daquele dia aquelas duas povoações tornaram-se uma só e cresceu o número de crianças, de jovens e de adultos que começaram a atravessar felizes a sua ponte.

A ponte nova fez aproximar as pessoas e promoveu os seus negócios, fizeram-se novas amizades, cresceu a alegria entre si, todos lucraram com o desenvolvimento que a construção da ponte trouxe às duas povoações, que agora tinham orgulho da sua terra, da sua cidade e das suas gentes. Quiseram inaugurar a ponte e fazer festa a sério e pensaram dar-lhe um nome. Depois de algum tempo de discernimento por sugestão das crianças chamaram àquela ponte o lugar do “encontro” e da união das duas povoações.

A ponte do encontro dos povos é motivo de festa e convívio para as pessoas. As duas margens do rio uniram-se e a água que as separava continua a correr feliz e contente a caminho do mar. As famílias num gesto simples de abraço fraterno voltaram a encontrar-se e o acolhimento e a fraternidade, a solidariedade, nome dado aos pilares da ponte, que suportam o tabuleiro da “ponte da amizade” cuja finalidade é ser pisada e calcada pelas pessoas. A ponte criou riqueza, proximidade, cumpre a sua missão, que é sinal de desenvolvimento e progresso, porque dá passagem livre a ambos os povos, fazendo deles uma só comunidade.

Quando a união se torna força de fraternidade o esforço de criatividade leva os homens criar verdadeiras pontes de relação, de unidade e de comunhão. Estas duas povoações ligadas pela simplicidade, humildade e fortaleza dos pilares de uma ponte que agora une as pessoas, passou a chamar-se a ponte do “encontro e da amizade”.

Uma ponta é uma obra de arquitetura e de engenharia, mas é também um sonho, um elo de ligação e união entre as pessoas, duas margens e cruzamento de culturas e multidões. Por baixo da ponte continua a correr de mansinho, como sempre a água do rio, cumprindo a sua missão até chegar à imensidão do mar.

A ponte da “amizade” tem nome e abraça as pessoas das duas margens e das povoações com humildade e simplicidade, cumpre a sua missão fundamental de ser lugar de encontro e de contemplação. As pontes devem estar bem assentes em suportes de pedra, de cimento, de ferro ou de madeira bem estruturadas em alicerces firmes e com segurança, pois só assim cumprem a sua missão.

A maior e melhor utilidade de uma ponte é facilitar a comunicação entre ambas as margens, quer passagem de pessoas, quer transportes de passageiros e mercadorias.

A ponte é um bem comum para unir e por isso deve cumprir a sua missão, que passa por ser bem calcada e pisada pelos pés das pessoas que têm de a atravessar diariamente no cumprimento do seu dever. Missão bela e necessária hoje, a de querer ser ponte.

Felizes de nós quando somos pontes calcadas pelo andar das pessoas, pelas suas preocupações e esperanças, mesmo quando as pontes têm que deixar passar cargas pesadas e desagradáveis, ou mesmo aqueles que diziam que não eram necessárias.

Eu gosto muitas vezes de comparar a vida a uma ponte, fico triste mesmo quando sem desejar, posso ser um muro que separa e divide. Caiam os muros e construam-se pontes com nome ou sem nome. Sejamos todos construtores de pontes de união, de diálogo e de encontro entre todos os seres humanos.

Deixemo-nos de ilusões e fantasias e coloquemos os nossos esforços em derrubar muros e construir pontes de comunhão, de solidariedade e de unidade tão precisas no mundo em que vivemos.

Hoje com sentido estético e de respeito pela pegada ecológica em muitas regiões de norte ao sul do país criaram-se vários passadiços, como espaços turísticos e forma de contemplar a natureza e ultrapassar as margens dos rios. Cuidemos da “Casa Comum”, sejamos pontes de união e deixemos que elas cumprem bem a sua missão.

Viseu, 20 de agosto 2023

António Luciano,
Bispo de Viseu

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