A euforia de viver de um transplantado

A experiência do bispo de Vila Real que recebeu um «coração novo»

Após o transplante do coração, D. Joaquim Gonçalves sente “uma certa euforia de viver” porque o libertou de problemas “cardíacos graves”. Antes da operação, a administração dos medicamentos tinha o intuito de evitar que a doença se agravasse. Agora “faço a mesma coisa para conservar a saúde que consegui” – disse à Agência ECCLESIA o bispo de Vila Real.

Naquele período de espera do órgão (cerca de mês e meio) que lhe salvou a vida, o prelado pensou várias vezes na morte. Tanto em Gaia, como em Coimbra “coloquei a hipótese da morte com muita nitidez” – esclareceu. E adianta: “foi tema de conversa com Deus”. Naquele diálogo com Deus – “essa parte íntima é muito difícil de transmitir para uma reportagem jornalística” – D. Joaquim Gonçalves recorda que a temática da “consciência da vida como dom” foi objecto da conversa.

O transplante não é uma questão entre um coração que vem ou que não vem. “É entre uma pessoa que morreu ou vai morrer, entre mim próprio e também com Deus” – sublinhou D. Joaquim Gonçalves. Bispo de Vila Real desde 1991, o transplantado recebeu o novo órgão aos 71 anos de idade.

Com as lágrimas nos olhos, o bispo de Vila Real fala deste episódio com alguma emoção. “É inevitável porque o transplante mexeu com toda a estrutura psicológica, cultural e social”. No período que antecedeu a operação salvadora, D. Joaquim Gonçalves sabia que muitas pessoas rezavam para que o órgão aparecesse. “Cheguei a ter pena deles porque se o coração não aparecesse ficariam frustrados”. Com a voz trémula relata: “tive o sentimento do sofrimento que iriam ter se, nos caminhos de Deus, não corresse como correu”. Quando recorda o acontecimento “não deixo de me emocionar”.

Quando os acontecimentos com alguma emoção surgem na vida do prelado de Trás-os-Montes “tenho de escrevê-los” porque se tal não acontecer “fico com a impressão de estar entupido”. Após a emoção de ter recebido um coração novo, «O outro Jonas» – “a simbólica bíblica que utilizei para exprimir os trambolhões que dei nos hospitais – nasceu da pena do Bispo de Vila Real. Um livro editado pela Gráfica de Coimbra e que serve também para comemorar as Bodas de Ouro Sacerdotais, a celebrar no próximo ano.

Antes de ir para o hospital, D. Joaquim Gonçalves revive alguns momentos. Uma semana antes, escreveu uma carta a um padre que celebrava 60 anos de sacerdócio. Uma missiva “amiga e muito afectiva” que provocou uma “enorme alegria a esse padre”. No dia que ele celebrou essa data “tive um colapso e fiquei em estado de coma”. Foi o último texto que “escrevi antes desta odisseia”.

Ao dar o seu testemunho no XXII Encontro Nacional da Pastoral da Saúde – subordinado ao tema «Transplantes de órgãos – doação para a vida» – D. Joaquim Gonçalves disse aos participantes que “um transplante não é um acto biológico porque é sempre vivido por alguém e tem uma componente afectiva”.

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