Nas vésperas da celebração da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, um olhar sobre o impacto das iniciativas precedentes Nas vésperas da celebração da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e das Caraíbas, em Aparecida (Brasil, de 13 a 31 de Maio) podemos afirmar que se nos últimos 50 anos a Igreja latino-americana cresceu em unidade, organização, coordenação pastoral e até na consciência do seu património religioso, histórico e cultural, deve-o, em boa parte, ao impacto que tiveram estas Conferências – Rio de Janeiro (Brasil -1955), Medellín (Colômbia – 1968), Puebla (México – 1979), Santo Domingo (República Dominicana – 1992) – dentro e fora da Igreja. Após a primeira, foi criado o CELAM (Conselho do Episcopado Latino-Americano), como organismo de apoio às Conferências Episcopais Nacionais. Este teve um papel importante na caminhada do Povo de Deus, não só pelas orientações oferecidas, mas, sobretudo, como testemunho de uma Igreja que procura pensar-se num horizonte cultural comum, a América Latina. A conferência do Rio de Janeiro teve o mérito de ser a primeira e de iniciar o processo de coordenação inter-eclesial, praticamente inexistente até então. Já Medellín teve outra ressonância: significou a primeira visita de um Papa ao continente sul-americano (que Paulo VI denominou como “continente da esperança”), e contou com o impulso de renovação do Concílio Vaticano II. O tema da justiça, da paz e do desenvolvimento integral da pessoa humana, linhas orientadoras da Gaudium et Spes e do magistério de João XXIII e Paulo VI, marcam profundamente a orientação pastoral da Igreja Latino-americana. Nesta mesma linha foi valorizada a presença e a acção dos leigos no mundo, sobretudo em acções de carácter social. No período que medeia Medellín e Puebla, ganha maior força e criatividade a chamada “teologia da libertação”. Partindo da realidade social vigente – marcada pela pobreza e pela procura de uma nova organização política e social, não em torno de líderes ou instituições políticas formais, mas vincando as próprias necessidades e capacidades da população para analisar os seus problemas e propor vias de solução – procura fazer-se uma interpretação teológica, em que se acentua o tema da libertação dos que são marginalizados pelo sistema, e se propõe a transformação da sociedade, a partir das bases populares. Os mais pobres aparecem, assim, como o “lugar” teológico, a partir do qual se aponta uma nova ordem social e outros modelos de desenvolvimento humano. Neste contexto as orientações pastorais tendem a privilegiar as bases, a participação popular e laical. Muitas das pessoas que trabalhavam em estruturas institucionalizadas da Igreja (como escolas ou paróquias…) abandonaram-nas para estar junto dos mais pobres, partilhando com eles a vida e as suas formas de organização. Esta opção causou muitas vezes conflitos com a institucionalidade da Igreja e, de modo particular, com a sua hierarquia. Os cristãos que fizeram esta opção sentiam-se mais perto das necessidades reais das pessoas, que estavam à margem e qualquer tipo de representação institucional no sistema social, e podiam realizar, a partir daí, a promoção humana, como era proposta pela hierarquia. O Documento de Puebla (1979) põe em destaque o património histórico-cultural da presença da Igreja entre os povos latino-americanos, sublinhando a experiência religiosa -sobretudo nas suas expressões populares – como o núcleo da consciência histórica e da identidade cultural destes povos. Do ponto de vista pastoral, ao lado da opção preferencial pelos pobres, aparecem outras, como a família, os jovens e os “construtores da sociedade”, abarcando com esta expressão os vários agentes sociais sem privilegiar nenhum grupo em especial. A Conferência de Santo Domingo ficou marcada pela celebração dos 500 anos do início da Evangelização naquele continente. No discurso inaugural, João Paulo II convidou a Igreja a fazer um acto de contrição pelas situações de injustiça que possa ter provocado na sua relação com os povos indígenas e reafirmou a grande riqueza religiosa cultural e social da Evangelização. O Documento faz sobretudo uma confissão de fé cristológica, mostrando Cristo como o maior tesouro que a Igreja pode oferecer aos povos da América Latina e de toda a terra. Para além das questões sociais (a luta contra a pobreza nas suas várias vertentes), custodiar e reproduzir a grande tradição católica destes povos frente às velhas cosmogonias ancestrais e à proliferação de grupos pentecostais, no contexto de uma cultura marcada pela globalização, parecem ser os grandes desafios da próxima Conferência, a realizar em Aparecida. Pe. Carlos Candeias, Claretiano, antigo missionário no Peru