A devoção ao Espírito Santo na Madeira

A devoção ao Espírito Santo na piedade popular madeirense enraíza na mesma descoberta da ilha em 1420, e no início do povoamento, por meados de 1425. O Espírito Santo recebe a primeira manifestação de fé do descobridor. Ao fazer o reconhecimento da zona de Câmara de Lobos, Zarco terá já demarcado no próprio terreno o espaço dedicado à futura construção duma Capela em honra do Espírito Santo, ermida que ainda hoje constitui o centro das manifestações devocionais e da mesma Festa do Pentecostes, nesta comunidade paroquial. Também é vulgarmente conhecida como Capela da Imaculada Conceição. Na primeira igreja construída em honra de nossa Senhora da Conceição, que o vulgo, pela sua localização, chamou do Calhau, o mesmo Zarco dedicou uma capela interior ao Espírito Santo. Com o desenvolvimento da Madeira e o seu crescimento populacional, outras capelas Lhe foram dedicadas. É orago da paróquia da Calheta. Recebeu devoção especial numa capela erigida em sua honra no Caniço, no extremo leste da Capitania do Funchal. Quando foi necessário construir uma nova igreja, nesta localidade, por se encontrar em ruínas a primitiva ermida, o Espírito Santo passou a ser co-padroeiro conjuntamente com Santo Antão, que era titular de uma outra capela erguida pela população na margem esquerda da mesma ribeira, mas pertencente já à Capitania de Machico. Ainda hoje se mantêm dos dois titulares, com fortes expressões de fé. Na paróquia da Ponta do Sol, João Esmeraldo erigiu uma Capela em honra do Espírito Santo, a qual foi dedicada pelo Bispo em 1508, e em 1527, instituiu um morgadio com a mesma invocação na Lombada da Ponta do Sol. No convento de São Francisco, no Funchal, demolido no século XIX, havia uma capela dedicada ao Espírito Santo. O mesmo acontece no Convento de Santa Clara, assim como na matriz de Santa Cruz e na de Machico. A Capela da Encarnação, em Santa Luzia guarda relação com o Espírito Santo sob cuja acção o Verbo se fez carne. No Porto Santo, a antiga Capela do Espírito Santo deu origem a uma nova paróquia em 1960 e nela tem ainda a sua sede. A grande devoção do povo madeirense ao Espírito Santo manifesta-se também nas pinturas dos seus símbolos, as línguas de fogo e a pomba que embeleza-ram as igrejas e capelas. Concomitantemente, foram criadas pela diocese além, confrarias e irmandades do Espírito Santo, com o objectivo de manter e assegurar a realização de actos de culto ao Paráclito divino. Com Gonçalves Zarco, vieram também para a madeira os frades franciscanos, que definitivamente, também tiveram uma influência decisiva nesta particular devoção. As manifestações exteriores de devoção ao Espírito Santo de maior expressão, são as «Visitas Pascais» ou vulgarmente denominadas «Visitas do Espírito Santo», que chegaram até aos nossos dias. Elas realizam-se entre o II Domingo da Páscoa e a solenidade da Ascensão. Entre os seus objectivos, está uma recolha de fundos para a Festa do Espírito Santo, para o «Bodo» ou a «Copa», para ajuda aos mais carenciados, ou para a fábrica da igreja, uma visita e bênção às famílias, levando até elas a presença da Páscoa. Para o povo madeirense em geral, esta visita constitui uma verdadeira «Festa», pois reúne-se toda a família, para receber «O Espírito Santo», que vem abençoar a casa, a família. Os familiares mais chegados vêm de longe, convidam amigos e vizinhos, e todos podem participar da «Festa»: refeição melhorada, bolos, doces, bebidas licorosas, etc. Respira-se, normalmente, um espírito de fé, pois a visita é recebida com muito respeito e muita dignidade, e as ofertas costumam ser substanciais. Na zona urbana, e onde se construíram aglomerados habitacionais, para onde emigram famílias não enraizadas na comunidade, sente-se, evidentemente maior dificuldade nesta acção pastoral. A Visita Pascal é, normalmente, presidida pelo Pároco, ou seu representante, que procura alternar em cada ano, até visitar toda a paróquia, que vai acompanhado por pessoas, homens ou mulheres, revestidos com opas vermelhas. Uma leva a Bandeira e outra o pendão com as Insígnias do Espírito Santo, que são beijadas pelos visitados, e ainda outra leva a bandeja ou «coroa» onde são depositadas as ofertas. Por vezes também ainda vai o ceptro, reminiscências das primeiras iniciativas que aproveitavam a Festa do Pentecostes, para demonstrar que o Espírito Santo é, de facto, o «Pai dos Pobres». Normalmente também vão duas «saloias», trajando de vermelho ou o traje típico regional, todas enfeitadas de ouro, as quais vão cantando os versos tradicionais do Espírito Santo. Podem ir ainda um ou dois tocadores de instrumentos regionais, sobretudo «Braguinha» e «Machete”, os quais podem ou não ser remunerados. Com as «saloias» e com a toda a Madeira em Festa, vamos também cantar: «Desce à terra luz bendita / vem o teu povo animar / as nossas almas visita / nossos passos vem guiar.» «Vinde Espírito Santo / às nossas almas dar luz / Para que nós triunfemos / lá na Pária com Jesus». Manuel Gama

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