A «Lectio Divina» partilhada em grupo

O Sínodo sobre a Palavra de Deus vem dar renovada força a um exercício antigo e muito actual de escuta da Palavra de Deus no texto bíblico: a “lectio divina”. Há vários anos que, nos nossos programas pastorais, vimos a recomendar esta pedagogia. Este ano, propomos a sua prática na companhia e com a inspiração de São Paulo, o apóstolo por excelência da Palavra de Salvação. Aconselhámos, nesse sentido, a constituição de grupos paulinos em todas as comunidades e prometemos reuniões de formação para os animadores destes grupos, orientadas pela Comissão Diocesana para o Ano Paulino. Alguns textos para esta formação estão já disponíveis no “site” da diocese. Consideramos, portanto, que estes grupos paulinos, dedicados à “lectio”, são uma proposta acessível e enriquecedora. É o assunto deste artigo. Estou, realmente, convicto de que a “lectio divina” é um exercício muito salutar para a nossa situação social e religiosa. Responde, na verdade, a muitas deficiências da nossa cultura humana e cristã. Cultiva a capacidade de prestar atenção e escutar num ambiente de ruído, superficialidade e distracção. As pessoas, de facto, escutam -se pouco e mostram, por isso, muita dificuldade no diálogo. A “lectio divina” põe-nos também em contacto com a riqueza literária e humanista, com a sabedoria sólida da Sagrada Escritura. O fruto mais importante, porém, é de ordem espiritual, ou seja, aprendemos a escutar a Palavra viva de Deus que fortalece a fé e a esperança e incentiva ao amor. Permite, portanto, remediar a ignorância acerca das Sagradas Escrituras e torná-las a luz e o alimento do espírito. A “lectio divina”, partilhada em grupo, que propomos este ano, apresenta algumas vantagens. Alivia, antes de mais, a tarefa do animador libertando-o da responsabilidade de ter de preparar uma lição. Na realidade, os animadores leigos, quando convidados para esta tarefa, manifestam receio de não estar à altura porque imaginam que recai sobre eles a responsabilidade de orientar uma catequese. Mas, na modalidade do grupo que partilha a “lectio”, o centro não é o animador mas o texto; e todos os membros do grupo se tornam animadores. Ao animador cabe a tarefa de coordenar as intervenções. Cada membro do grupo vai directamente à fonte e colhe pessoalmente a mensagem do texto sagrado. Depois partilha com os membros do grupo. Assim coloca-se no centro o próprio texto e não o mediador. Ao realçar a partilha em grupo, não colocamos, certamente, em questão o ministério fundamental e insubstituível do pregador do evangelho. A partilha em grupo prepara, completa e desdobra a pregação. Em vez do pregador põe-se o texto a falar. Faz-se a leitura meditada pessoalmente. Cada um presta atenção e deixa que o texto fale ao coração e à vida. Assim o texto adquire vida. Depois faz-se a partilha e põe-se em comum a perspectiva que cada um colheu. Deste modo, através da meditação partilhada, unem-se e complementam-se as perspectivas dos vários membros do grupo. Escuta-se o texto e escutam-se os outros na partilha. A Palavra é para mim e é para o outro. A Palavra partilhada torna-se Palavra para o mundo, para a sociedade. Esta modalidade, além de enriquecer a “lectio” com a partilha, cria também relação fraterna e prepara animadores pastorais. O protagonismo é dado ao texto. O animador, em vez de querer ensinar tudo, aprende a ser discípulo e a ser discreto. Participa no encontro não só para ensinar mas também para aprender. O bom animador é o que gosta de aprender com o grupo. Na verdade, a sabedoria está na Palavra e não tanto no animador. Claro que um animador competente e bem preparado mostra outra capacidade de desvendar a riqueza do texto bíblico. Mas o caminho faz-se caminhando. + Manuel Pelino Domingues, Bispo de Santarém

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Agência ECCLESIA

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